Alienação parental: o testemunho de um pai privado de contacto com os filhos após a separação
A alienação parental surge muitas vezes ligada a separações conflituosas de casais que expõem os filhos a situações de afastamento forçado com um dos progenitores.
A propósito do Dia da Consciencialização para a Alienação Parental Daniel Alcaparra partilha o seu testemunho de pai alienado que se viu privado, durante meses, de poder participar na educação dos seus filhos e das marcas invisíveis que essa forma de violência deixou.
A relação de 14 anos há muito que tinha deixado de ser um mar de rosas. Com uma traição pelo meio, da qual resultou uma gravidez, Daniel Alcaparra escolheu o caminho do perdão com receio de ficar privado do contacto com o seu filho mais velho, o único que tinha na altura, e, confessa, dar uma oportunidade à relação com a ex-companheira. Assistiu ao parto da bebé de outro homem e, durante anos, cuidou dela como se fosse sua. Mas a separação do casal foi inevitável. No dia em que foi “expulso” de casa, na sequência de uma discussão e apenas com a roupa que levava no corpo, o carro passou a ser o seu tecto durante dois meses e, durante oito meses, viu-se privado de ver os dois filhos biológicos e a menina que ajudou a criar.
“A minha filha tinha apenas cinco meses nessa altura, foi muito difícil. Não me deixava nem chegar perto deles. Dizia-me que se os queria ver tinha que pagar uma pensão de alimentos mas, nessa altura, eu mal conseguia sobreviver. Isto não está correcto, não se faz”, lamenta. Depois do trabalho, que nunca deixou, tentava acomodar-se nos bancos do carro onde enfrentava a dor psicológica, o cansaço e a desmotivação que o faziam mergulhar num buraco negro do qual não sabia sair. Não era viver, era sobreviver.
“Era comer uma sandes num café qualquer e andar a pedir roupas e que me deixassem tomar banho”, recorda na conversa com O MIRANTE que se faz na cozinha da casa para onde se mudou depois de conseguir reorganizar a vida, na Fajarda, concelho de Coruche, a propósito do Dia de Consciencialização para a Alienação Parental, que se assinala a 25 de Abril.
A alienação parental, conceito ainda recente, pode definir-se como um conjunto de comportamentos praticados consecutivamente por um pai ou uma mãe com o objectivo de excluir um dos progenitores da vida dos seus filhos. Na maioria dos casos a alienação está relacionada com separações e divórcios litigiosos. Para conseguir o que quer, o alienante, pode servir-se de discursos de ódio e pressões psicológicas para que seja o próprio filho a querer afastar-se do progenitor alienado ou até mesmo de actos jurídicos e falsas acusações que podem culminar na imposição de um afastamento.
“Durante muito tempo utilizou os nossos filhos para me atingir”
Voltando ao caso de Daniel Alcaparra, foi mais ou menos assim que aconteceu. Embora desconheça se a sua ex-companheira utilizava um discurso de ódio para denegrir a sua imagem junto das crianças, a partir do momento em que foi “posto fora de casa” tem a certeza de que foi alvo de acusações falsas de violência doméstica que o puseram frente a frente com um juiz. “Nunca a agredi. Não houve provas, mas fui condenado injustamente a quatro anos de prisão com pena suspensa”, diz explicando que tem que pagar à ex-mulher, até ao final do ano, 1.500 euros de indemnização, 500 euros à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, mais custas judiciais.
Ficou também proibido, lê-se no despacho do Tribunal Judicial de Santarém, de contacto com a ex-companheira e obrigado a frequentar um programa de violência doméstica. “Não sei o que fazer, pois além destes valores que não consegui pagar, ainda fiquei com dívidas de créditos de electrodomésticos [e outros bens] aos quais nem tenho acesso”, diz, explicando que foi por esse motivo que deixou de pagar os créditos, lamentando que até hoje não tenha conseguido reaver os seus pertences. “As minhas roupas, materiais da minha oficina de serralharia, continua tudo lá”.
“Durante muito tempo utilizou os nossos filhos para me atingir ao não me deixar vê-los. E com esta acusação conseguiu deixar-me [financeiramente] entre a espada e a parede”. Daniel Alcaparra fala, na primeira frase, no passado, pois conseguiu, entretanto, a guarda partilhada do seu filho, de 13 anos, e da filha de dois. Pode, finalmente, participar na educação dos seus filhos e partilhar as responsabilidades parentais. Mas, confessa, preocupa-o o insucesso escolar do filho adolescente que considera estar relacionado com a separação forçada entre pai e filho e do ambiente tóxico em que cresceu. A alienação parental deixa marcas e o tempo que lhes foi roubado, reconhece, jamais o irá recuperar. “Durante muito tempo esqueci-me como era sentir-me em família. Hoje valorizo cada momento”, mesmo o mais simples, “como estarmos à mesa todos juntos”, remata.