Sociedade | 24-12-2023 15:00

A luta do comércio local da região para manter as portas abertas

A luta do comércio local da região para manter as portas abertas
Maria José Lopes recorda o tempo em que passava os dias a vender e a embrulhar presentes

A época natalícia é naturalmente uma altura onde o consumo aumenta, mas essa realidade não é igual em todos os sectores de actividade e depende muito da dinâmica do comércio das localidades. O MIRANTE falou com seis comerciantes de Tomar, Azambuja, Cartaxo e Entroncamento para saber como lhes tem corrido o negócio durante este mês de Dezembro.

Maria Armanda Gonçalves diz que a época natalícia já não se reflecte como dantes na facturação

Meio século de portas abertas em Tomar

Maria Armanda Gonçalves é proprietária da loja Armanda de Brito Decorações e, tal como a filha, Maria João Gonçalves, expressa a preocupação em relação ao declínio do comércio local na cidade nabantina. Com quase meio século de existência em Tomar, a loja de peças de loiça e decoração enfrenta grandes desafios e nem a época natalícia está a ajudar a ultrapassar. “Este ano tem sido tão mau e o Natal não está a ter impacto nas vendas. Vem muita gente ver as montras e nota-se que gostam do que vêem, mas depois não compram”, lamenta Maria Armanda. A comerciante destaca a mudança no comportamento do consumidor e a diminuição do turismo como alguns dos factores para a crise no comércio local. “O sector do comércio está péssimo, vendemos muito pouco”, frisa, acrescentando que o negócio tem decaído ano após ano. “Antigamente a época natalícia tinha muito movimento. Tínhamos noites que nem nos deitávamos para fazer embrulhos, este ano não há embrulhos para ninguém”, afirma em jeito de lamento.
Maria Armanda recorda que na altura do confinamento motivado pela pandemia o negócio esteve muito tempo fechado, o que acabou por ter uma influência muito negativa na relação com os clientes.

Carlos Henriques queixa-se da falta de estacionamento

Ourivesaria em Azambuja para as compras de última hora

Carlos Henriques, natural de Ourém, abriu a Ourivesaria Confiança há 43 anos na principal artéria de Azambuja, a Rua Engenheiro Moniz da Maia, e afirma que o negócio nunca esteve tão mau. Vai conseguindo manter uma empregada porque a renda do espaço se vai mantendo acessível. O proprietário culpa os elevados impostos que se paga ao Estado, mas também o estacionamento que diz ser “um cancro que Azambuja tem” e a mudança de hábitos das pessoas, que preferem os centros comerciais ou comprar online no conforto de casa. “O comboio, que devia ser uma porta de entrada, é uma porta de saída”, desabafa a O MIRANTE.
Na década de 90 criou na ourivesaria um sector de óptica que tem os dias contados. É relojoeiro desde os 18 anos, profissão que já quase ninguém aprende, refere, e repara qualquer relógio mecânico ou de quartzo. “Trabalho para um pequeno nicho que gosta de conservar as coisas antigas. A maioria usa e deita fora”, revela. No dia em que O MIRANTE visitou a ourivesaria, a cerca de duas semanas do Natal, apareceram poucos clientes. Carlos Henriques recebeu-nos, ainda assim, com boa disposição. Espera que mais perto da data apareçam clientes para as compras de última hora. A Ourivesaria Confiança é um dos 76 estabelecimentos do concelho de Azambuja que aderiram à iniciativa “Natal no comércio local”, que decorre até 6 de Janeiro de 2024.

Maria José Lopes recorda o tempo em que passava os dias a vender e a embrulhar presentes

Uma loja de decoração na rua mais conhecida do Cartaxo

Maria José Lopes, de 83 anos, está há mais de meio século ao balcão da loja de decoração Século XVII, na rua mais conhecida do Cartaxo, a Rua Batalhoz. É a única loja de decoração que sobreviveu e tem peças únicas de estilo clássico – móveis, candeeiros, molduras, bibelôs, entre muitas outras coisas. A proprietária lamenta ver todos os dias lojas a fechar no Cartaxo. Durante quase toda a sua vida conseguiu viver da loja, mas hoje seria impossível se não fosse a reforma, afirma. Admite que não fecha a porta por amor à terra e para não estar fechada em casa. Curiosa, espreita várias vezes para a rua, mas não vê ninguém, nem à janela. “De há cinco anos para cá está muito mau. Quem tem dinheiro vai para as grandes superfícies em Lisboa, quem não tem vai para as lojas chinesas. Antigamente, as pessoas ainda olhavam para as montras, agora não olham com medo de se comprometerem”, sublinha.
Maria José Lopes conta que os anos de ouro do negócio foram os finais da década de 90 e os primeiros anos do novo milénio. Por esta altura tinha a loja cheia e passava o dia ocupada a fazer embrulhos, recorda com nostalgia. Em Novembro os clientes apareciam a pedir para guardar artigos para o Natal. Este ano vendeu alguns no mesmo mês, mas pouco para o que era comum. “Apareciam muitas senhoras para comprar prendas para as netas. Hoje as netas dizem ‘avó, dás-me o dinheiro que eu mando vir”. Maria José teme pelo futuro dos netos e bisnetos. A filha é jornalista e o filho advogado. Não tem a quem passar o negócio e enquanto a saúde o permitir garante que não vai fechar portas. Elogia o esforço do actual executivo em levar animação às ruas mas confessa que não adianta quando não há pessoas.

