Mulher que esfaqueou os pais no Porto Alto “não mostrou arrependimento” e MP pede justiça
Tânia Ferrinho, que matou o pai com 17 facadas e agrediu a mãe com sete, não se mostrou arrependida e, para o Ministério Público, não pode ser considerada inimputável. Defesa alega que a arguida estava em surto psicótico e incapaz de controlar os seus impulsos durante o ataque.
O Ministério Público e a defesa de uma mulher que atacou os pais à facada em 2022 pediram, nas alegações finais, justiça para Tânia Ferrinho, a arguida acusada de dois crimes de homicídio, um qualificado e outro na forma tentada. O colectivo de juízes do Tribunal Judicial de Santarém ouviu na quarta-feira, 4 de Outubro, as alegações finais no âmbito do julgamento iniciado em 13 de Setembro e em que a procuradora do Ministério Público, Ana Gomes, considerou provados os crimes de que a arguida está acusada.
Tânia Ferrinho, a mulher transgénero de 42 anos, recorde-se, atacou os pais, Carlos e Maria Cristina Ferrinho, com uma arma branca, no apartamento onde moravam, no Porto Alto, concelho de Benavente. As vítimas faleceram dois e três meses após o crime ocorrido a 10 de Outubro de 2022, no primeiro caso devido aos ferimentos causados pelas 17 facadas que levou e no segundo devido a doença.
Nas alegações finais, a procuradora considerou que as provas documentais e periciais não deixam dúvidas sobre a autoria do crime “impressivo” e “chocante” em que, segundo a acusação, a arguida desferiu 17 facadas no pai e sete na mãe, que se encontrava acamada. Ana Gomes, aludindo a perícias realizadas, considerou que Tânia Ferrinho “não tem nenhuma psicose primária” e que alegados “surtos psicóticos que possa ter tido resultam do consumo de drogas sintéticas”, não podendo por isso ser considerada inimputável. Além disso, acrescentou, “não mostrou qualquer arrependimento”, pedindo assim que seja condenada a uma pena de acordo com a gravidade do crime e que assim se faça justiça.
A procuradora reconheceu, no entanto, existir “sensibilidade para perceber o conflito interior de alguém que desde jovem não se identifica com o género com que nasceu” e a pressão que o processo de transição de género poderá ter causado na arguida, mas recusou a argumentação de que o crime foi cometido no âmbito de um surto psicótico.
Defesa diz que arguida estava em surto quando esfaqueou os pais
"Justiça" foi também o que pediu ao colectivo a advogada Maria João Alves, nomeada defensora de Tânia Ferrinho aquando da sua prisão e que lembrou ter dado com ela nos calabouços do tribunal “virada para a parede, em posição fetal, quase incapaz de comunicar”.
Tal como o Ministério Público, a defensora disse não ter dúvidas “nenhumas de que a prova está feita”, mas, ao contrário da procuradora, considerou que o crime ocorreu na sequência de “mais de uma década de processos complexos”, de perda de um irmão, mudança de género, isolamento social e violência doméstica, que provocaram a Tânia “surtos psicóticos e às vezes interrupções de consciência”, estado em que alegou que a arguida estaria quando esfaqueou os pais.
“Tenho as maiores dúvidas de que a Tânia tivesse cometido este acto conscientemente e a certeza de que nunca foi ajudada”, afirmou, admitindo que a arguida “praticou algo que ninguém pode compreender”, incluído a própria, que manifesta “incredibilidade” pelos seus actos.
Alegando ainda que Tânia Ferrinho estaria “incapaz de controlar os seus impulsos” no momento do crime, a advogada pediu ao Tribunal “justiça” e que a pena a aplicar tenha em conta as circunstâncias particulares da arguida.