Sociedade | 09-07-2024 10:00

Casa do Povo da Chamusca escapa à extinção e faz do património o que quer

Mesmo com duas decisões judiciais a declararem a extinção da Casa do Povo da Chamusca, que se limita a vender casas e receber rendas, a direcção da instituição, cuja presidente foi condenada por se apropriar de 120 mil euros, continuou a vender património a seu belo prazer.

Se então já tinha poderes para o fazer, com um recurso sobre a extinção a decorrer, agora com a decisão do Supremo que anula o encerramento, a casa do povo ganha mais força para fazer o que quiser.

A Casa do Povo da Chamusca acabou por não ser extinta por decisão do Supremo Tribunal de Justiça, depois de duas decisões judiciais contrárias a justificar que a entidade não tem actividade há anos e limita-se a gerir o património. Além de que a presidente da instituição foi condenada por se apropriar de 120 mil euros entre 2009 e 2016. Há dois anos a direcção começou a executar ordens de despejo judicial de casas onde famílias vivem há décadas depois de os pais, a quem tinham sido arrendadas, terem falecido. Para não serem postas na rua, a Casa do Povo exigia às pessoas valores na casa dos 40 mil euros e um sinal de compra e venda de cinco mil euros.
O Tribunal da Relação de Évora chegou a mandar entregar os bens da Casa do Povo da Chamusca ao Estado, tendo a câmara municipal sido contactada para ficar com o património, depois de confirmar a sentença do Tribunal do Entroncamento, que em Maio de 2020 mandou extinguir a instituição. Mas a direcção da Casa do Povo, que já estava a ser alvo de um processo-crime por desvio de dinheiro, tendo a então presidente, Maria Leonor Feiteiro, sido condenada pouco tempo depois a uma multa de 1.170 euros e a dois anos e meio de prisão, suspensa por igual período mediante pagamento de três mil euros, por burla na forma tentada e abuso de confiança qualificada. A ex-secretária da instituição, Maria Teresa Brás, foi considerada cúmplice e acusada de infidelidade e foi condenada a uma multa de 1.430 euros.
Agora o Supremo, mesmo concordando que a Casa do Povo da Chamusca não tem proporcionado actividades aos associados e à população e que se limita à venda do seu património, considera que esse motivo não é suficiente para se extinguir a instituição. Recorrendo a um acórdão de 2017, que faz jurisprudência, considera que se está apenas perante “uma situação de inércia na prossecução do fim estatutário, de inactividade. E isso não é causa de extinção”. Os juízes justificam que aquilo que o Tribunal do Entroncamento e o da Relação de Évora consideraram ser uma actividade de gestão patrimonial “afigura-se-nos como sendo uma actividade de prossecução da finalidade estatutária” da casa do povo.
Para o Supremo, a instituição tem também nos estatutos a finalidade de providenciar habitação acessível aos seus associados, considerando que, nesse sentido, há uma actividade, realçando que em 2015 tinha pelo menos 27 casas e que foi vendendo 15 desses imóveis. Os juízes pronunciaram-se também sobre as irregularidades no funcionamento dos órgãos sociais “susceptíveis de gerarem invalidade dos respectivos actos e de a gestão por eles levada a cabo redundar na dissipação ou apropriação ilegítima do património” da Casa do Povo, salientando que essa também é circunstância que não é imputável à instituição, mas aos titulares dos cargos. “A responsabilidade pela ilegalidade desses comportamentos e actos só pode, assim, ser imputada aos seus praticantes”, diz o acórdão.
Se antes, mesmo com duas decisões de extinção e um recurso da instituição a decorrer no Supremo, a Casa do Povo tinha poderes para fazer o que quisesse com o seu património, agora com esta decisão fica ainda mais legitimada para vender os bens, sobretudo imóveis, como entender.

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