Tribunal confirma que Mouchão da Póvoa é privado mas Estado mantém intenção de fazer obras

Tribunal deu razão ao administrador de insolvência da empresa dona do Mouchão da Póvoa considerando que se trata de propriedade privada. Parte da ilha no meio do Tejo, junto à Póvoa de Santa Iria, está a ficar submersa devido a um rombo no sistema de diques.
O Estado e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) estão a planear gastar dois milhões de euros a reparar um dique que está a inundar o mouchão da Póvoa quando afinal a propriedade é privada, confirma o Tribunal da Relação. O mouchão da Póvoa, a maior ilha no meio do Tejo, junto à Póvoa de Santa Iria, com 810,20 hectares, é privado e a decisão sobre a sua propriedade foi decidida pelo Tribunal da Relação em Setembro de 2022, onde também rejeitou um pedido de condenação do Estado por litigância de má-fé e o absolveu do pagamento de uma multa e indemnização.
O administrador de insolvência da empresa Ilha Indústria Agrícola SA - que tenta recuperar dívidas deixadas a credores no valor de sete milhões de euros - lutava nos tribunais para provar a posse do mouchão e viu o tribunal de primeira instância dar-lhe razão. Alegava que a ilha tem um valor relevante para a massa insolvente da empresa que se afundou em dívidas em Fevereiro de 2017. O Ministério Público, inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que em Setembro último confirmou a decisão: o mouchão é mesmo propriedade privada e está inscrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira.
No acórdão da Relação a que O MIRANTE teve acesso, assinado pelos juízes Nuno Teixeira, Rosário Gonçalves e Manuel Marques, é considerado que se presume que o direito de titularidade da ilha “existe e pertence” ao titular inscrito na conservatória e que para provar o contrário o Estado teria de alegar e provar que a titularidade não corresponde à verdade, “o que claramente não conseguiu”, sustentam os juízes.
O administrador de insolvência alegou, em síntese, que o mouchão é propriedade privada desde Dezembro de 1864 tendo sido arrematado em hasta pública pela Companhia das Lezírias do Tejo em Junho de 1836 após autorização régia de venda. Desde então, por trato sucessivo, o mouchão entrou no capital de várias empresas até ser comprada pela Ilha S.A. em Setembro de 1987 e ter ficado expectante desde a falência desta, em 2017.
O Estado não concordou por considerar ter existido “falta de registo da acção de reconhecimento da propriedade” e colocou mesmo em causa a veracidade dos documentos apresentados pelo administrador de insolvência.
Projecto pronto em Abril
Mesmo sabendo que o mouchão é privado o Estado mantém a intenção de reparar o dique que está a inundar o espaço há seis anos. A APA explica que o projecto para reparação do rombo e reconstrução de uma porta de água está em elaboração e deverá ficar pronto em Abril. As verbas para a obra serão provenientes do Fundo Ambiental.
O caso do rombo no mouchão foi notícia pela primeira vez em O MIRANTE em 2016 quando um rombo de 30 metros num dos diques começou a gerar inundações. Na altura os proprietários tentaram fazer obras de urgência para tapar o buraco que a APA não autorizou. Em apenas um ano o rombo passou de 30 para 200 metros e a maior parte dos 800 hectares está hoje inundada. Em 2018 o então ministro do Ambiente, Matos Fernandes, foi ao mouchão prometer que a obra avançava. O concurso foi lançado mas quando a empresa vencedora meteu mãos à obra percebeu que os trabalhos eram mais vastos e complexos que os que constavam do caderno de encargos e desistiu da obra.