Sociedade | 26-08-2023 18:00

Kikas entrega o bar La Siesta e diz que vai desfrutar da vida

Kikas entrega o bar La Siesta e diz que vai desfrutar da vida
Kikas vendeu o La Siesta, bar nocturno no Vale de Santarém, a empresários espanhóis. Quer agora descansar e aproveitar a vida junto da família

Maria da Conceição António ficou conhecida pela Kikas do Vale de Santarém onde a sua casa nocturna ganhou fama nacional e internacional por ser diferente e onde a filosofia era o respeito mútuo.

Ao longo de 20 anos a empresária geriu o espaço com mão-de-ferro para que não houvesse abusos ou confusões. Agora deixou o negócio porque se sente cansada, porque quer viver com a família e desfrutar da vida.

Maria da Conceição António, conhecida por Kikas, deixou de trabalhar na noite, para onde não quer voltar mais, e passou aquela que é uma das casas nocturnas mais conhecidas no país para empresários espanhóis, que trabalham na área. A empresária do bar La Siesta, no Vale de Santarém, em conversa com O MIRANTE, conta que decidiu deixar o negócio por cansaço e por estar a ser cada vez mais difícil trabalhar na noite. Confessa que quer ter tempo para a família, que não teve ao longo de 43 anos de trabalho a dormir poucas horas, sem fins-de-semana e sem férias. Só de há um ano a esta parte, realça, é que passou a ter o domingo para descansar.
Kikas diz que há quem tenha o sonho de ter uma casa na praia. Ela tem uma na zona Oeste, perto da praia, há vários anos, e usufruiu do espaço uma ou duas vezes. Agora quer desfrutar da casa, passear, viver a vida que não conseguiu viver e sobretudo estar com o filho e com a neta de 11 anos de idade. “Quero viver com a família”, realça a empresária prestes a fazer 63 anos, salientando que ainda era respeitada na noite, mas que já começava a ver algumas situações mais conturbadas. Numa nota de despedida que publicou nas redes sociais, Maria da Conceição António agradece a todos os que fizeram parte do seu percurso do qual se orgulha. “Encerrei um capítulo longo onde criei, inovei, lutei muito, derrubei muitas barreiras e muitos preconceitos. Ergui muitos conceitos inovadores na época que, acredito, serão intemporais e perpetuar-se-ão nas memórias de quem as vivenciou pelo menos uma vez na vida”. A empresária realça ainda que no bar criaram-se “memórias em Portugal e no mundo colocando o nome do La Siesta (A Kikas) nos mais altos níveis reputacionais”.
Kikas diz que a reputação que alcançou foi fruto de muito rigor, inovação, bom atendimento do cliente e sobretudo devido ao “respeito mútuo que era obrigação intransigente nas normas da casa”. Salienta que o sucesso do La Siesta se deveu em grande parte aos clientes “fantásticos e fiéis” que foram os portadores do bom nome da nossa casa. Maria da Conceição António recorda que o sucesso lhe deu visibilidade suficiente para, ao longo dos anos, ajudar inúmeras causas sociais, singulares e colectivas, com inúmeros eventos de solidariedade em que os clientes ajudaram a alcançar os objectivos. A boa vizinhança e a ligação à população do Vale de Santarém foi um dos factores que ajudou o bar a alcançar o sucesso. “Não posso deixar de agradecer e mostrar gratidão à população do Vale de Santarém, nomeadamente quem mora na zona circundante ao bar, onde sempre imperou a cooperação, compreensão e um enorme respeito”, destacou. E termina dizendo que ao longo de duas décadas a trabalhar na noite marcou algumas vidas, ajudou o próximo, aprendeu, ensinou, riu e chorou. “Acima de tudo vivi. Vivi muito este projecto que tanta saudade me vai deixar. Não fomos melhores nem piores, fomos diferentes”, conclui.

Uma mulher polémica que soube ser respeitada

Maria da Conceição António foi sempre uma mulher de pulso, que sabia manter o bar em segurança e a quem todos os clientes respeitavam. No negócio era irreverente, usava linguagem obscena, mas não dava margem para confianças além dos limites. O sucesso da casa valeu-lhe várias operações policiais. Tentava sempre que era visitada pelas autoridades ter tudo o que lhe era exigido legalmente. Mesmo assim passou por alguns momentos em que teve de prestar contas à justiça.
Em Janeiro de 2008 Kikas foi absolvida dos crimes de lenocínio e auxílio à imigração ilegal. O colectivo de juízes, que julgou o caso com base numa investigação da GNR, que apontava para a ligação da empresária à exploração de mulheres na prostituição, considerou que as provas produzidas durante o julgamento não eram suficientemente fortes. Não se provou que no estabelecimento se fornecessem favores sexuais. Também não se provou que Kikas tivesse conhecimento que as mulheres que estavam no bar, sobretudo brasileiras, estavam ilegais no país. Até porque algumas já estavam há algum tempo em Portugal e não vieram do Brasil propositadamente para o seu bar. Na altura, o procurador António Artilheiro, disse que “uma coisa é o que se ouve dizer ou o que se passa na prática, outra é o que se prova”. Em Novembro do ano passado o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras constituiu Maria da Conceição António arguida, indiciada de ter no estabelecimento mulheres estrangeiras a residir ilegalmente em Portugal. A operação, denominada ‘Matertera’, envolveu cerca de três dezenas de inspectores e consistiu em várias buscas a casas e ao estabelecimento de diversão nocturna no âmbito de uma investigação que decorria desde 2019 não havendo ainda desenvolvimentos do processo.

Centenas de comentários com elogios ao espírito solidário de Kikas

A notícia online no site de O MIRANTE sobre o bar La Siesta originou em dois dias mais de quatro centenas de comentários na página do jornal no Facebook, alguns dos quais a solidarizarem-se com Maria da Conceição António, destacando o lado solidário de uma mulher num negócio polémico. Com 335 partilhas, a notícia teve comentários divertidos, alguns jocosos, e muitos em tom sério recordando o percurso de Kikas e valorizando a ajuda que deu a muitas crianças ajudando em tratamentos médicos ou na aquisição de cadeiras de rodas, como escreve Tiago Gonçalves.
Rui Manuel, que diz conhecer a empresária desde a infância, escreveu que apesar de ter “um negócio de prostituição” ajudou muita gente como “uma menina que estava na iminência de ficar cega para ser operada em Cuba”. E lembra que na pandemia alugou carros para distribuir alimentos e medicação a quem precisava.
Há várias mulheres também a comentarem a notícia e entre elas sobressai o escrito de Alda Maria Branco Lucas, pede “mais respeito pelos outros, menos julgamentos e mais atitudes boas”, sublinhando que Kikas “tem mais valor do que as mulheres que não mexem uma palha e só vivem à custa dos maridos ou, pior, dos amantes”, considerando a empresária uma “guerreira”.

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