Sociedade | 19-03-2023 12:00

Mulheres continuam a enfrentar discriminação e preconceitos na política

Mulheres continuam a enfrentar discriminação e preconceitos na política
A vereadora Elvira Sequeira, a ex-vereadora e ex-deputada na Assembleia da República, Helena Pinto e a presidente da Câmara de Tomar, Anabela Freitas debateram os desafios da mulher na política na antiga escola primária de Alcorriol

Anabela Freitas, Elvira Sequeira e Helena Pinto. Três mulheres que fazem política na região e no país participaram no debate que assinalou o Dia da Mulher em Alcorriol, no concelho de Torres Novas. Recusaram a ideia de que as barreiras foram eliminadas com a lei da paridade e lamentaram as discriminações e os estereótipos que persistem.

A lei da paridade eliminou todas as barreiras para a entrada de mulheres na política? A forma de fazer política das mulheres difere da que é feita por homens? Alguma vez se sentiram discriminadas? Estas não são perguntas desactualizadas. São perguntas que continuam a fazer sentido em 2023 e que, na terça-feira, 7 de Março, foram respondidas por três mulheres que fazem política na região, no âmbito do debate organizado pela Associação Cultural e Recreativa do Alcorriol, no concelho de Torres novas, a propósito do Dia Internacional da Mulher.
Anabela Freitas, presidente da Câmara de Tomar, quis desde logo vincar que na política “as mulheres não são melhores nem piores que os homens” mas que é inegável que “têm formas diferentes de analisar” não só as questões políticas, como de lidar com as relações humanas. “Temos tendência a criar pontes, mas somos mais pragmáticas”, afirmou. Porém, as mulheres continuam a enfrentar obstáculos na vida política, onde os homens continuam a ter maioria, que se prendem com o ter que conciliar a vida familiar com a profissional - algo que a sociedade continua a exigir menos aos homens -, ter que “demonstrar muito mais” as suas qualidades e capacidades para se candidatarem a um cargo público e estarem sujeitas a um maior escrutínio por parte da sociedade.
“Temos que ter uma auto-estima muito forte”, enfatizou Anabela Freitas, confessando que deixou de ler comentários nas redes sociais, onde muitas vezes era criticada pela forma como se apresentava vestida ou penteada. “Se queriam uma ‘Barbie’ não tivessem votado em mim”, atirou sem rodeios, acrescentando depois que as funções, nomeadamente a escolha de pelouros, não pode ser feita com base no género de alguém. “Se há área que não gosto é a social. A mim dêem-me obras e protecção civil”, disse, lamentando que ainda persista esse estereótipo.

Lei da paridade é necessária mas o ideal era poder deixar de existir
Enquanto única mulher num executivo de sete, a vereadora na Câmara de Torres Novas, Elvira Sequeira, disse não ter dúvidas de que no discurso é a mais pragmática, além de não entrar em trocas de ‘galhardetes’ nas reuniões públicas. O pragmatismo, justificou, deve-se em parte ao facto de as mulheres terem a preocupação de fazer “render o tempo” por continuarem a ter maioritariamente o trabalho doméstico a seu cargo.
A lei da paridade veio trazer algum equilíbrio entre a representação feminina e masculina na política mas há dados que demonstram que em Portugal as mulheres ainda são uma minoria nos cargos de poder. “Nos 308 municípios do país, 243 nunca elegeram uma mulher para presidente da câmara. Os distritos de Castelo Branco, Guarda, Beja, Leiria e Viana do Castelo não têm uma única mulher presidente”, salientou o moderador e membro da associação da aldeia de Alcorriol, Gonçalo Cavalheiro, acrescentando que o número de mulheres a liderar municípios tem vindo a crescer mas de forma muito lenta. “Só em 2017 é que foram ultrapassados os 10% de mulheres nas presidências de câmara”, disse.
Helena Pinto, ex-deputada e líder do Bloco de Esquerda em Torres Novas, vincou que “a questão da paridade e da representação política das mulheres não tem a ver com a esquerda ou direita [partidária] tem a ver com a democracia e com o direito de um sector da sociedade estar representado”. Assumindo-se como uma “filha da [lei da] paridade”, disse que se actualmente a proporção de mulheres na Assembleia da República ou nas autarquias deve-se a essa lei que estabelece um limiar mínimo de 40% de mulheres e de homens nos cargos e órgãos de decisão política e administração pública. Mas o ideal, defendeu, seria depois de se alcançarem os 50% poder deixar de haver uma lei da paridade e da representação equilibrada.

Discriminação pode manifestar-se de variadíssimas formas
Na opinião de Helena Pinto uma mulher que esteja na política e que diga que nunca se sentiu discriminada é porque está a mentir. E essa discriminação, que pode manifestar-se de variadíssimas formas, é exemplo das barreiras que as mulheres continuam a ter que enfrentar. A título de exemplo, recordou uma reunião onde estavam várias deputadas à Assembleia da República que foram cumprimentadas por “minhas senhoras” ao passo que um funcionário do espaço onde decorria a reunião foi tratado erradamente por “senhor deputado”.
Também Anabela Freitas viveu vários desses episódios. Um deles, contou, ocorreu em 2013 momentos antes daquela que ia ser a sua primeira reunião na qualidade de presidente da Câmara de Tomar. Tinha acabado de chegar ao Terreiro do Paço, em Lisboa, para uma reunião no Ministério das Finanças, quando o segurança “automaticamente” tratou o motorista que a transportava como “senhor presidente”. A autarca socialista lamentou ainda a engenharia dos partidos na elaboração de listas, criticando que haja lugares, minoritários, previamente estipulados como sendo para ocupar por mulheres.

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