Comunidade mobiliza-se e resiste à quadruplicação da linha ferroviária em VFX
Uma centena de pessoas debateu os impactos da quadruplicação da linha ferroviária do Norte que vai afectar Vila Franca de Xira e Alhandra. Ficou assente a criação de um movimento de cidadãos para exigir explicações à Infraestruturas de Portugal. Desconhecimento é o que alegam os comerciantes mas também os autarcas que temem os impactos do progresso.
Está a aumentar a preocupação entre a população sobre os impactos da eventual quadruplicação da linha ferroviária entre Alhandra e Vila Franca de Xira e a forma como as suas vidas podem ser afectadas. Sintoma disso foi a presença de mais de uma centena de pessoas no Ateneu Artístico Vilafranquense, no chuvoso feriado de 8 de Junho, para um debate de mais de três horas e meia sobre o assunto.
A discussão foi promovida pelo Ciradania - Movimento de Cidadãos do município de Vila Franca de Xira - e contou com uma plateia de autarcas de todas as forças partidárias e cidadãos de Vila Franca de Xira e de Alhandra. A encabeçar o debate, suportado por um powerpoint, Carlos Gaivoto, especialista em ferrovia e chefe de planeamento de transportes de Lisboa, defendeu existirem alternativas à quadruplicação da linha de comboio proposta pela empresa pública Infraestruturas de Portugal (IP).
O especialista apresentou como solução a modernização do controlo de velocidade dos comboios, que já está regulamentada a nível europeu mas que falta introduzir em Portugal. “Temos de fasear esta transição que é muito mais barata e não arrasa com a parte urbana, tão querida das pessoas. Na modernização do sistema de controlo de velocidade podem ser introduzidos intervalos de três a quatro minutos entre cada serviço de comboio”, explica.
Carlos Gaivoto vai mais longe e diz que não está comprovada a necessidade de ter uma ligação de alta velocidade entre Lisboa e Porto. “Era mais prioritário estarmos ligados à rede europeia, nomeadamente a Espanha, para reduzir os voos ibéricos. Alta velocidade entre Lisboa e Porto, sem parar em Coimbra, é uma fantasia que só pode ser atirada para a frente para justificar obras de betão que não são prioridade”, reitera.
A luta continua
Uma onda de dúvidas e perguntas surgiu da plateia nomeadamente o que pode ser feito para reverter aquilo que parece ser uma inevitabilidade. Todos foram unânimes em não baixar os braços e por isso vai ser criado um movimento de cidadãos contra a quadruplicação da linha e que junta a população das duas freguesias mais afectadas. As formas de luta vão passar por debates públicos, intervenções em reuniões de câmara e assembleia municipal e em última instância recorrer aos tribunais.
No debate vários populares disseram ainda não se conformar com o silêncio da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira e consideraram que a autarquia devia ter uma voz mais activa perante a IP. Recorde-se que o documento apresentado pelos técnicos da IP propõe a desactivação da actual estação de comboios de Vila Franca de Xira e a reformulação da zona do cais, com a eliminação da passagem de nível e do Jardim Constantino Palha. Em Alhandra está previsto, por exemplo, o abate de 160 árvores ao longo da Avenida Afonso de Albuquerque.
O plano de quadruplicação proposto já tinha despertado preocupações e críticas acaloradas por parte da população que teme os impactos negativos na comunidade e no meio ambiente. Pelo menos 800 pessoas já assinaram a petição online lançada por um morador de Vila Franca de Xira contra a actual proposta para a linha férrea.
Autarcas querem mais esclarecimentos da IP
O presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira é a favor do projecto apresentado pela IP. Ricardo Carvalho (PS) recorda que a cidade já teve três linhas de comboio e apela aos vilafranquenses para acompanharem o progresso sob pena de ficarem para trás. “Não sou engenheiro mas falo como cidadão. Enterrar a linha junto ao Tejo não é possível. Alverca e Póvoa de Santa Iria têm quatro linhas. Pode haver maior cadência no número de comboios. A antiga estação pode ser um local de turismo”, diz a O MIRANTE.
Em Alhandra, a junta solicitou ao presidente do município, Fernando Paulo Ferreira, um debate público na freguesia, com os técnicos da IP, para a população perceber quais os impactos da obra. Para o presidente da União de Freguesias de Alhandra, São João dos Montes e Calhandriz, Mário Cantiga (PS), o projecto para Alhandra é pouco rigoroso uma vez que não está claro qual a área que entra na Avenida principal da vila. “Do ponto de vista da discussão pública a junta já fez chegar à IP várias ideias que devem ser consideradas, como a deslocalização da estação de comboio para sul. A zona do Campo do Hortinha pode ser um parque de estacionamento”. Se a intenção da IP for inevitável, o autarca afirma que terá sempre uma postura de mediação para mitigar os impactos que a obra possa implicar.
A modernização da Linha do Norte levou o vereador da Coligação Nova Geração (PSD/PPM/MPT), David Pato Ferreira, a dirigir uma carta aberta ao presidente da Câmara de Vila Franca de Xira. Entre outras questões, o vereador quer que a IP mostre que soluções alternativas foram desenvolvidas e que demonstram que do ponto de vista técnico e financeiro o enterramento da linha não é possível.
“O fim do Colete Encarnado como o conhecemos”
A Comissão de Freguesia de Vila Franca de Xira do PCP também se pronunciou lamentando que o PS seja favorável ao actual projecto de expansão da linha. “Criar uma auto-estrada de comboios, com mais de 30 metros de largura, e máquinas a passar a mais de 140 quilómetros por hora no centro da cidade, em cima do rio, é o fim do Colete Encarnado como o conhecemos e da própria cidade”.
A Câmara de Vila Franca de Xira apresentou uma posição unânime, com todos os partidos, em Novembro de 2022. As mesmas preocupações foram recordadas a 5 de Maio, antes da apresentação do projecto da IP em reunião de câmara. Os autarcas levantam questões quanto aos impactos ambientais nas zonas urbanas confinantes à linha de comboio (Vila Franca de Xira, Alhandra, parte de Alverca do Ribatejo e Póvoa de Santa Iria), nomeadamente: o número de circulações suburbanas e regionais actuais e futuras, bem como os seus horários, que não deverão sofrer constrangimentos; e as soluções preconizadas para a linha que podem significar alterações relevantes no território e na malha urbana especialmente nas freguesias de Vila Franca de Xira e Alhandra, onde o canal dedicado é mais estreito e confinante com estruturas edificadas do que no restante troço.