Burlas com cartão Universo do Grupo Sonae continuam a aumentar na região
Cartões virtuais criados sem o conhecimento dos clientes e múltiplas transacções feitas com cartões desactivados, que se traduzem em dívidas de muitos milhares de euros, são apenas algumas das façanhas dos burlões.
A Universo, do Grupo Sonae, está a pressionar clientes para pagarem as dívidas e alguns passaram a ter o nome na lista negra do Banco de Portugal. De Vila Franca de Xira a Abrantes, O MIRANTE falou com várias vítimas deste esquema.
Burlões informáticos têm utilizado múltiplos esquemas para arrancar dinheiro aos clientes do cartão Universo, desde fraudes através de phishing, onde a vítima acede, clicando num link enviado por SMS, a uma página falsa semelhante à verdadeira e introduz as suas credenciais de acesso; a cartões virtuais criados na área de cliente com dados capturados. Segundo a Deco Proteste, só até final de Maio já recebeu centenas de denúncias de burlas com este cartão, mais do que em todo o ano de 2022, no qual registou 176. Mas há um padrão nas centenas de histórias que chegaram à Deco que “é demasiado consistente” e “dificulta a tese de que todos os lesados introduziram códigos”, o que descartaria “imediatamente a responsabilidade da entidade emissora”.
António Mesquita, empresário do ramo automóvel, de Santarém, é um dos consumidores lesados com o cartão de crédito ligado ao Grupo Sonae. Foi há cerca de um mês que abriu um link, contido numa mensagem a informar que a sua conta tinha sido suspensa por motivos de segurança. A página, adivinha agora, “devia ser falsa”, mas na altura de nada suspeitou. Nesse mesmo dia, quando abriu a aplicação do cartão Universo no seu telemóvel apercebeu-se que havia uma transacção recusada por saldo insuficiente. “Só tinha disponíveis 149 euros”, quando o seu crédito mensal autorizado, que nunca chegou a utilizar, era de mais de 2.500 euros.
Apresentou de imediato queixa na PSP e foi à Worten, uma das lojas do Grupo Sonae onde pode ser feito o pedido do cartão, mas, neste caso, para proceder ao seu cancelamento. Surpreendentemente, nesse dia, já depois de a conta estar bloqueada, foram realizadas “por alguém” mais duas transferências. No total foi burlado em 2.480 euros. “Só não cancelaram os movimentos porque não quiseram, quando os avisei os movimentos estavam cativos e a Universo não os cancelou”, conta o empresário, que já decidiu pagar a dívida que não contraiu - embora vá lutar para reaver o dinheiro - para que o seu nome não passe a integrar a lista negra do Banco de Portugal (BdP).
Foi precisamente a essa lista que foi parar o nome do ex-militar Eduardo Costa, residente em Alpiarça, mais uma das vítimas dos ataques dos cibercriminosos. A dívida contraída através de um cartão virtual criado por alguém já ultrapassa os 1.500 euros com juros. Não atendeu nenhum telefonema suspeito, não abriu nenhum link do Universo, muito menos, garante, fez algum cartão virtual. “Fui ver os extractos e tinha nove movimentos que não estavam a ser feitos por mim”, refere explicando que de imediato entrou em contacto com o Universo e deu o alerta.
Também neste caso, o dinheiro ainda não tinha sido libertado, mas a marca de cartão de crédito do Grupo Sonae nada fez para impedir a transacção. Passada uma hora estavam mais quatro transferências pendentes. No dia seguinte, mais uma e todas, à excepção de uma que foi devolvida pela entidade intermediária de transferências, Monisnap, foram concretizadas. “O que diz a lei é que a partir do momento em que se avisa uma vez a responsabilidade é deles [da entidade emissora] Mas estão a exigir-me que pague tudo, quando os movimentos foram concretizados depois de eu ter dado o alerta”, refere o co-administrador do grupo de Facebook “Burla Universo” que conta com mais de 900 membros e relatos de burlas com menos de uma semana, outras com meses.
Diz o Banco de Portugal que tal como já acontece nos acessos online às contas bancárias, desde 31 de Dezembro de 2020 os bancos/prestadores de serviços de pagamento devem solicitar autenticação forte aos seus clientes sempre que estes efectuam compras online com cartão. Tal medida implica que solicitem ao cliente dois ou mais elementos, como uma palavra-passe e de “posse”, como por exemplo um código enviado por SMS para o telemóvel provando, desta forma, a posse do dispositivo.
Universo começou a reembolsar clientes lesados
O Universo, em resposta enviada por email a Eduardo Costa, assegura que foi enviado um código OTP (sequência de números enviada para permitir, por exemplo, uma transacção) para a sua área de cliente, o que permitiu que fosse criado o cartão virtual e acrescenta que os movimentos foram devidamente autenticados. Esses códigos, garante por sua vez Eduardo Costa, nunca os recebeu e desconhece para que dispositivo foram então enviados. Pediu ao Universo os registos de OTP, mas até hoje não lhe foram enviados. Em resposta à Deco, os responsáveis pelo cartão Universo alegam ter “registo de todos os SMS com códigos enviados e guardar evidências para mostrar que todas as operações foram aprovadas pelo cliente”.
Caso semelhante ao de Eduardo Costa aconteceu com António Silva, de Abrantes, que de um dia para o outro tinha uma dívida ao Universo de 1.418 euros por compras feitas em Paris e transferências através de um cartão virtual. “Não o fiz e nunca recebi códigos nenhuns para permitir que fosse feito”, diz, salientando que nunca utilizou o cartão Universo, que decidiu ter só porque acumulava uma percentagem do valor das compras feitas numa cadeia de hipermercados do Grupo Sonae. Chegou a pagar mensalidades de mais de 300 euros da dívida com receio de ficar como devedor no BdP. “Este mês já não paguei”, refere, acrescentando que apresentou queixa na PSP e fez uma participação ao BdP, tal como o ex-militar residente em Alpiarça.
Este mês começaram a ser contactados pela Universo alguns dos clientes burlados que reclamaram das dívidas que não contraíram para serem informados que vai ser feito o reembolso dos valores que, para já, ficará cativo. Foi o caso de Sílvia Gomes, de Alverca do Ribatejo, concelho de Vila Franca de Xira, burlada nos meses de Maio e Junho, através de múltiplas transacções de valores baixos e semelhantes, num total de 96 euros.