Sociedade | 04-07-2023 18:00

Drogas leves podem ser tão destrutivas como as drogas pesadas

Drogas leves podem ser tão destrutivas como as drogas pesadas
Especialistas debateram o perigo das drogas leves no desenvolvimento dos jovens

Prevalência do consumo de substâncias psicoactivas ilícitas aumentou e a variedade de escolha nunca foi tão elevada. Entre os jovens a cannabis é a mais popular, mas para os profissionais que trabalham com pessoas com dependências não faz sentido distinguir drogas leves de pesadas, já que o grau de risco depende de factores que vão além do tipo de substância. O tema foi a debate na Secundária Dr. Manuel Fernandes em Abrantes.

A prevalência do consumo de substâncias psicoactivas ilícitas ao longo da vida em Portugal subiu mais de 60% de 2001 a 2022, passando de 7,8 para 12,8%. Também a prevalência do consumo de tabaco em Portugal aumentou de 48,8% para 51% entre 2017 e 2022 e a do consumo de álcool de 49,1% para 56,4%. Estes são dados do V Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral, promovido pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) e divulgado um dia depois de, em Abrantes, na Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes, se ter debatido sobre o consumo das denominadas drogas “leves” nas II Jornadas de Comportamentos Aditivos e dependências, subordinadas ao tema “Drogas leves: recreativas ou patológicas”.
A responsável pela Equipa de Prevenção no Centro de Respostas Integradas no Ribatejo, Sofia Nunes, alertou que entre as substâncias psicoactivas a cannabis é percepcionada como a substância com maior acessibilidade, sendo a que tem maior prevalência de consumo nos jovens com 18 anos. Tem também esta substância sofrido alterações ao nível do THC (principal psicoactivo), registando um aumento de 22,5% na forma de haxixe o que, sublinhou, acarreta um maior risco de desenvolvimento de transtornos psicóticos, podendo levar à esquizofrenia.
“O cérebro está em desenvolvimento até aos 25 anos e o padrão de consumo - de canabinóides - com regularidade vai comprometer o desenvolvimento do nosso sistema endocanabinóide” que é fundamental na formação e diferenciação de diversos tipos de células e na “maturação neurológica”, explicou Sofia Nunes, refutando depois alguns dos mitos associados ao consumo de cannabis, nomeadamente que é menos prejudicial à saúde do que o tabaco ou que previne o cancro. Também não há, sublinhou, evidências científicas de que o consumo de canabinóides vá melhorar quadros de psicose, ansiedade ou depressão.
Drogas leves podem causar prejuízos sérios na regulação emocional e problemas cognitivos
Pelo contrário, o uso das chamadas drogas “leves”, como cannabis, ecstasy e LSD, está associado a “problemas de desorganização, prejuízos sérios na regulação emocional” e problemas cognitivos nos jovens, aumentando em três vezes a probabilidade de desenvolver psicoses quando o uso é diário, salientou Alceu Dias, psicólogo clínico que está ligado ao Projecto Homem e que, com estes alertas, desconstruiu perante uma plateia jovem que não faz sentido fazer a distinção entre drogas “leves” e “pesadas”.
“As drogas leves podem ser tão ou mais destrutivas que as ditas pesadas”, reforçou o psicólogo na comunidade terapêutica Projecto Homem de Abrantes, Nuno Lopes, que assumiu o papel de moderador, tal como a directora do Centro de Respostas Integradas do Ribatejo, Susana Mafra. Além disso, vincou ainda o director do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências, João Goulão, utilizar a denominação de “leve” pode estimular o consumo desse tipo de drogas, passando-se as falsas premissas de que não viciam ou não são prejudiciais à saúde e bem-estar. “Um charro pode ser mais destruidor da vida de um jovem do que o uso ocasional de cocaína ou heroína” porque, sustentou, as drogas “são inertes, não impõem o seu uso”, a sua frequência, quantidade ou contexto em que são utilizadas. Tudo vai depender do utilizador e da relação que estabelecer com a droga utilizada - para se divertir, para aliviar a dor ou sofrimento, etc...
João Goulão, que acompanhou e participou na criação das primeiras respostas para o tratamento de pessoas com comportamentos aditivos e dependências, chamou por último à atenção para o facto de as drogas serem cada vez mais um “fenómeno transversal” e que a sua “diabolização” não é o caminho certo para a sensibilização. O que faz falta, acrescentou Alceu Dias, é haver mais meios disponíveis e mais profissionais para que as respostas, do tratamento à sensibilização, possam crescer e ser melhoradas.

Projecto Homem de Abrantes na linha da frente da intervenção

A Comunidade Terapêutica João Guilherme – Projecto Homem é uma valência do Centro Social Interparoquial de Abrantes (CSIA), especializada na intervenção em comportamentos aditivos e dependências e que celebra 25 anos de existência. Nas palavras do padre António Castanheira, presidente da direcção do CSIA, é um projecto que “tem juntado os cacos de muitos homens e mulheres”.
O Projecto Homem, responsável pela organização das Jornadas, foi descrito pela vereadora na Câmara de Abrantes, Raquel Olhicas, como sendo de extrema importância para a comunidade. “Conheço as instalações, os meandros profissionais com que vocês se deparam todos os dias e é louvável o trabalho que fazem em prol da nossa comunidade”, afirmou.

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