Sociedade | 10-10-2023 12:00

Hospital de Vila Franca de Xira ameaça processar utente por se ter queixado do serviço

Hospital de Vila Franca de Xira ameaça processar utente por se ter queixado do serviço
Paula Salema diz que a resposta do hospital foi tirânica e arrogante

Administração do Hospital de VFX considera difamatória a queixa de uma utente. Resposta do hospital está a gerar indignação entre autarcas locais com câmara a exigir uma audição imediata à administração por causa do assunto.

Quando Paula Salema apresentou uma queixa escrita à administração do Hospital de Vila Franca de Xira pelo mau funcionamento da unidade, com conhecimento para a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, estava longe de imaginar que iria ser ameaçada criminalmente pela administração liderada por Carlos Andrade Costa.
“Limitei-me a descrever o que vi naquele serviço e dos desabafos que os profissionais me transmitiram”, revela Paula Salema a O MIRANTE. A administração não gostou, considera, não desvalorizando o desagrado da utente, que a missiva continha “conteúdo difamatório agravado” e que por isso o hospital se viu obrigado “a participar criminalmente junto dos serviços do Ministério Público” a queixa, atendendo ao que diz serem “ilícitos criminais”.
Paula Salema acompanhou a mãe de 74 anos às urgências no dia 30 de Agosto, pelas 15h00, devido a um traumatismo craniano encefálico sem perda de consciência e dor lombar decorrente de uma queda. Foi-lhe dada uma pulseira verde, a menos urgente, e só saiu das urgências já passava das 22h00. O que aconteceu nesse intervalo está presente na queixa que, logo no dia a seguir, a arqueóloga de profissão remeteu à administração.
“Passo a descrever aquilo que se vive: Falta de médicos ortopedistas, de Medicina Interna, falta de auxiliares, falta de enfermeiros e falta de técnicos que emitam relatórios atempadamente”, escreveu a queixosa, acrescentando que muitos utentes estiveram várias horas sem qualquer médico dentro das salas a atender na urgência.
“Isto porque caso os dois ortopedistas que se encontram a trabalhar pro bono na Urgência tiverem de se deslocar a uma urgência no Internamento, o serviço de Ortopedia de urgência fica simplesmente sem médicos ortopedistas. Se chegar uma emergência que requeira intervenção de ortopedia como pensam os senhores solucionar o problema? Morre o doente lá de cima ou morre o de cá de baixo?”, questionou.
Paula Salema diz que um dos ortopedistas estava a trabalhar com 38 graus de febre há várias horas para permitir que o serviço não encerrasse. Além do que lhe pareceu serem falhas nas cadeias de comando, Paula Salema relatou pessoal administrativo à deriva, enfermeiros insuficientes para garantir o bom funcionamento do serviço e situações de burnout (cansaço extremo). “Ontem vi pessoas a arrancar os próprios acessos venosos porque não encontravam enfermeiros para o fazerem. Os senhores têm a noção de que o aparelho de TAC que serve a Urgência ainda funciona pior do que o anterior que lá estava? Que os médicos da Urgência têm uma severa dificuldade em ter um relatório de TAC a tempo e horas?”, questionou.
Além de com o email a utente querer relatar aquilo que viveu e presenciou no serviço de urgência do hospital, teve também a intenção de apelar a quem tenha poder de decisão para que ou resolva “de forma emergente a carência de profissionais daquele hospital ou então encerre permanentemente a Urgência pois é preferível que não funcione do que estar completamente ao abandono como está. Um idoso pode fugir do serviço que não será detectado. Eu mesma entrei e saí com mais quatro acompanhantes sem sermos barrados ou questionados. Pode entrar ali um bandido armado e matar todos aqueles que conseguir que não há ninguém que consiga impedir porque não há gente em número suficiente”, escreveu.
A O MIRANTE, Paula Salema considera a resposta dada pelo hospital gerido por Carlos Andrade Costa como sendo “arrogante e tirânica” e pouco aceitável num estado de direito e de liberdade de expressão. “Relatei o que vi. Na altura nem soube se me devia sentar a chorar com os profissionais, porque só me apetecia abraçá-los, o que vi foi que não podem dar mais”, lamenta.
O MIRANTE questionou a administração do hospital sobre este assunto, perguntando se a partir deste momento qualquer queixa de utentes será considerada difamatória e alvo de actuação criminal. Também perguntámos quantas queixas de utentes a administração actual já enviou para o Ministério Público mas a gestão de Carlos Andrade Costa preferiu ficar em silêncio.

Autarcas exigem audição ao gestor

A resposta da administração de Carlos Andrade Costa à utente não caiu bem no poder autárquico, O MIRANTE sabe que o vereador David Pato Ferreira da Coligação Nova Geração (PSD/PPM/MPT) vai apresentar em reunião de câmara, já depois da data de fecho desta edição, uma proposta para que a autarquia exija uma audição imediata à administração para esclarecer o caso. Depois de, também ele, se mostrar chocado com a situação. “O que vemos é uma administração pública não disponível para ser criticada, confrontada ou escrutinada pelos utentes e isso não nos agrada”, avisa o autarca. O MIRANTE irá voltar ao assunto na sua próxima edição.

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