Sociedade | 20-05-2024 10:00

Concessionária do estacionamento tarifado em Santarém nunca pagou rendas à câmara

Concessionária do estacionamento tarifado em Santarém nunca pagou rendas à câmara
TEXTO COMPLETO DA EDIÇÃO SEMANAL
O parque de estacionamento subterrâneo do Jardim da Liberdade está na origem de um litígio entre a Câmara de Santarém e a Abispark em que são reclamados milhões de euros por ambas as partes

A dívida da Abispark à Câmara de Santarém já ultrapassa os três milhões de euros. A empresa nunca pagou as rendas anuais de 241 mil euros, que se acumulam desde 2011, e também aponta incumprimentos ao município. O litígio entre as partes está a ser dirimido por um tribunal arbitral e envolve milhões.

A empresa concessionária do parque de estacionamento subterrâneo no Jardim da Liberdade, em Santarém, e do estacionamento tarifado à superfície nalgumas zonas da cidade não paga a renda anual de 241 mil euros à Câmara de Santarém desde o início da concessão, em 2011. O montante acumulado em dívida ascende já aos 3,6 milhões de euros, isto sem contar com juros.
A concessão por 50 anos da exploração do parque de estacionamento subterrâneo à Abispark está envolvida num complexo litígio que está a ser dirimido por um tribunal arbitral, onde tanto a Câmara de Santarém como a empresa reclamam aquilo que entendem ser os seus direitos e apontam incumprimentos à outra parte. O vereador do Chega na Câmara de Santarém levou o assunto à última reunião do executivo para saber o ponto da situação do processo e criticar os moldes em que foi estabelecida essa concessão, durante a presidência de Moita Flores na Câmara de Santarém.
“Não percebo como 13 anos depois de a Abispark não pagar as rendas anuais continua a existir este contrato”, afirmou Pedro Frazão, sublinhando que “parece que neste caso a culpa morre solteira”. O vereador do Chega aludiu ao facto de o presidente da câmara à época da assinatura do contrato, Moita Flores, ter sido recentemente absolvido num processo de corrupção que envolvia a construção do parque de estacionamento subterrâneo e o Jardim da Liberdade; e também por ninguém assumir responsabilidades políticas em relação a essa polémica parceria público-privada, nomeadamente os actuais presidente e vice-presidente do município, Ricardo Gonçalves e João Leite, que foram vereadores de Moita Flores nesses tempos. Criticou ainda o PS pelo silêncio em torno do assunto.
A concessão do estacionamento tarifado resultou de uma parceria público-privada estabelecida entre a empresa ABB - Alexandre Barbosa Borges S.A. (a cujo grupo empresarial a Abispark pertence) e a Câmara de Santarém. A empresa da zona de Braga assumiu a construção do parque subterrâneo e a requalificação urbana do Jardim da Liberdade, ficando com o monopólio do estacionamento tarifado no espaço público em Santarém por 20 anos e com a exploração do parque subterrâneo por 50 anos, com a obrigação de pagar à autarquia uma renda anual de 241 mil euros - 94 mil pelo parque subterrâneo e 147 mil pelo estacionamento à superfície. A Abispark começou a explorar o estacionamento tarifado em Outubro de 2010.
Na última reunião de câmara, o presidente do município informou que o litígio sobre o estacionamento continua a ser dirimido em tribunal arbitral. Ricardo Gonçalves referiu ainda que a concessão do parque de estacionamento subterrâneo por 50 anos foi uma decisão colegial da vereação da altura. Revelou que só teve conhecimento de algumas situações relacionadas com esse processo depois de ser eleito presidente da câmara, em 2013, o que acabou por desencadear a actuação das autoridades judiciais e consequente julgamento de Moita Flores.

Caso vai para o Tribunal de Contas
Recorde-se que o ex-presidente da Câmara de Santarém, Francisco Moita Flores, foi recentemente absolvido dos crimes de corrupção e branqueamento de capitais, no caso da construção do parque de estacionamento subterrâneo no Jardim da Liberdade. Os outros dois arguidos no processo, Gaspar Borges, da ABB construções, e Nuno Moita Flores, filho do antigo autarca, foram também absolvidos. Sobre essa decisão, Ricardo Gonçalves diz que quando tiver em sua posse a sentença irá dar conhecimento ao Tribunal de Contas de algumas situações relativas ao processo do parque subterrâneo que podem consubstanciar irregularidades.
No processo, que foi julgado pelo Tribunal de Santarém, Moita Flores estava acusado, juntamente com Gaspar Borges, da prática dos crimes de branqueamento de capitais e de corrupção, passiva e activa, respectivamente. A concepção e exploração do parque de estacionamento subterrâneo no Jardim da Liberdade foi adjudicada em Abril de 2008 à empresa ABB, de Braga, numa parceria público-privada que envolvia nove milhões de euros. O Ministério Público acusou Moita Flores de receber vantagem patrimonial, de cerca de 300 mil euros, do empresário de construção civil que construiu o parque de estacionamento subterrâneo.
Em causa no processo estava também a decisão de não realização da segunda fase da empreitada, que representou a redução de 764 para 461 lugares de estacionamento subterrâneo, situação contestada pela Abispark, bem como a de entregar ao empreiteiro a realização das obras à superfície, como as cafetarias e o espelho de água, que deveriam ter sido realizadas pela própria câmara.

Acção arbitral com valor de 5,7 milhões

A acção arbitral intentada pela ABB e Abispark contra a Câmara de Santarém, com um valor de 5.791.016 euros, visa dirimir alegados incumprimentos ocorridos no âmbito da execução do contrato para concepção, construção exploração de um parque público de estacionamento subterrâneo no Jardim da Liberdade e para concessão de exploração dos lugares de estacionamento tarifado na via pública, através de parcómetros, em Santarém.

À margem – opinião

Muitos milhões em jogo

A passagem de Francisco Moita Flores pela liderança do município de Santarém deixou uma pesada herança, desde logo financeira, já que a dívida da autarquia chegou a atingir os 100 milhões de euros. Mas o pesadelo não se ficou por aí. Se a redução progressiva e acentuada da dívida na última década permitiu ao município voltar a ter as contas no verde, já alguns berbicachos que vêm desses tempos continuam por resolver. O do parque de estacionamento subterrâneo do Jardim da Liberdade - que nasceu torto - talvez seja o mais complexo e pode vir a custar uma pipa de massa à autarquia, não só em advogados que facturam como estrelas do rock and roll como também em eventuais indemnizações. São muitos milhões em jogo num litígio que se arrasta há mais de uma década e não se sabe quando terá fim, porque a missa ainda vai a meio.

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