Sociedade | 02-06-2024 10:00

Brincar com os filhos melhora a auto-estima e o vínculo afectivo

Brincar com os filhos melhora a auto-estima e o vínculo afectivo
Ana Gaspar é educadora de infância, terapeuta comportamental e proprietária do Colégio Jardinita

A brincadeira é uma actividade benéfica para o desenvolvimento dos mais novos e para que decorra não são necessários muitos brinquedos. Não pode estar circunscrita à escola e deve contar com a participação dos pais, defende a terapeuta comportamental Ana Gaspar, a propósito do Dia do Brincar.

Quando se fala de infância é inevitável falar-se de brincadeiras despreocupadas, as inventadas, as do faz de conta e as que são partilhadas com os pais e os amigos da escola. Todas cabem numa mesma infância e todas são fundamentais para o desenvolvimento cognitivo e emocional dos mais novos. “É através da brincadeira que a criança se conecta com o mundo, que inicia o seu desenvolvimento pessoal, o seu espírito crítico, o seu bem-estar emocional e aprende a ser assertiva, a comunicar, socializar e partilhar. A brincadeira é uma fonte de estímulos para a criança e é através dela que se sente mais segura e autónoma”, confirma, a propósito do Dia Internacional do Brincar, que se assinala a 28 de Maio, a terapeuta cognitiva comportamental e educadora de infância, Ana Gaspar.
A terapeuta explica, porém, que não são precisos muitos brinquedos nem muito elaborados para uma criança brincar, pois “o que importa é ter acesso a diferentes estímulos sensoriais” e para isso basta poder-se explorar um “saco de bolhas de ar ou duas colheres de sopa”. O que importa, vinca, é não travar a imaginação e estimular a “criatividade, aproveitar todo o pensamento” desenvolvido durante a brincadeira.
“A criança aprende por imitação e quando brinca ao faz de conta está a imitar a mãe, o pai, a professora nas suas actividades diárias, ou seja, está a abrir novos horizontes, a estimular o seu sentido crítico, a tomar consciência da realidade. Não está focada numa coisa só” como acontece, por exemplo, ao brincar com um tablet em que fica “demasiado concentrada e acaba por se distanciar do mundo envolvente, o que é um problema ao nível da socialização e experiências interpessoais”. Mais tarde, alerta, “se o processo for continuado pode haver comportamentos desviantes e medo em se relacionar” com o outro.
Também a ausência de brincadeira pode repercutir-se negativamente na vida adulta. “A criança que não brinca é uma criança que se retrai, que não compreende o mundo à sua volta, porque ficou privada de experiências que teriam sido enriquecedoras. Quando essa criança que não brincou passa a ser um jovem adulto acaba, muitas vezes, por ter receio de expor as suas ideias”, afirma Ana Gaspar, proprietária do Colégio Jardinita, em Alcanede, concelho de Santarém.
E é errado, vinca, dizer-se a uma criança de 10 anos ou a um pré-adolescente que já não tem idade para brincar, embora seja normal que “com o avançar da idade comecem a existir outros interesses e responsabilidades”. O que se deve fazer, aconselha, é “deixar o comportamento da criança fluir porque a seu tempo - e cada criança tem o seu - vai passar a ter outros interesses que não o brincar”.
Se a brincadeira não se deve esgotar quando a criança passa a adolescente, também não deve ficar circunscrita à escola, pelo contrário: “A criança não pode ver a escola como um local de divertimento e a casa onde mora como um lugar obrigatório de isolamento”. E é aqui que entra o papel fundamental dos pais que podem e devem participar nas brincadeiras. “Um pai que participa é um pai que valida o que a criança está a fazer e isso é muito importante para a auto-estima, pois a criança percebe que os pais compreendem o seu mundo, além de que melhora o vínculo afectivo”, diz.

Pais brincam menos com os filhos
Infelizmente, nota a terapeuta, parece haver cada vez menos pais a dedicar tempo diário à brincadeira com os filhos, algo que pode estar relacionado com “o ritmo de vida alucinante que se tem”, mas também às “novas tecnologias que acabaram por estancar muito do potencial humano”. Não será raro se em algumas casas o pai e a mãe estiverem apegados ao telemóvel e a criança andar a brincar sozinha, quando os progenitores poderiam, considera, tirar uma hora, uns minutos para “dar tempo de qualidade à brincadeira com a sua intervenção”.
Por outro lado, acrescentar qualidade à brincadeira não é o mesmo que deixar a criança fazer tudo o que quer e da forma que quer. “Pelo contrário, os pais não devem ter um comportamento permissivo. Há que impor limites, mas sem uma autoridade rígida. Deve ser explicado à criança o porquê de não poder fazer algo”, porque só explicando “a criança compreende” e aceita. A mesma estratégia, sublinha, é válida para pôr término no tempo de uma brincadeira, por exemplo, numa ida ao parque infantil. “As birras fazem parte do processo de crescimento, não há que ter vergonha delas” e, para que parem, o que se deve fazer, explica, é mais uma vez “explicar, com voz calma e com o corpo ao nível do da criança, o porquê de a brincadeira ter de acabar e dar uma alternativa como: voltamos amanhã ou para a semana. Geralmente funciona”, conclui.

Pais têm medo do brincar na rua

Há menos grupos de crianças a brincar na rua e muito menos crianças a fazê-lo livres do olhar atento dos pais e isso, na opinião de Ana Gaspar, tem um motivo e que é válido. “Os perigos que a sociedade tem são enormes e isso leva os pais a serem mais cuidadosos e com toda a razão. Actualmente não se pode deixar uma criança brincar na rua sozinha, tem de estar bem supervisionada”, defende, ressalvando que a brincadeira na rua é benéfica e deve ser fomentada.

Os brinquedos têm género?

Comprar uma boneca para oferecer a um menino ou um carrinho para dar a uma menina pelo seu aniversário parece ser ainda uma abordagem radical e à qual grande parte da sociedade não está afeiçoada. A juntar à identidade de género que se continua a atribuir a um brinquedo, há quem associe esse gesto a uma preferência sexual futura de uma criança. Mas, avisa Ana Gaspar, é completamente errado ir por aí: “Está muito longe disso. Um menino que brinque com uma boneca está simplesmente a demonstrar afectividade e que está receptivo às emoções e sentimentos”. A terapeuta nota ainda que se não se deve forçar uma menina a brincar com bonecas, também não se deve fazê-lo com um brinquedo que está mais associado ao sexo oposto.

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