Sociedade | 27-04-2022 10:00

Autor do mural do Museu do Ar começou a desenhar para escapar ao bullying

João Pereira usa o grafiti como forma de criar uma ponte entre o seu trabalho e a paixão pela arte

Pintar murais a spray e mais recentemente com pincéis e tinta numa estética de grafiti é uma forma de conseguir exprimir-se. Para João Pereira, 35 anos, natural do Forte da Casa, licenciado pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa, trabalha como designer gráfico mas nunca largou a arte de pintar paredes como forma de transmitir mensagens que começou a descobrir aos 13 anos de idade.

Na juventude era achincalhado na escola por usar óculos e a forma que arranjou de ganhar a simpatia dos alunos que o atacavam foi desenhar personagens de banda desenhada e desenhos animados, como o Bugs Bunny, e oferecê-los aos que lhe faziam bullying. João Pereira, 35 anos, nunca mais parou de desenhar e pintar ou grafitar e foi escolhido para fazer o mural de 190 metros na fachada do Museu do Ar, em Alverca, que assinala os 100 anos da travessia do Atlântico Sul por Gago Coutinho e Sacadura Cabral. O artista, natural do Forte da Casa, que encontrou a estabilidade financeira no trabalho de designer gráfico, ganhou o concurso que procurava a execução de uma obra marcante e que acabou por ter a assinatura de um artista do concelho de Vila Franca de Xira.
João Pereira, que tem dedicado a vida às artes e actualmente tem um projecto de hip-hop e outro de grafiti, considera que ter ganho o concurso “Vem pintar o Mural do Museu do Ar”, numa parceria da Força Aérea Portuguesa com a junta de freguesia, deveu-se ao seu poder de adaptação. Aos 13 anos começou a grafitar muros de espaços abandonados em busca de uma forma de se expressar artisticamente. O dono de uma loja de latas de grafiti juntava os miúdos que as compravam e tentava ensiná-los a grafitar. Mas cedo percebeu que, devido à má conotação que a arte do grafiti tinha nessa altura, seria prudente evitar problemas com as autoridades por pintar o que não devia, como alguns amigos faziam.
Começou por grafitar em muros devolutos procurando criar letras que fossem apelativas aos outros artistas e captasse a atenção das pessoas. Foi uma época de aventura com vários episódios caricatos como ter ficado com carraças no corpo por causa de pintar um local abandonado. Quando foi altura de decidir o seu futuro optou por ir para a Faculdade de Belas Artes de Lisboa e após o curso passou por empresas da área do design gráfico. Actualmente trabalha por conta própria.
O artista usa o grafiti como uma forma de criar uma ponte entre o seu trabalho e a sua paixão pela arte. Criou o projecto “D’outros Tipos”, que procura cooperar com artistas que tenham o mesmo ideal fazendo com que o grafiti não seja só uma arte mas também uma forma de passar mensagens. Um dos exemplos está numa das paredes da abandonada fábrica Eurofil, na Póvoa de Santa Iria, onde João Pereira pintou o trabalho com o título “Forever Young!!!”. Nesta pintura usou pincéis e tinta, em vez de spray, misturando a pintura com a estética do grafiti. Uma técnica que usou no mural do Museu do Ar. “Cada vez tenho usado menos latas de grafiti e passado a usar mais rolos e pincéis. É mais um desafio pessoal que estabeleci”, conclui.

Um colete reflector e um capacete para não ser chateado

A pintura do mural do Museu do Ar é uma das que tem maior expressão e até visibilidade depois de já ter feito também alguns trabalhos solicitados por autarcas. O interesse das autarquias pelo grafiti representa o reconhecimento de que esta é uma forma legítima de arte, mas reforça que ainda há muito trabalho a fazer no que toca à opinião da população, principalmente dos mais velhos, que ameaçam chamar as autoridades sempre que o vêem a pintar. Um dos truques que usa para não ser incomodado é usar um colete reflector e um capacete quando está a pintar. “Pareço um construtor civil e assim nunca mais me chateiam“.
Outra forma que o artista usa para impulsionar a mudança começa junto da comunidade onde vive. “Sou do Forte da Casa, cresci aqui e vou ficar aqui. É onde me sinto bem. Gosto de saber o que se passa com a comunidade e gosto de ajudá-la a exprimir-se com a minha arte. Procuro sempre falar com a autarquia em busca de oportunidades para trazer esta arte até às pessoas e mostrar-lhes que o grafiti também pode ser algo positivo”.
João Pereira, que está em conversações com diversas empresas para fazer grafitis e pinturas de murais nas suas instalações, assume que seguiu sempre o seu caminho e que o construiu à conta de muito trabalho e sensibilização. “Não fui atrás de modas, só faço o que sinto que encaixa nos meus ideais. Recusei e recuso trabalhar com pessoas ou empresas que estejam ligadas a extremismos ou qualquer tipo de discriminação”, realça, acrescentando que não aceita determinados trabalhos para não ter de se auto-censurar.

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