Stress e maus hábitos de vida podem causar arritmias mas a poluição também influencia
Nuno Cabanelas é cardiologista da Consulta de Arritmologia do Hospital CUF Santarém e fala sobre uma doença que pode ter uma origem genética, mas também pode ser causada por um modo de vida de sedentarismo e má alimentação, entre outros factores de risco.
Mas também já se concluiu que a poluição pode ser um factor que contribui para essa doença que se caracterizam por alterações no ritmo cardíaco. As arritmias podem manifestar-se por batimentos muito rápidos (taquicardia), muito lentos (bradicardia) ou irregulares, e podem causar acidentes vasculares cerebrais (AVC) e morte súbita. Deve recordar-se que 55% da população entre os 18 e os 79 anos apresenta, pelo menos, dois factores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, que são a principal causa de morte no país.
Como é que surgem as arritmias? Algumas são determinadas geneticamente. Há pessoas que já têm familiares com esses problemas e a doença aparece em determinada altura. Em outros casos, se calhar a maioria, advém do estilo de vida com sedentarismo, má alimentação, falta de actividade desportiva. O exercício físico cria um ambiente fisiológico que ajuda a evitar que as arritmias aconteçam.
Há alguma idade mais propícia ao aparecimento das arritmias? Há muitos tipos de arritmias. As que estão ligadas a problemas genéticos aparecem mais cedo, na idade jovem. As que estão ligadas ao estilo de vida vão surgindo à medida que os anos vão passando. A mais comum é a fibrilhação auricular, que afecta cada vez mais a população à medida que esta vai ficando mais envelhecida.
Uma vez que se tem arritmias nunca mais se deixa de ter? Pode deixar de ter, dependendo do tipo de arritmias. Há algumas que são completamente curáveis. Outras, como a fibrilação auricular, que é uma doença crónica, não são curáveis, mas já têm um tratamento avançado em que se consegue evitar grande parte dos episódios e fazer com que estes sejam pouco sintomáticos e tenham consequências clínicas pouco notórias.
E como é que se curam algumas arritmias? Com intervenções a partir de estudos eletrofisiológicos, para avaliar o sistema eléctrico do coração, em que se pode fazer uma ablação. O coração contrai por estímulos que ele próprio gere e que se transmitem ao resto do coração por cabos eléctricos naturais. Quando há cabos eléctricos a mais, num sítio menos normal, pode gerar curto-circuitos. Isso são as arritmias. Com a ablação podemos interromper a circulação num cabo eléctrico e fica sem problemas.
Quais são os factores de risco associados às arritmias? São os factores de risco globais para outros tipos de doenças cardíacas: a obesidade, hipertensão, diabetes, tabagismo. Outras doenças concomitantes inflamatórias podem facilitar o aparecimento de arritmias, tal como distúrbios do sono, ou stress. Também já se chegou à conclusão que há uma influência da poluição.
Quais são as principais queixas dos doentes e os impactos que a doença tem nas pessoas? As arritmias que põem o coração a bater rápido, com uma frequência alta, podem dar palpitações, cansaço, falta de ar e, em casos extremos, desmaios. As que fazem o coração bater de forma lenta dão tonturas, pré-desmaios e desmaios e cansaço a fazer alguma coisa.
Que impactos têm as arritmias na vida das pessoas? Se o coração fizer 40 batimentos por minutos quando se está a trabalhar em esforço físico, por exemplo, pode impedir as pessoas de fazerem as actividades. Mas a forma como as pessoas sentem as situações e valorizam os sintomas e as suas intensidades variam muito de doente para doente. Já tive doentes com arritmias rápidas com 120 ou 130 batimentos por minuto que fazem a sua vida normal, já estão habituados.
Os jovens que praticam desporto de competição devem ser controlados de que forma? Devem ser seguidos com regularidade por cardiologistas? Há várias escolas. Há as que acham que é suficiente uma história clínica com as perguntas adequadas e com o exame físico e electrocardiograma. Há as que consideram que é preciso ir mais além com outros exames, como o ecocardiograma. A minha opinião é que os miúdos devem ter uma história clínica com as perguntas certas e deve ser obrigatório fazer electrocardiogramas, tal como deve ser obrigatório que estes sejam analisados por especialistas, seja em medicina desportiva seja em cardiologia.
Qual é a urgência de intervir clinicamente após a detecção da arritmia? Há várias situações. A urgência é determinada pelos sintomas e pelo impacto que têm na qualidade de vida das pessoas, bem como a possibilidade de a doença evoluir para situações piores. Muitas vezes temos de fazer vários exames para percebermos. Por exemplo, nas arritmias que acontecem muito de vez em quando durante cinco ou dez minutos, podemos fazer exames holter de 24 horas ou de uma semana e não as apanhar. Há arritmias que podem predispor o doente a morte súbita e são conhecidos casos mediáticos em que isso aconteceu, em pessoas aparentemente bastante saudáveis.
A doença é mais séria do que muitas vezes as pessoas pensam. A arritmia de fibrilhação auricular predispõe a formação de coágulos dentro do coração e podem escapar-se para o sistema nervoso central e entupir uma artéria e provocar um Acidente Vascular Cerebral (AVC).
Como é que são diagnosticadas as arritmias? Através de qualquer forma de monotorização do ritmo cardíaco, desde o electrocardiograma, holter, dispositivos implantáveis que têm uma duração de três, quatro, ou cinco anos e que estão permanentemente a monitorizar o ritmo cardíaco e que gravam as arritmias.
Qual é o papel do pacemaker neste tipo de doença? É usado nas arritmias lentas. É um pequeno computador cada vez mais sofisticado que monitoriza o ritmo cardíaco e quando este é mais baixo ele estimula o coração à frequência adequada ao doente.
Qual é a vantagem de existir uma consulta específica para este tipo de doença? As consultas específicas são com profissionais mais habituados a lidar com esse tipo de problemas, com formação específica. A tendência natural da medicina é a especialização, o que significa, além da experiência, soluções mais rápidas.
Quando é que uma pessoa deve consultar um cardiologista? Depende da idade, do contexto e da existência de outras doenças. Jovens que praticam desporto regularmente devem fazer os controlos habituais. As pessoas que a partir dos 50 anos que pretendam fazer desporto devem fazer uma avaliação prévia. Nas idades mais avançadas é conveniente fazer electrocardiogramas com alguma regularidade.
Mais qualidade de vida com o pacemaker
Carlos Oliva, de 76 anos, já se sente com mais energia e uma qualidade de vida muito melhor desde que lhe foi implantado um pacemaker no Hospital CUF Santarém. Natural de Angola, foi funcionário das Finanças, está reformado e vive em Almeirim desde 2010, e sempre foi apologista de fazer a prevenção da saúde, por isso quando um dia sentiu uma tontura quando circulava na rua resolveu procurar um médico. Na altura ficou assutado porque estava perto de uma farmácia e foi medir a tensão arterial que deu 41 batimentos por minuto.
O técnico da farmácia aconselhou-o a ir a um cardiologista e como já conhecia a CUF marcou uma consulta no hospital. Fez exames, entre os quais uma prova de esforço e um registo de holter de uma semana, e foi-lhe diagnosticada uma bradicardia, um tipo de arritmia. Conta que se sentia cansado e que chegou a baixar a frequência cardíaca a 29 batimentos. Confessa que após a colocação do pacemaker não teve qualquer limitação e que foi o período entre o diagnóstico e a implantação do dispositivo o que lhe causou mais angústia.