Sociedade | 23-07-2023 15:00

À procura da vaca-ruiva na floresta de Tomar

À procura da vaca-ruiva na floresta de Tomar

Chama-se vaca-ruiva, é um escaravelho de que pouco se sabe e a associação sociocultural e ambientalista 30 por 1 linha, de Torres Novas, é a única no distrito de Santarém a identificar e a estudar o insecto que se alimenta de madeira morta, e que é um indicador da qualidade da floresta. Em Tomar a associação fez o terceiro fim-de-semana da vaca-ruiva para alertar para a sua importância.

O que é que leva um grupo de pessoas com lanternas a andar pelo meio do mato à procura de escaravelhos? O facto de gostarem da natureza e a vontade de conhecer mais sobre um insecto de que pouco se sabe e que tem um nome comum curioso: vaca-ruiva. A associação 30 por 1 linha de Torres Novas tornou-se embaixadora de um projecto de identificação das zonas onde este escaravelho que se alimenta de madeira morta e que só existe na Península Ibérica, sul de França e norte de África. No sábado, dia 15, ao final do dia, os caçadores de escaravelhos concentraram-se na periferia de Tomar, num bosque perto da Ponte de Peniche, sobre a qual também pouco se sabe.
Os participantes acompanhados por três elementos da associação seguiram por um trilho naquele que foi o terceiro fim-de-semana anual dedicado a este insecto, com o objectivo de sensibilizar para a sua importância. A vaca ruiva (Lucanus Barbarossa) deve o seu nome a uma penugem arruivada, que se nota sobretudo à luz. O percurso foi defenido pelo meio da vegetação onde existem carvalho-cerquinho, uma espécie autóctone que está em declínio. A noite começa a cair e acendem-se as lanternas para tentar descobrir estes bichos que têm entre três e quatro centímetros e meio, explica Filipa Coelho. As lanternas não são só para os descobrir, já que se percebeu que estes escaravelhos são atraídos pela luz.
A missão da associação é dar a conhecer o escaravelho para que as pessoas possam, quando os encontram, comunicar os locais de avistamento e assim fazer-se um mapa da sua presença no território nacional. Hugo Ribeiro, outro elemento da associação, salienta que até há três anos não fazia ideia que existia esta espécie, prima de uma outra que já está mais estudada, que é a vaca-loura e que tem mais presença em zonas de carvalho-alvarinho ou o castanheiro, mais no norte do país. O voluntário da 30 por 1 linha conta que já houve pessoas que registaram a presença da vaca-ruiva nas suas casas, nos quintais, talvez atraídos pela luz. Não porque o insecto anda rápido, mas porque consegue voar.
A importância da identificação dos locais onde se encontram é importante, porque a sua presença é indicadora da qualidade da floresta. No último festival Bons Sons, em Cem Soldos, Tomar, a associação fez uma campanha de sensibilização, que cativou “muita gente interessada em saber mais sobre a vaca-ruiva”, conta Filipa Coelho. Outro dos rostos da associação sociocultural e ambiental, João Pires, realça que a 30 por 1 linha é a única que se dedica ao estudo deste insecto no distrito de Santarém.
Pelo trilho, já noite escura, com uma hora e meia de caminhada, com as lanternas apontadas aos troncos das árvores, não se avistam vacas-ruivas. Podem estar ainda enterradas no solo porque são insectos noctívagos. Alguns vestígios na base dos troncos dá a ideia que há escaravelhos nessa zona, mas não aparecem. Também se pode dar o caso de ainda estarem na fase larvar, apesar de ser a partir de Julho que se transformam. Têm características idênticas ao ciclo das borboletas, mas com um tempo de vida muito mais longo. A vaca-ruiva, segundo se sabe, pode viver quatro anos, a maior parte do tempo em fase larvar que se alimenta da madeira morta, devolvendo nutrientes ao solo.
Já se estava a chegar ao fim do percurso, depois de se passar por um ponto de luz, com um projector e um pano branco, que não atraiu qualquer escaravelho, quando apareceu um no tronco de uma árvore perto do início, na Ponte de Peniche. Alguns dos participantes puderam ver pela primeira vez um escaravelho que pode estar em extinção com o desaparecimento da floresta autóctone.

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