Encostatamim de Coruche quer reforçar apoio a doentes oncológicos em novas instalações
A associação de apoio aos doentes oncológicos de Coruche, Encostatamim, ambiciona ficar com o edifício da antiga Zona Agrária de Coruche.
O objectivo é acolher os doentes quando chegam do hospital e antes de regressarem a casa. A instituição conta com 14 voluntárias e acompanha meia centena de pessoas na luta contra o cancro.
O edifício devoluto onde funcionou até 2008 a Zona Agrária de Coruche, entidade tutelada pelo Ministério da Agricultura, pode vir a transformar-se numa unidade de cuidados temporários para acolher os doentes oncológicos apoiados pela Associação Encostatamim. Esta é a ambição da presidente da associação de Coruche, Adalgisa Gameiro, que considera que aquele edifício pode ser adaptado para acolher os doentes oncológicos quando saem do hospital e antes de regressarem a suas casas.
O edifício localiza-se na vila de Coruche, na Rua dos Bombeiros Municipais, e está sem funcionar desde que a tutela decidiu o seu encerramento. Adalgisa Gameiro apelida de castelo aquele edifício, dadas as características de uma das suas torres. “Estamos à espera que a câmara nos dê a possibilidade de passarmos para ali. Faríamos um protocolo com o Centro de Saúde de Coruche e os médicos em vez de irem ver os doentes a casa iam ali. Podemos ter um ginásio para os doentes e um espaço para os acolher até estarem em condições de regressarem a casa”, explica.
O presidente do município de Coruche, Francisco Oliveira, refere a O MIRANTE que se trata de um processo moroso mas garante que está a ser tratada a proposta de uma futura aquisição do edifício ao Ministério das Finanças para albergar a instituição. O autarca sublinha que a demora no processo contribui para a degradação do edifício, o que pode influenciar uma futura adaptação do espaço à instituição.
Voluntárias acompanham o processo dos doentes
A associação acompanha actualmente cerca de 50 pessoas com cancro. A mais nova tem 39 anos. Muitas pessoas que são ajudadas atravessam dificuldades financeiras, agravadas pela doença. A Encostatamim intervém através do pagamento de despesas que os doentes deixaram de poder pagar como água, luz, renda, alimentação e deslocações para os tratamentos e consultas. Os doentes que o solicitem podem ser acompanhados pela psicóloga na sede da instituição mas o maior conforto vem das 14 voluntárias. As longas conversas com os doentes e a informação que transmitem ajudam a superar os períodos mais difíceis. A loja no centro histórico da vila de Coruche, onde funciona a Encostatamim, está aberta de segunda a sexta-feira. É por isso frequente ver os doentes sentados no banco de jardim que está à entrada ou a conversar com as voluntárias.
A pandemia agravou a detecção do cancro em alguns doentes, com pessoas que deixaram de ser acompanhadas nos hospitais. Agora batem à porta da associação já em fase avançada da doença e acabam por falecer ao fim de pouco tempo.
Adalgisa Gameiro, hoje com 70 anos, venceu a batalha contra um cancro de mama e fundou a associação em 2008. Mas nunca se habituou às mortes de quem não consegue travar a doença. “Quando acompanho o processo de alguns doentes já estou a ver o fim. Mas a mensagem que transmitimos é sempre positiva e transparente. Estamos com as pessoas até ao último momento”, diz. A história mais marcante para a dirigente foi a de um doente que vivia sozinho e quando chegou ao Hospital de Santarém já estava no fim de linha. Faleceu agarrado à sua mão.
A Encostatamim tem 4.200 sócios que pagam quotas, mais o apoio financeiro da Câmara de Coruche e Junta de Freguesia de Coruche. A sede da associação recebe doações de roupa, malas e calçado que depois se encarrega de disponibilizar através de donativo monetário. Tem duas garagens onde armazena mobílias, colchões, frigoríficos, cadeiras de rodas e material ortopédico para facultar aos doentes.
Os voluntários estão ainda nas freguesias do Couço, Biscainho e Lamarosa e sinalizam e reencaminham os doentes oncológicos para a instituição. A voluntária Maria da Conceição, conhecida por Bia, 72 anos, está ao serviço dos doentes duas vezes por semana. E é assim há 16 anos. Diz que por muito que queira nunca se consegue desligar dos doentes. “O que me impressiona é quando passam por aqui pessoas a quem nos dedicamos mais. Quando partem é doloroso, vai também um bocadinho de mim”, diz comovida.
Já Manuela Brotas, 69 anos, voluntária há 16 anos, lida com a doença de forma mais natural. Trabalhou como administrativa no Centro de Saúde de Coruche, onde ela própria ajudava quem entrava nas urgências. Venceu um cancro há 18 anos assim como o seu filho que aos 24 anos também passou pelo mesmo. Afirma por isso que nada a impressiona nos casos que acompanha.
Quanto mais cedo melhor
Seis meses após ter dado à luz o terceiro filho Elsa Rita, 40 anos, moradora em Santana do Mato, soube que tinha leucemia. Não queria acreditar. Sentia-se cansada mas atribuiu à maternidade e ao facto de tomar conta da avó. O médico mandou fazer umas análises ao sangue em que foi detectada a doença. Entregou os filhos ao cuidado da tia, deixou a avó e o marido e foi internada no Hospital dos Capuchos, em Lisboa. Durante 20 dias proibiu as visitas de todos os familiares e várias vezes desligou o telefone. Elsa já era sócia da Encostatamim e recebeu palavras de conforto durante o seu percurso. Ao fim de quatro anos venceu a doença mas nunca mais foi a mesma. Cansa-se com facilidade e tem menos força nos braços. O corpo passou a responder de outra forma.
Visita assídua na instituição, Fernandes Augusto, 75 anos, morador em Coruche, superou um cancro do cólon. Andou anos a queixar-se ao médico de família que desvalorizou os incómodos que sentia. Anos mais tarde soube da doença através de um exame médico. Diz que é um homem de coragem e não ficou alarmado com a notícia da doença. Sempre pensou positivo apesar de ter estado sete dias em coma no Hospital de Santarém. A sutura interna rompeu na sequência da operação de remoção do tumor.
Não tinha possibilidade de se deslocar ao hospital para os exames e tratamentos e por isso a instituição ajudou-o com as deslocações. Quanto à doença deixa o alerta: “É fundamental saber o mais cedo possível. Se no meu caso soubesse quatro ou cinco anos antes fazia a diferença”. Também Adalgisa Gameiro reitera que nada melhor que conhecer o próprio corpo. “Quando desconfiarem que alguma coisa não está bem devem fazer rastreios ou recorrer ao médico”, alerta.