Sociedade | 01-07-2024 21:00

“Alverca tem um aeroporto que podia funcionar amanhã se fosse necessário”

“Alverca tem um aeroporto que podia funcionar amanhã se fosse necessário”
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José Proença Furtado demonstrou como o aeroporto em Alverca significaria uma poupança global de 12 mil milhões de euros

Economistas, engenheiros e outros especialistas reuniram-se em Lisboa para debater alternativas e soluções para o futuro da infraestrutura aeroportuária da capital. A proposta mais destacada foi a criação de um HUB entre o aeroporto da Portela e um aeroporto em Alverca, maximizando a proximidade geográfica e as infraestruturas existentes.

O engenheiro civil José Proença Furtado voltou à carga na defesa da opção Alverca como solução aeroportuária para a capital, em detrimento da escolhida pelo Governo, no Campo de Tiro da Força Aérea, no concelho de Benavente. Participando como orador na conferência “Aeroporto de Lisboa: O que falta avaliar”, que decorreu no dia 20 de Junho, na Universidade Católica de Lisboa, defendeu que uma pista seria suficiente para Lisboa, conforme as projecções da Eurocontrol, e que a ideia de fechar aeroportos existentes é impraticável. “Esqueçam isso”, advertiu. O especialista em Planeamento Estratégico de Infra-estruturas de Transporte apoiou a continuidade do aeroporto da Portela em conjunto com uma nova infraestrutura em Alverca.
“Alverca dispõe hoje de um sistema de pistas em torno dos 2.500 metros, uma taxiway (caminho de circulação de aeronaves), tem a OGMA-Embraer (manutenção aeronáutica), uma estação ferroviária, uma ETAR, assim como auto-estradas e circulares já existentes, ou seja, é um aeroporto que podia funcionar amanhã se fosse necessário”, explicou. Na proposta de um HUB entre Portela e Alverca, especifica-se que a pista de Alverca poderia ser ampliada, transformando a actual base aérea num aeroporto comercial capaz de complementar a Portela. A ligação ferroviária entre os dois aeroportos seria uma inovação mundial, permitindo um transporte rápido e eficiente entre os terminais.
Para o engenheiro, o desafio técnico levantado é o conflito entre as pistas de Alverca e da Portela. Contudo, a solução passa pela rotação da pista de Alverca para que fique paralela à da Portela, aproveitando o mouchão salinizado desde a ruptura do dique em 2016. “Temos a sorte única de ter um mouchão natural que o Homem melhorou”, explicou José Proença Furtado. Para ter uma pista de 4.000 metros bastaria expandir sobre o mouchão existente, cerca de 40 hectares. Assim, Alverca teria duas pistas optimizadas, como no aeroporto de Gatwick, no Reino Unido, garantindo uma pista de reserva. A escolha de Alverca significaria, segundo o responsável, uma poupança global de 12 mil milhões de euros face ao Campo de Tiro da Força Aérea, na freguesia de Samora Correia.

Crescimento não justifica aposta num grande aeroporto
O economista Ricardo Ferreira Reis, um dos participantes na conferência, referiu que “Lisboa é a única capital europeia que pode usar um gigante plano de água abrigado, mas é simultaneamente a única capital europeia, com estas características, que não usa o plano de água recolhido ou de baixos fundos para o aeroporto”. E destacou como outras grandes cidades construíram aeroportos junto a corpos de água para maximizar a proximidade ao centro urbano sem ocupar terrenos valiosos. Doutorado em gestão de empresas, Ferreira Reis citou exemplos de cidades costeiras com ampliações de aeroportos próximos ou flexíveis como Tóquio (ilha-artificial), Nice (200 hectares sobre o mar), Copenhaga (zona marítima) e Bombaim (estuário) como boas práticas a seguir.
Ricardo Ferreira Reis questionou a viabilidade de um novo mega-aeroporto no Campo de Tiro da Força Aérea, citando exemplos de projectos falhados como Washington Dulles e Montreal-Mirabel para enfatizar a incerteza e os riscos associados. “Não estamos a ver uma capacidade de crescimento que justifique uma aposta grande no aeroporto. Criou-se a fantasia de um grande aeroporto à boleia do turismo, todavia a projecção de 142 milhões, mencionada no relatório da Comissão Técnica Independente (CIT) significava 6 a 7 vezes mais do que o tráfego actual. Onde é que cabe essa proporção de turistas na cidade de Lisboa?”, questionou.

Relatório da CTI “é um desastre”

O professor Luís Valadares Tavares criticou o relatório da Comissão Técnica Independente (CTI), que projecta a necessidade de quatro pistas em Alcochete, considerando-o irrealista e sem lógica baseada em prioridades reais de desenvolvimento. “Pegar em dados passados e imaginar que eles se projectam no futuro dá-nos a certeza de que aquele estudo está errado”, afirmou, questionando a validade das previsões a longo prazo. “O relatório não faz sentido e tem previsões que se estendem até 2086. A única lógica aparente é justificar a construção de quatro pistas em Alcochete”, afirmou Valadares Tavares, sublinhando a falta de prioridades claras no projecto. O professor questionou a relevância e a urgência de um mega HUB aeroportuário para o desenvolvimento do país. “Vale a pena gastar os tais 10 mil milhões de euros? Isto é bom para o país?”, deixou no ar.

A surpresa de Alverca não estar na equação

O economista e ex-secretário de Estado, António Nogueira Leite, também questionou a ligação entre a TAP e a necessidade de um novo aeroporto, destacando a falta de racionalidade nas decisões e a necessidade de uma visão económica mais realista. “A minha geração e, sobretudo, a dos meus filhos, estão fartas de pagar buracos negros na economia portuguesa”, afirmou. O economista disse ainda que a única coisa que o surpreende depois dessa conferência “é que se isto for tudo verdade, e acredito que sim, como é que isto não está na equação?”, referindo-se à opção Alverca.

Distância ao campo de tiro tem implicações logísticas e de tempo

A conferência contou ainda com a intervenção de um comandante reformado da TAP, que sublinhou a impraticabilidade de deslocar o aeroporto para a margem sul devido às implicações logísticas e de tempo para tripulantes e passageiros. “Não é um aeroporto que está a duas horas e meia de Cascais ou de Sintra que vai funcionar”, referiu, destacando a vantagem de ter um HUB entre Portela e Alverca, que permitiria um transporte rápido e eficiente entre os terminais, reduzindo significativamente o impacto nas operações diárias.

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