Manuel Oliveira está satisfeito com as vendas de cabazes que prepara especialmente para esta época

Os produtos da terra da Mercearia Ti Anica

A decoração natalícia da montra da Mercearia Ti Anica, na Rua Alexandre Herculano, não passa despercebida a quem passa no centro histórico de Tomar. O casal Manuel Oliveira e Maria José Fradique abriram as portas há 11 anos. A loja tem como objectivo promover produtos artesanais locais, regionais e nacionais que, na opinião do proprietário, são “cada vez menos”. O estabelecimento vende vinhos de Tomar, produtos artesanais feitos em diversos materiais, loiças, peças decorativas, lembranças, cestas de junco, frutos secos, conservas, compotas, queijos, peças relacionadas com os templários, entre outros.
O casal vai modificando o tipo de produtos que tem na loja consoante a época do ano. No mês de Dezembro reflectem o espírito natalício apostando principalmente em cabazes personalizados, que acabam por ser o que os clientes mais procuram. Em geral, o cabaz inclui uma garrafa vinho, queijo, frutos secos ou conservas, mas tudo depende das preferências do cliente. “Estamos a vender bem. A expectativa é boa porque tento ter produtos apelativos e que tenham preços acessíveis e que possam satisfazer o consumidor”, refere Manuel Oliveira. A época natalícia e a decoração da montra são apontadas como factores que têm um efeito positivo no negócio, atraindo as pessoas. “Quero transmitir às pessoas que nos visitam o que temos em Portugal e que somos o melhor país do mundo”, afirma, com um sorriso. Quando questionado sobre a evolução do comércio em Tomar na última década, Manuel Oliveira destaca a abertura de negócios inovadores, que trazem dinamismo e vitalidade ao centro histórico, e realça as iniciativas do município que proporcionam movimento no centro da cidade e ajudam o comércio local.

Para Susana Ribeiro Dezembro é um mês igual aos outros

A importância da decoração na época natalícia

Susana Ribeiro é proprietária do café Suzi, no Entroncamento, desde 2006 e confessa que ter uma boa decoração de Natal no seu estabelecimento é uma das coisas que mais orgulho lhe dá, para além de ajudar a aumentar as vendas. Actualmente trabalha com um sócio e com o filho Ricardo Ribeiro. O negócio, confessa, tem tido altos e baixos ao longo de 17 anos, atravessando algumas crises, mas tem-se mantido estável. “Em termos de vendas acaba por ser um mês igual aos outros. Vendo practicamente o mesmo. Mas o que mais gosto é de ver o espaço decorado e as pessoas a conviverem sempre com um sorriso no rosto e um brilho no olhar”, revela a O MIRANTE. No café de Susana Ribeiro vende-se bolo-rei por encomenda. A proprietária define o espaço como familiar. “Somos uma família. Estou aqui há 17 anos e por isso há muitos clientes habituais. Havia jovens que em pequenos vinham cá com os familiares e hoje em dia, já no ensino superior, ainda vêm cá, já por vontade própria”, diz com orgulho.
O casal Rita Pereira e Paulo Lopes mudaram-se de Lisboa para o Entroncamento há três anos e abriram a pastelaria Paraíso dos Sabores. A proprietária afirma que existe um aumento no volume de facturação no mês de Dezembro com a venda dos bolos tradicionais. Rita Pereira assume a frente do café e o contacto com os clientes, enquanto o marido é responsável pelo fabrico dos produtos. Através da venda no estabelecimento ou por encomendas, estão há disposição dos clientes bolo-rei tradicional, azevias, sonhos, rabanadas e tronco de natal. Rita Pereira descreve o espaço como um local onde os clientes são sempre bem tratados e onde reina a animação, boa disposição e simpatia. A pastelaria continua em funcionamento nos dias 24 e 25 de Dezembro e Rita Pereira tem a tradição, alguns dias antes, de se vestir de Mãe de Natal para ir trabalhar. “Ajuda-nos a todos a entrar no espírito e mantém a animação que queremos que existe na nossa casa”, afirma.

Na pastelaria de Rita Pereira os bolos tradicionais têm mais saída nesta altura do ano

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