Sociedade | 31-08-2021 12:00

Tribunal entrega ao Estado casas do Bairro 1º de Maio na Chamusca

Juízes da Relação de Évora confirmaram a decisão do Tribunal do Entroncamento de extinguir a instituição por falta de actividade e por se limitar a gerir o património. Pouco tempo depois a então presidente da instituição foi condenada por se apropriar de cerca de 120 mil euros.

O Tribunal da Relação de Évora mandou entregar os bens da Casa do Povo da Chamusca ao Estado, confirmando a decisão do Tribunal do Entroncamento que, há pouco mais de um ano, decidiu extinguir a instituição. A direcção da casa do povo recorreu da sentença dizendo que prosseguia actividades sociais e que estava a tentar superar as dificuldades financeiras que existiam desde 2008, situação que deriva de apropriação de dinheiro. A presidente da instituição, Maria Leonor Feiteiro, foi condenada por se ter apropriado de cerca de 120 mil euros entre 2009 e 2016.

Os juízes da Relação concordaram com a decisão da juiz Ana Gomes que, em primeira instância, justificou a extinção da casa do povo com o facto de há muito não ter actividade limitando-se a receber rendas de imóveis e a vender património. O acórdão do Tribunal da Relação de Évora é ainda mais contundente quanto a esta questão, questionando, por exemplo, como é que a instituição poderia proporcionar actividades desportivas aos seus associados e à população se em 2010 deu de arrendamento o pavilhão desportivo, por um prazo de 15 anos, para uma loja de comerciantes chineses.

A Relação salienta ainda que não se viu que os rendimentos fossem aplicados no desenvolvimento de iniciativas previstas nos estatutos, mas antes foram dissipados em despesas alheias, “mormente para proveito próprio de membros da direcção”. Os juízes sublinham não verem vontade dos associados em manterem em actividade a casa do povo, dando como exemplo a reduzida participação nas assembleias gerais, uma das quais foi para aprovarem com nove votos a favor e dois contra a renúncia da instituição ao estatuto de Instituição Particular de Solidariedade Social.

O acórdão termina salientando que o Ministério Público terá de promover a adjudicação dos bens da casa do povo ao Estado, que resulta de uma consequência legal da extinção da entidade.

A CONDENAÇÃO DA PRESIDENTE

A extinção da casa do povo tinha sido decidida pelo Tribunal do Entroncamento quatro meses antes de a ex-presidente da Casa do Povo da Chamusca ter sido condenada ao pagamento de 121.204 euros ao Estado, a uma multa de 1.170 euros e a uma pena de dois anos e meio de prisão, suspensa por igual período se pagar três mil euros. Maria Leonor Feiteiro foi condenada pelos crimes de burla na forma tentada e abuso de confiança qualificada. A ex-secretária da instituição, Maria Teresa Brás, foi considerada cúmplice e acusada de infidelidade e foi condenada a uma multa de 1.430 euros.

O tribunal deu como provado que entre 2009 e 2016 a ex-presidente levantou dinheiro das contas da instituição e pagou despesas pessoais e de terceiros. A burla tentada teve a ver com um esquema para tentar tirar ainda mais dinheiro da instituição quando as contas já estavam apreendidas pela justiça. Maria Leonor Feiteiro solicitou ao tribunal autorização para proceder a levantamentos para pagar dívidas a prestadores de serviços, que o tribunal verificou não existirem.

A instituição foi fundada a 7 de Maio de 1943 para representar e defender trabalhadores em termos económicos e sociais, assegurando também a actividade de previdência e assistência, bem como contribuir para melhoramentos locais e promover o ensino a adultos e crianças. Em 1999 os estatutos foram alterados passando o objecto da Casa do Povo a ser o de promoção da solidariedade, acções de animação sócio-cultural, apoio social, organização de espectáculos, entre outros, que o tribunal concluiu não existirem há vários anos.

Em 2015 a Casa do Povo da Chamusca tinha arrendadas 27 habitações no Bairro 1º de Maio. A direcção tinha, dois anos antes, aumentado o valor das rendas, o que provocou uma onda de contestação.

À margem

Os moradores do bairro 1º de Maio, na Chamusca, viveram pesadelos durante anos com a falta de ajuda dos políticos da terra que deixaram que um bairro herdado do antigo regime fosse tomado de assalto por gente esperta que se soube aproveitar das fragilidades do sistema. Entretanto, muitos gastaram dinheiro comprando casas que já deveriam ser suas; e outros viveram situações dramáticas ao serem ameaçados com represálias que incluíam aumentos da renda ou despejos. O que se passou com as casas do Bairro 1º de Maio foi mais do que uma novela; chegou a ser um filme de terror para muita gente que em alguns casos perdeu a paz de espírito que afectou para sempre a qualidade de vida.

Esta decisão do Tribunal só foi possível porque houve gente que nunca baixou os braços e foi atrás do prejuízo. Foram muito poucos, mas foram os suficientes para que o caso agora tivesse um desfecho que, no mínimo, serve o interesse de todos.

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