Fazer a diferença sem pedir nada em troca
Markus Schreiber é fisioterapeuta voluntário no Clube Trampolins de Salvaterra. Dionísia Flores tem 79 anos e é voluntária há 45 no União Futebol Entroncamento. Dois testemunhos de generosidade e altruísmo a propósito do Dia Internacional do Voluntário, que se assinala a 5 de Dezembro.
Markus Schreiber é um fisioterapeuta conhecido no estrangeiro com mais de três décadas de experiência a ajudar atletas de alta competição. Actualmente faz voluntariado no Clube Trampolins de Salvaterra (CTS), em Salvaterra de Magos, vila pela qual se apaixonou ao ponto de deixar a Alemanha, país de onde é natural. Movido pela vontade de ajudar, o fisioterapeuta de 57 anos acompanha, sem pedir nada em troca, os atletas do CTS, trabalhando em equipa com o filho da sua companheira, Afonso, de 21 anos, que desempenha as funções de massagista. Auxilia ainda o Grupo Desportivo Forense, no mesmo concelho.
“Um minuto que passa é mais um dia de recuperação. É igual que seja fim-de-semana ou feriado, se a pessoa precisa de mim hoje às 23h00, não é amanhã às 11h00 que me encontro com ela”, explica o fisioterapeuta, acrescentando que não há nada mais gratificante do que ajudar os que não têm possibilidades de pagar os tratamentos. “Faço de coração (…), a fisioterapia não deve ser de acesso privilegiado”, afirma Markus Schreiber voltado para Anabela Rodrigues, a sua esposa natural de Alverca do Ribatejo, a quem coube traduzir estas palavras para português.
Carlos Matias, o salvaterrense e seleccionador nacional de trampolins, interrompe a conversa para dizer que há 20 anos que o Clube de Trampolins de Salvaterra não estava habituado a alguém tão generoso a prestar um serviço tão essencial para os ginastas. Um deles é Lucas Santos, atleta do CTS que tem conquistado títulos de destaque em campeonatos da Europa e do Mundo com as cores da selecção nacional e a quem Markus Schreiber faz o tratamento enquanto dura esta conversa a propósito do Dia Internacional do Voluntário, assinalado a 5 de Dezembro.
Mas não é só dentro de clubes da terra que o fisioterapeuta se dedica a fazer o bem. Na rua sensibiliza quem passa para ter cuidado com a sua postura e tem ajudado idosos residentes na vila, onde vai abrir a sua clínica de fisioterapia assim que estiver concluída a morosa fase burocrática. Preocupado com a sua adaptação, tem frequentado aulas de Português para estrangeiros promovidas pela Câmara de Salvaterra de Magos, mas diz que “é mais fácil fazer um duplo salto mortal do que aprender a falar português”, apesar de já saber o básico da língua.
Markus Schreiber vem de uma família de fisioterapeutas e tem uma clínica em Herne, na Alemanha, com o irmão. Há 30 anos representou a selecção alemã de equitação de salto e um acidente a cavalo - como mostra a grande cicatriz no seu rosto - fê-lo perceber que ser fisioterapeuta seria mais seguro. O grande salto da sua carreira foi com o FC Schalke em 1997, ano em que o clube alemão venceu a Taça UEFA. Quatros anos mais tarde passou para o Borussia Dortmund e em 2003 acompanhava Jan Ullrich na Volta à França em bicicleta. Em 2006 e 2007 viveu na Flórida com o pugilista Axel Schulz e acompanhou o vocalista dos Kiss, Paul Stanley, na digressão da banda. A lista contempla ainda o actor Ralf Moeller, do filme Gladiador, o piloto de Fórmula 1 Sebastian Vettel e uma série de nomes que o fisioterapeuta prefere não revelar por ainda estarem no activo.
Metade da vida como voluntária no União Futebol Entroncamento
Dionísia Flores, ou Dona Niza, como é carinhosamente tratada por todos, iniciou a sua ligação ao União Futebol Entroncamento (UFE) após o marido ter ingressado como massagista no clube. Uma ligação que foi crescendo ao ponto de se oferecer para voluntariamente tomar conta do bar do clube. Já lá vão 45 anos e aos 79 anos afirma que enquanto lhe for possível vai continuar a entregar-se ao clube que é parte da sua vida.
Recuando no tempo, Dionísia Flores conta que o clube atravessava dificuldades financeiras e viu-se obrigado a abdicar dos funcionários do bar para cortar nas despesas. Assumiu, por isso, como voluntária essas funções: faz pão, folhados, bolos, enche as arcas e serve os clientes assumindo todo o trabalho praticamente sozinha. Ao fim-de-semana, o dia começa pelas 07h30 e pode alongar-se até ao fim da tarde; durante a semana o bar apenas está aberto das 18h00 às 22h00.
Dionísia Flores admite haver dias mais cansativos porque o trabalho é muito, mas apesar de a deixar com pior humor não afecta a sua predisposição para ajudar o UFE. É por isso que mesmo não estando o bar aberto passa a maior parte dos dias nas instalações do clube, que prefere à solidão da sua casa desde que o marido, Jorge Flores, faleceu. Sentada numa cadeira com um aquecedor ao redor, uma manta sobre as pernas e a jogar cartas no computador portátil é assim que passa o tempo até ser hora de abrir o bar.
Dionísia Flores confessa que a maior motivação para continuar o trabalho voluntário é sentir-se perto do marido, no clube que ama e junto de pessoas que a tratam com muito carinho. Durante seis anos, além do trabalho de bar, teve funções como técnica de equipamentos assumindo a responsabilidade pelos equipamentos da equipa sénior de hóquei. “Enquanto puder vou aqui estar. Vim pelo meu marido, caminhei ao seu lado e ganhei um grande amor pelo clube. É isso que ainda me mantém aqui, além do amor e carinho que todos demonstram por mim e foram demonstrando ao longo destes 45 anos. Enquanto tiver forças nunca os vou abandonar”, diz emocionada.
Mulheres estão em maioria no voluntariado
De acordo com os dados mais recentes o número de voluntários inscritos nas plataformas de voluntariado geridas pela Cooperativa António Sérgio para a Economia Social (CASES) registou um crescimento de mais de 26,6% ao longo de 2021 fixando-se em cerca de 8.500 pessoas inscritas. 27% dos registos são de pessoas entre os 15 e os 24 anos seguindo-se a faixa etária dos 25 aos 34 (25%). 71% dos voluntários são mulheres e Lisboa e Vale do Tejo é a região que detém maior número de voluntários (46,7%). 38% dos inscritos são trabalhadores e 24% estudantes; 43% disponibiliza-se para fazer voluntariado quatro ou mais horas por semana e as actividades mais procuradas são acção social, cívica e cooperação para o desenvolvimento.