A ambição do homem por sexo, dinheiro e poder tem sido sempre igual ao longo da História
José Carlos Antas é de Vila Franca de Xira, vive no Vale de Santarém e é perito forense no laboratório científico da Polícia Judiciária.
Apaixonado por História, é investigador nos tempos livres e confessa-se uma pessoa envolvida na cidadania activa. À margem da apresentação dos seus livros em Vila Franca de Xira, sentou-se com O MIRANTE a falar da sua cidade, do que o inquieta na vida, da inteligência artificial e da defesa do regresso do serviço militar obrigatório.
É preso entre um presente efémero e um futuro incógnito que José Carlos Antas procura a sua libertação recorrendo ao estudo da História, por acreditar que saber de onde viemos e como chegámos aqui nos pode ajudar a planear e traçar melhor o futuro. É um fio condutor que também acompanha o perito forense da Polícia Judiciária no seu dia-a-dia e para quem a História diz muito de como o homem se comporta. “O ser humano evoluiu muito depressa desde as cavernas e do uso do fogo até às mega-cidades de hoje, ao passo que os nossos genes não nos acompanharam tão rapidamente nesse processo. Ainda temos muito de reptiliano nas nossas defesas. Ainda somos tribais, possessivos, territoriais e animalescos. As ambições do homem por sexo, dinheiro e poder são as mesmas, embora de formas diferentes”, defende.
As suas raízes estão no Bairro da Mata, em Vila Franca de Xira, onde cresceu e passou toda a sua juventude, até se mudar aos 19 anos para a base militar da Força Aérea Portuguesa na Ota, em Alenquer, para frequentar um curso de técnico de manutenção de material aéreo. Casou-se em Santarém e mudou-se para o Vale de Santarém. Um curso de Gestão de Recursos Humanos no ISLA de Santarém acabou por ser o seu primeiro passo para um percurso nas áreas que o apaixonam: História, Defesa e Relações Internacionais. Ainda passou pelo Estado Maior da Força Aérea (EMFA), em Alfragide, antes de entrar na Judiciária. É investigador no Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão e também esteve envolvido com o Centro de Investigação, Desenvolvimento e Inovação da Academia Militar (CINAMIL) e o Centro de Estudos Eurodefense Portugal.
Diz que o fim do serviço militar obrigatório contribuiu para uma quebra nos valores dos jovens. “Havia um sentimento de pertença. Ali somos todos iguais, ricos e pobres, todos temos o mesmo uniforme. Era importante para os jovens saírem do seu núcleo familiar e da parte social onde estão inseridos e ganharem uma outra visão das coisas. Para uma grande parte não fazia mal nenhum ir à tropa”, conta.
O MIRANTE conversou com José Carlos Antas a propósito do seu regresso a Vila Franca de Xira para apresentar os seus três livros: “Ant(as)logia e reflexões”, “Recortava calendários” e “A história recontada de Preste João”, cuja sessão, no auditório da Junta de Freguesia de Vila Franca de Xira, decorreu na tarde de sábado, 17 de Fevereiro. “A História é sempre importante e não deve ser relegada para segundo plano nem esquecida. Tem de estar sempre presente. Aprendemos com os nossos erros e ajuda-nos a decidir melhor para o futuro”, defende.
Quando o homem quer ser Deus
José Carlos Antas diz-se apaixonado pela História do século XX, marcada por um salto sem igual no desenvolvimento da humanidade. “Com a Internet assistimos a um choque evolutivo que nos obriga a grandes adaptações. Resta saber qual o preço que vamos pagar por tudo isso. Manipulamos a genética, procuramos a imortalidade, estamos a prolongar ao máximo a vida, e é extremamente perigoso quando o homem tenta fazer o papel de Deus”, nota. Tem três filhos e quando lhe perguntamos como vê o futuro deles responde-nos com quatro palavras: volátil, incerto, complexo e ambíguo. “Vão apanhar muitas mudanças tecnológicas”, avisa.
Para o perito forense escrever em papel - e ler jornais em papel - ainda faz sentido, mas lamenta que hoje as crianças escrevam pouco à mão. “O quociente de inteligência (QI) esteve sempre a subir nos últimos anos, passou por uma fase de estagnação e agora está em declínio. É assustador pensar se, com a inteligência artificial, estaremos a ficar mais preguiçosos. Será que no futuro seremos burros a tomar conta de computadores inteligentes? Ou serão eles a tomar conta de nós? A inteligência artificial levanta-nos grandes desafios e vai obrigar-nos a reinventar novas formas de vida”, refere.
Com os seus livros o perito forense espera alcançar novos leitores e, no caso da história de Preste João, ajudar a dar a conhecer melhor a lenda. “Não me canso de estudar e nesta idade tenho o privilégio de estudar só o que quero. Toda a lenda do Preste João fascina-me, é uma figura interessante, fala-se sempre do rei Artur ou da Excalibur mas nós também temos as nossas lendas que merecem ser contadas”, afirma.
Chegou a concorrer ao prémio literário Alves Redol em Vila Franca de Xira e ao concurso de teatro Bernardo Santareno em Santarém mas a obra foi ficando na gaveta até agora, quando a lançou numa edição de autor paga pelo próprio. “Precisamos sempre de um farol que nos guie. Somos dos países mais antigos da Europa com as fronteiras definidas. Tivemos altos e baixos, estamos sempre a criticar mas de vez em quando surge uma figura que nos une e nos impulsiona para a frente. Tivemos grandes estadistas, como D. Dinis ou D. João II. Sempre que há uma crise aparece alguém que nos une”, conclui, aludindo à busca que os portugueses fizeram nos descobrimentos pelo mítico Preste João.
Um centro comercial que precisa de vida
José Carlos Antas gosta de regressar a Vila Franca de Xira com frequência, cidade onde ainda tem família. Diz notar obra e evolução mas confessa que algumas coisas ainda lhe provocam tristeza, como o abandono do Vila Franca Centro. “Faz-me imensa confusão pela quantidade de coisas boas que ali se podiam fazer. É um desperdício ter aquilo fechado. Podia fazer-se ali várias coisas, a começar pelo estacionamento que faz muita falta na cidade e mais habitação”, defende. Para o perito forense a história de Vila Franca de Xira e Santarém precisa de mais atenção e de ser mais contada a toda a comunidade.
O país passar tanto tempo à espera de um novo aeroporto irrita-o. “A Ota tinha o problema da proximidade com a Serra do Montejunto. Não sou técnico, mas enquanto cidadão acredito que a solução Portela+1 é a que faz mais sentido substituindo os voos domésticos pela ferrovia. Agora o Montijo é que não. O ideal será a solução que tenha o menor custo possível”, refere.
Ler O MIRANTE em papel
José Carlos Antas é leitor de O MIRANTE em papel embora admita que, para as notícias de última hora, goste de visitar o site online. E, nesse caso, também os sites de outros órgãos de comunicação social regionais e nacionais com presença online. “Ainda faz sentido ter e ler jornais em papel bem como os livros. Há muita coisa que pode ser desmaterializada mas os jornais ainda não estão nesse ponto. Têm as notícias mais rápidas no online e o desenvolvimento no papel. Ter tudo no digital é perigoso, estamos numa fase de transição e a evolução tem sido vertiginosa. Não custa nada ter um exemplar físico”, confessa.