A única mercearia de Arrifana fechou portas e população está revoltada
Fechou portas a Mercearia da Aldeia, que funcionava num espaço da junta de freguesia e era a única na aldeia de Arrifana, concelho de Azambuja.
Gerente diz que a junta não cumpriu com o prometido e que não lhe restou outra opção senão encerrar. Presidente da União de Freguesias de Manique do Intendente, Vila Nova de São Pedro e Maçussa refere que espaço não tinha licença nem condições para que o contrato fosse nos moldes que a gerente pretendia.
A Mercearia da Aldeia era um espaço de convívio, sobretudo para pessoas idosas, em Arrifana, e o único onde os residentes se podiam deslocar para comprar diariamente bens essenciais. Ao fim de ano e meio fechou portas devido a um diferendo entre a gerente do espaço e a Junta de Freguesia de Manique do Intendente, Vila Nova de São Pedro e Maçussa, proprietária do espaço afecto ao mercado da aldeia.
O estabelecimento abriu pelas mãos de Isabel Calvário, em acordo com a junta de freguesia, para dar resposta àquela população, maioritariamente envelhecida, depois de o único espaço do género ter encerrado. “Tenho 76 anos e não me posso deslocar para outro lado. Era aqui que fazia as minhas compras. Tenho imensa pena porque ela foi sempre uma pessoa muito boa para nós”, lamentou a O MIRANTE Maria José Branco, no último dia em que se pôde sentar nas cadeiras da esplanada onde, por rotina, convivia com outros habitantes da aldeia antes de regressar a casa com o que lhe fazia falta na despensa.
Inconformados com o encerramento inesperado, os clientes habituais, como era o caso de Guilhermina Cavilha, fizeram questão de passar o dia na mercearia, que ia ficando despida à medida que eram desmontadas as prateleiras vazias. “Tenho muita pena da maneira como aconteceu. É uma maldade que estão a fazer à nossa aldeia. Era um bocadinho de convívio que tínhamos aqui”, lamentou a moradora. Um sentimento partilhado pelos restantes que se emocionaram com o último bater das portas da mercearia que era uma espécie de centro de dia improvisado, um espaço onde se sentiam seguros e acolhidos. “Quando um não aparecia a Isabel ia lá a casa saber o que se tinha passado”, sublinhou Jorge Ferreira, que descreveu aquele estabelecimento como um “lugar de afectos”.
Igualmente inconformada e emocionada estava Isabel Calvário, a gerente a quem coube a decisão de encerrar a mercearia depois de, afirmou, ter travado uma “batalha” de ano e meio sem ter conseguido chegar a acordo com a junta de freguesia que “prometeu e não cumpriu” fazer um contrato para que o espaço pudesse estar legal. “Chegámos à conclusão que teríamos de fechar portas. Não é justo pagar as mensalidades e não poder declarar na minha contabilidade em como estou a fazer estes pagamentos porque [a junta] não tem nenhum contrato comigo”, referiu.
Gerente não aceitou contrato proposto pela junta
O diferendo entre a gerente e a autarquia, recorde-se, começou depois de o presidente da junta, Avelino Correia, se ter deslocado à mercearia para exigir o pagamento da electricidade consumida, o que não acontecia nos primeiros meses de funcionamento. A juntar a isso, a junta enviou, em Junho do ano passado, uma carta a Isabel Calvário a informar que teria de sair, alegando que o espaço estava a ser utilizado para outros fins que não os inicialmente previstos, nomeadamente para a venda de cafés e bebidas alcoólicas ao balcão.
A gerente contrapõe a informação afirmando que o projecto instalado foi o que o presidente da junta aceitou e que só passados seis meses, por motivos que diz serem-lhe alheios, começou a levantar problemas sobre a venda de cafés e bebidas. Em Novembro passado a junta propôs a Isabel Calvário um contrato no qual estava explícito que a casa apenas poderia funcionar como mercearia, condição não aceite pela gerente. “Mas por que é que hei-de aceitar a forma como o presidente sugeriu se me deixou abrir a casa com este formato. As pessoas não vinham. As pessoas precisam da mercearia mas precisam do convívio”, defendeu a O MIRANTE no dia do fecho de portas, a 31 de Janeiro.
Contactado por O MIRANTE, o presidente de junta disse que da parte da autarquia “houve sempre bom senso” e vontade para que aquele espaço pudesse continuar a funcionar como mercearia. Avelino Correia referiu que os dois espaços que eram utilizados estão registados como tratando-se de arrecadações e que não tinham condições legais para poder funcionar como café. “[A gerente] apresentou os CAE’s [para cafetaria e mercearia] porque para isso basta ir às Finanças e pedir, mas depois o estabelecimento tem que estar licenciado para tal”, sustentou, adiantando que a junta vai tentar licenciar aquele espaço como sendo comercial e posteriormente realizar uma hasta pública para o concessionar. Além disso, informou, “está para abrir” uma mercearia numa antiga padaria da aldeia, sendo que há dias da semana em que os moradores têm acesso a produtos de mercearia, talho e peixaria, que chegam em carrinhas que por ali passam.
O autarca da CDU disse ainda que Isabel Calvário não tem cumprido com o pagamento da electricidade, devendo actualmente cerca de 850 euros à junta de freguesia. Situação confirmada pela própria que, por sua vez, alegou que as últimas facturas que recebeu estavam rasuradas e que foi por isso que não as liquidou e enviou, para análise, para os serviços jurídicos do município de Azambuja.