Sociedade | 15-05-2024 15:00

Crianças são muitas vezes arma de arremesso quando os pais se separam

Crianças são muitas vezes arma de arremesso quando os pais se separam
Debate sobre parentalidade foi promovido pelo Serviço de Psicologia e Orientação do Agrupamento de Escolas de Benavente

Situações de conflito parental são cada vez mais frequentes. Nos campos de batalha judicial, as crianças são quem mais sofre. O Serviço de Psicologia e Orientação do Agrupamento de Escolas de Benavente organizou o colóquio “Casa da mãe, casa do pai: parentalidade após a separação”.

O Serviço de Psicologia e Orientação (SPO) do Agrupamento de Escolas de Benavente promoveu o debate “Casa da mãe, casa do pai: parentalidade após a separação”, no qual o “superior interesse da criança” foi o tema que mais se ouviu, embora na prática os filhos sejam muitas vezes utilizados como “arma de arremesso”, como refere a coordenadora do serviço jurídico do Instituto de Apoio à Criança (IAC), Ana Perdigão. A iniciativa, realizada a 30 de Abril, juntou alunos, pais, professores, educadores e técnicos da área da educação e contou ainda com as intervenções de Sandra Pedrosa, assistente social na equipa de serviço local de Benavente do Centro Distrital da Segurança Social de Santarém, e Ana Azinhaga, da comissão restrita da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Benavente.
Ana Azinhaga revela que situações de conflito parental são cada vez mais sinalizadas no âmbito da CPCJ, com os progenitores a exporem os filhos a situações de conflito e de falta de apoio ou alienação parental, que os afectam a nível psicológico e o seu natural desenvolvimento. “Os pais tomam posições narcisistas e as crianças são induzidas a tomar partido por uma das partes com sentimento de culpa, angústia, perda e abandono”, afirma,. Além de todo o stress e ansiedade causados, as desavenças podem levar a perdas de sono e apetite, consequente diminuição do rendimento escolar e, no caso de adolescentes, ao aumento da probabilidade do uso de substâncias nocivas. A comissária fala em verdadeiros “campos de batalha judicial”, onde os pais se centram em zangas, feridas, bens e acusações mútuas. “Os pais não se devem esquecer de que apesar da separação continuam a ser um casal na parentalidade. A criança é um bem comum, mas não é divisível”, vinca.
Ana Azinhaga defende que a regulação do exercício das responsabilidades parentais é urgente nestes casos de conflito, no sentido de regular convívios, residência da criança e pensão de alimentos. A assistente social Sandra Pedrosa explica que os pais até podem acabar por resolver o conflito, mas deixam mazelas emocionais nos filhos que fazem com que tenham de enveredar para acompanhamentos clínicos e psicológicos, “um conjunto de intervenções que vão contra o que é suposto do ponto de vista legal, que é a intervenção mínima”, relata, revelando que vai haver um Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental (CAFAP) no concelho de Benavente.

O superior interesse da criança
A jurista Ana Perdigão argumenta que “a lei empata e a previsão normativa fica muito aquém da casuística, da mente humana”. Na sua opinião é fácil obter o estatuto da vítima, estratégia utilizada para retirar a criança das visitas ao pai ou à mãe, ao ponto da construção do abuso sexual num jogo do “vale tudo”. “A regulação do exercício das responsabilidades é o que traz os piores conflitos e que se arrastam em tribunais. Os tribunais não sabem pôr termo a estes conflitos alimentados pela mãe ou pelo pai”, refere. Ana Perdigão explica que na separação há uma cláusula obrigatória, a dos actos de particular importância na vida da criança, e tudo acontece como se passasse na constância da relação, havendo necessidade do consentimento de ambos os progenitores, como uma intervenção cirúrgica, a prática de um desporto mais radical, a decisão entre escola pública ou privada, a ida para a catequese ou a participação num anúncio publicitário. Afirma que muitas vezes as escolas e creches recusam-se a receber o pai, por exemplo, porque não é o encarregado de educação ou não tem a guarda da criança, o que “não é correcto”.

Pais e mães têm os mesmos direitos e deveres

O Direito da Família sofreu alterações com o 25 de Abril de 1974. Se nos primeiros códigos civis apenas se referenciava que os menores deviam honrar e respeitar os pais, agora, apesar de lhes deverem obediência, os pais devem atender à sua opinião nos assuntos familiares importantes de acordo com a idade e maturidade. A Constituição da República de 1976 menciona que pais e mães têm os mesmos direitos e deveres na manutenção e educação dos filhos. “Estar bem em casa do pai e estar bem em casa da mãe é o que todos queremos. É aí que está o superior interesse da criança”, disse Ana Perdigão aos alunos.

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