Crianças são muitas vezes arma de arremesso quando os pais se separam
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Situações de conflito parental são cada vez mais frequentes. Nos campos de batalha judicial, as crianças são quem mais sofre. O Serviço de Psicologia e Orientação do Agrupamento de Escolas de Benavente organizou o colóquio “Casa da mãe, casa do pai: parentalidade após a separação”.
O Serviço de Psicologia e Orientação (SPO) do Agrupamento de Escolas de Benavente promoveu o debate “Casa da mãe, casa do pai: parentalidade após a separação”, no qual o “superior interesse da criança” foi o tema que mais se ouviu, embora na prática os filhos sejam muitas vezes utilizados como “arma de arremesso”, como refere a coordenadora do serviço jurídico do Instituto de Apoio à Criança (IAC), Ana Perdigão. A iniciativa, realizada a 30 de Abril, juntou alunos, pais, professores, educadores e técnicos da área da educação e contou ainda com as intervenções de Sandra Pedrosa, assistente social na equipa de serviço local de Benavente do Centro Distrital da Segurança Social de Santarém, e Ana Azinhaga, da comissão restrita da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Benavente.
Ana Azinhaga revela que situações de conflito parental são cada vez mais sinalizadas no âmbito da CPCJ, com os progenitores a exporem os filhos a situações de conflito e de falta de apoio ou alienação parental, que os afectam a nível psicológico e o seu natural desenvolvimento. “Os pais tomam posições narcisistas e as crianças são induzidas a tomar partido por uma das partes com sentimento de culpa, angústia, perda e abandono”, afirma,. Além de todo o stress e ansiedade causados, as desavenças podem levar a perdas de sono e apetite, consequente diminuição do rendimento escolar e, no caso de adolescentes, ao aumento da probabilidade do uso de substâncias nocivas. A comissária fala em verdadeiros “campos de batalha judicial”, onde os pais se centram em zangas, feridas, bens e acusações mútuas. “Os pais não se devem esquecer de que apesar da separação continuam a ser um casal na parentalidade. A criança é um bem comum, mas não é divisível”, vinca.
Ana Azinhaga defende que a regulação do exercício das responsabilidades parentais é urgente nestes casos de conflito, no sentido de regular convívios, residência da criança e pensão de alimentos. A assistente social Sandra Pedrosa explica que os pais até podem acabar por resolver o conflito, mas deixam mazelas emocionais nos filhos que fazem com que tenham de enveredar para acompanhamentos clínicos e psicológicos, “um conjunto de intervenções que vão contra o que é suposto do ponto de vista legal, que é a intervenção mínima”, relata, revelando que vai haver um Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental (CAFAP) no concelho de Benavente.
O superior interesse da criança
A jurista Ana Perdigão argumenta que “a lei empata e a previsão normativa fica muito aquém da casuística, da mente humana”. Na sua opinião é fácil obter o estatuto da vítima, estratégia utilizada para retirar a criança das visitas ao pai ou à mãe, ao ponto da construção do abuso sexual num jogo do “vale tudo”. “A regulação do exercício das responsabilidades é o que traz os piores conflitos e que se arrastam em tribunais. Os tribunais não sabem pôr termo a estes conflitos alimentados pela mãe ou pelo pai”, refere. Ana Perdigão explica que na separação há uma cláusula obrigatória, a dos actos de particular importância na vida da criança, e tudo acontece como se passasse na constância da relação, havendo necessidade do consentimento de ambos os progenitores, como uma intervenção cirúrgica, a prática de um desporto mais radical, a decisão entre escola pública ou privada, a ida para a catequese ou a participação num anúncio publicitário. Afirma que muitas vezes as escolas e creches recusam-se a receber o pai, por exemplo, porque não é o encarregado de educação ou não tem a guarda da criança, o que “não é correcto”.
Pais e mães têm os mesmos direitos e deveres
O Direito da Família sofreu alterações com o 25 de Abril de 1974. Se nos primeiros códigos civis apenas se referenciava que os menores deviam honrar e respeitar os pais, agora, apesar de lhes deverem obediência, os pais devem atender à sua opinião nos assuntos familiares importantes de acordo com a idade e maturidade. A Constituição da República de 1976 menciona que pais e mães têm os mesmos direitos e deveres na manutenção e educação dos filhos. “Estar bem em casa do pai e estar bem em casa da mãe é o que todos queremos. É aí que está o superior interesse da criança”, disse Ana Perdigão aos alunos.