Contrato de concessão da água em Alenquer rotulado como um cancro
A CDU votou contra o aditamento ao contrato de concessão da água em Alenquer e diz que a consequência vai além do aumento da factura da água. O acordo estipula que a câmara pague mais de meio milhão de euros à Águas de Alenquer que deviam ser imputados à Águas do Tejo Atlântico. Na sessão pública realizada em Abrigada levantaram-se vozes contra a forma como o tema tem sido conduzido pelo executivo socialista.
O terceiro aditamento ao contrato de concessão, celebrado entre a Câmara de Alenquer e a Águas de Alenquer (ADA), desresponsabiliza a concessionária de água e saneamento no concelho pela renovação das redes e vai continuar a onerar os munícipes. Esta é a posição da CDU, que realizou uma sessão pública de esclarecimento sobre o assunto no dia 6 de Julho, em Abrigada. O vereador da CDU, Miguel Lourenço Carretas, explicou que no acordo agora assinado a ADA pode continuar a exigir o lucro que contava obter no contrato inicial com a autarquia, tal como aconteceu nas revisões ao acordo em 2016 e 2018. Um dos argumentos pode passar pelo facto de o número de habitantes em Alenquer não ter crescido como previsto, uma vez que o contrato de concessão inicial foi assinado sob o pressuposto que o novo aeroporto de Lisboa ia ser construído na Ota, concelho de Alenquer.
Por outro lado, a ADA pode recusar abastecer de água as novas urbanizações e usar o argumento de que a água tem excesso de calcário. No aditamento ao contrato está estabelecido que o município pague à ADA 530 mil euros por causa do atraso das obras do saneamento em alta. Mas Miguel Lourenço Carretas explica que este valor devia ser imputado à Águas do Tejo Atlântico, responsável pelo saneamento em alta, através de uma acção em tribunal que poderia passar pela figura jurídica do direito de regresso. “As soluções que têm sido encontradas nos contratos são cada uma pior do que a outra. A ADA continua a ter lucros na ordem dos 13% quando o tribunal recomenda que o lucro não ultrapasse os 10%”.
Na sessão pública, a concessão da água em Alenquer foi definida como um cancro. Na plateia esteve inclusive um autarca eleito pelo PSD que lamentou como uma decisão governamental (aeroporto na Ota) serviu de base para onerar uma câmara municipal. Falta de fiscalização da actividade da ADA, ausência de documentação que relate os investimentos da concessionária, o estado em que as condutas se encontram e os relatórios semestrais de investimento foram algumas das questões colocadas mas que continuam sem grande resposta. “Tenho dúvidas que os relatórios estejam a ser feitos e entregues, assim como a fiscalização activa da câmara. O que se queixam é que têm condutas velhas, pois não as renovaram mas também não sabemos como estão as condutas. Pedimos informação sistemática mas sem sucesso”, reiterou Miguel Lourenço Carretas.
ERSAR emitiu parecer
A CDU de Alenquer afirma que não é verdade que a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) tenha aprovado o aditamento ao contrato, tal como foi proposto e aprovado pela maioria socialista na câmara. No parecer sobre a proposta de acordo de reequilíbrio económico-financeiro da concessão da Águas de Alenquer, a ERSAR disse em Fevereiro de 2024 que “(…) considerando que a compensação se mantém por liquidar e que na revisão em curso não é feita qualquer alusão à Águas do Tejo Atlântico, reitera-se a necessidade de ser esclarecida a que título o município irá assumir a responsabilidade pelo pagamento da compensação devida por força do atraso na disponibilização das infraestruturas em alta de saneamento, cuja responsabilidade pela exploração pertencia à Águas do Oeste (…)”.
No documento a que O MIRANTE teve acesso, a ERSAR recomenda que o plano proposto deve ser revisto de forma a reflectir todos os investimentos associados à integração dos novos loteamentos na concessão, entre outras recomendações. O parecer da ERSAR não é vinculativo mas a CDU considera que a câmara devia ter incluído algumas das recomendações, o que a seu ver não foi feito.
Presidente preferia água na esfera pública
O presidente da Câmara de Alenquer, Pedro Folgado (PS), admite a O MIRANTE que se fosse hoje não concessionava a água à ADA, tal como aconteceu em 2013 pela mão do anterior executivo socialista. Mas o autarca sublinha que é necessário analisar o passado e o contexto em que esta concessão foi assinada e que vai vigorar até 2033. “É preferível a internalização através de uma empresa municipal ou intermunicipal, trabalhando em escala e com baixa de preços. Não teria sido a minha decisão mas não posso dizer a cru porque temos de ir àquele tempo e perceber como estavam as redes, se a câmara tinha condições e trabalhadores suficientes. Mas acho que a água se devia ter mantido na esfera da autarquia”, considera. Pedro Folgado diz que Alenquer já não tem a água mais cara do país mas que ainda assim tem um custo elevado porque as concessões imputam os custos directos e indirectos na factura da água.