Enfermeiros contam como vivem caos nas urgências no Hospital de Santarém
Enfermeiros do Hospital Distrital de Santarém contam a O MIRANTE, na primeira pessoa, os desafios que têm de superar diariamente, atingindo limites físicos e psicológicos, para cuidar do maior número de doentes.
Os enfermeiros do Serviço de Urgência do Hospital Distrital de Santarém (HDS) e os enfermeiros dos restantes serviços, alocados para colmatar a falta de profissionais de saúde, ameaçam bater com a porta se a situação não melhorar. A cada dia que passa aumenta o cansaço, assim como o risco de erro e de burnout, algo que já fez muitos dos profissionais recorrer a ajuda psicológica. O testemunho partilhado com O MIRANTE é de dois enfermeiros da unidade que participaram num protesto realizado na terça-feira, 9 de Janeiro, em frente ao HDS.
Joana Nunes, enfermeira de cuidados gerais há oito anos, lamenta a falta de condições laborais e a falta de planeamento da administração, sendo esta uma altura em que se prevê que haja grande afluência às urgências. “Não sei que administração temos. O Governo está demissionário e parece que a nossa administração também”, referiu, revelando que apenas o enfermeiro-director se mostrou disponível para ouvir os enfermeiros. A jovem enfermeira conta que já se sente “tarefeira”. “Há doentes colados uns aos outros, alguns com bactérias multirresistentes”, alerta. Para Joana Nunes devia ter havido um plano estratégico pensado atempadamente. “Soluções penso rápido não vão resolver nada”, argumenta. A profissional conclui dizendo que alguns doentes necessitam de avaliação médica e não a têm porque não há médicos, sobretudo de Medicina Interna. “Estão a ir embora”, vinca. Joana Nunes gostaria de ver mais macas, camas medicação e condições climatéricas nas urgências onde, recorde-se, estavam 119 doentes internados um dia antes da acção de protesto.
João Caruço, enfermeiro nas urgências há 17 anos, fala de um problema transversal a todo o Serviço Nacional de Saúde (SNS). “Os cuidados de saúde primários não têm recursos humanos suficientes, nomeadamente médicos de família e enfermeiros. Não tendo capacidade de resposta encaminham os doentes para a urgência”, descreve, explicando que na triagem são dadas pulseiras azuis e verdes cujo tempo de espera pode chegar às 20 horas. O profissional encara a situação como um problema cíclico que se tiver melhoras será a “médio-longo prazo”. Tal como Joana Nunes, João Caruço defende que a situação era previsível e lamenta que cada vez mais colegas estejam a pedir apoio psicológico. “Estou em crer que brevemente vão pedir baixa”, termina. Perante a elevada afluência de doentes, o HDS criou uma unidade provisória de internamento, suspendeu a actividade cirúrgica programada (à excepção da urgente e oncológica) e reforçou as equipas de enfermagem. Os horários dos Centros de Saúde da Unidade Local de Saúde da Lezíria (Cartaxo, Rio Maior e Santarém) foram alargados.
Helena Jorge, dirigente sindical e enfermeira no Hospital de Santarém há três décadas, considera as medidas tomadas pela administração do HDS insuficientes, até porque, como referiu a O MIRANTE, “quando os novos enfermeiros estiverem integrados já passou o pico da gripe”. “Para mim os doentes são tudo e a vida deles é tudo, e quando não conseguimos tratá-los com dignidade e dar-lhes privacidade é muito mau. Isto ultrapassou o limite do razoável”, desabafa.