José Henriques é um dos últimos cesteiros tradicionais da região

José Henriques é natural de Ferreira do Zêzere e colabora com a Festa dos Tabuleiros, em Tomar, há mais de quatro décadas. Aprendeu a arte de fazer cestos à mão com o pai e lamenta que os jovens não tenham interesse em aprender trabalhos manuais. Aos 74 anos diz a O MIRANTE que não lhe falta trabalho.
José António Henriques, também conhecido como “Zé Cesteiro”, recebeu O MIRANTE na sua oficina numa altura em que existe muita azáfama e expectativa à volta da Festa dos Tabuleiros, em Tomar. Uma grande parte das bases dos tabuleiros são feitas no concelho vizinho de Ferreira do Zêzere, à mão, por um dos últimos cesteiros do Médio Tejo no activo e que colabora com uma das maiores festas nacionais desde 1980.
José Henriques aprendeu a arte com o pai, o mestre Ramiro Pires António; aos oito anos já fazia o fundo dos cestos. O pai era uma auto-didacta, recorda. “Os meus pais moravam à beira do rio Zêzere, na Aderneira. Grande parte da aldeia ficou submersa quando construíram a barragem de Castelo do Bode”, conta José Henriques. Com a subida das águas, em 1949, o pai construiu uma casa num planalto onde trabalhou toda a vida e criou quatro filhos, sempre a trabalhar como cesteiro. O surgimento do plástico trouxe muitos desafios ao mercado da cestaria. Para José Henriques a arte que pratica e o produto final tem muitas vantagens sobre o plástico: “Em termos ambientais não há comparação uma vez que a matéria dos cestos ao fim de uns anos desaparece na terra. Antes da Era do plástico havia em França centenas de milhares de cesteiros, tudo girava em torno desta industria”, recorda o artesão contando que aos 17 anos disse ao pai que não acreditava num bom futuro para a cestaria. Como tinha uma irmã em Angola escreveu-lhe e partiu à aventura.
Três anos depois fez 28 meses do serviço militar na Guiné-Bissau. Surge então a França como destino, oito anos a trabalhar na fábrica de automóveis da Peugeot. Regressou a Portugal com 32 anos e ainda esteve ano e meio numa fábrica de Ferreira do Zêzere antes de abraçar definitivamente a profissão de cesteiro. Para José Henriques a profissão é uma arte de família que já ultrapassa cinco gerações, afirma com orgulho. No entanto, diz que tem noção que o seu futuro depende muito das pessoas que trabalham para manter as tradições. “Provavelmente vai acabar porque não há jovens com interesse em aprender a arte. Quando se pratica uma actividade como esta não dá para trabalhar de braços cruzados. Ou se trabalha a sério ou fecha-se a porta”, sublinha
A visita de Marcelo Rebelo de Sousa
O trabalho de José Henriques, 74 anos, pode ser visto em feiras por todo o país. Para além da Festa dos Tabuleiros o artesão trabalha para a Feira dos Frutos Secos, em Torres Novas, a feira de Vila do Conde e a de Estremoz. “Deixei de fazer a Feira da Agricultura e a da Gastronomia, em Santarém, assim como a Fatacil, no Algarve. São muito caras e é preciso fazer muitas contas”, confessa, acrescentando que nas iniciativas encontra sempre muita gente que lhe dá os parabéns pelo seu trabalho.
Um dos momentos altos da sua vida de trabalho foi a visita de Marcelo Rebelo de Sousa à sua oficina em Ferreira do Zêzere. “Esteve aqui, ainda não era Presidente da República, e levou duas cadeiras feitas por mim”, conta o cesteiro que quis fazer uma oferta de um cesto para roupa suja, muito elogiado por Marcelo, mas não conseguiu. “Fez questão de pagar tudo o que levou. Só aceitou como lembrança um garrafãozito.” Mais recentemente José Henriques ofereceu à Junta de Freguesia de Ferreira do Zêzere uma máquina fieira eléctrica usada para desfiar o vime que está em exposição na sede da autarquia. A máquina de calibrar vime foi adquirida por Ramiro António, pai de “Zé Cesteiro”, em 1939, por 1.360 escudos. O artesão ainda tem consigo a factura da compra, efectuada na Metalúrgica Duarte Ferreira & Filhos, no Tramagal.