Voluntárias da Acolher Prá Vida fazem a diferença no apoio a doentes com cancro
Em Alenquer, as voluntárias da Acolher Prá Vida dedicam-se a ouvir e apoiar doentes com cancro. A associação, que surgiu de um grupo de partilha, tem crescido e chegado a cada vez mais pessoas. Dia 26 de Outubro a associação vai realizar um congresso que vai abordar temas tabu como a sexualidade do doente oncológico, meditação e nutrição.
Os doentes oncológicos isolam-se porque não querem preocupar a família e precisam de ser ouvidos. É neste campo de escuta activa e de partilha que actuam as voluntárias da Associação Acolher Prá Vida, de Alenquer, que se dedicam a apoiar doentes com cancro. A associação nasceu de um grupo de Whats Up chamado “Guerreiras de Alenquer” onde as doentes oncológicas desabafavam e apoiavam-se mutuamente. Quando o grupo ultrapassou as três dezenas de pessoas surgiu a ideia de criar uma associação e nasceu a Acolher Prá Vida (APV), em Outubro de 2019.
Desde aí o grupo cresceu e hoje tem 20 voluntárias fixas, um médico, um fisioterapeuta, e com o apoio da Câmara de Alenquer disponibiliza aulas de yoga e pilates gratuitamente. Mais de 300 sócios pagam as quotas anuais e, em breve, a APV vai passar a ter um espaço próprio, cedido pela Junta de Freguesia de Carregado e Cadafais, e deixar o espaço partilhado que tem com outra associação em Alenquer. “Aos poucos estamos a fazer a diferença na vida das pessoas. O nosso apoio não é a solidariedade e o doente ser encarado como o coitadinho. A nossa primeira abordagem é combinar um chá com a pessoa, conversar e demonstrar disponibilidade para ajudar no que for possível”, explica Natércia Mateus, vice-presidente.
A APV não presta apoio financeiro aos doentes de forma directa, mas caso sejam detectadas dificuldades alimentares é feito reencaminhamento para o banco alimentar e/ou as próprias voluntárias fazem recolha de alimentos entre si.
Homens não pedem ajuda
O cancro não escolhe idade e sexo mas a verdade é que a APV não tem nenhum homem no grupo. “Não procuram apoio porque culturalmente ainda subsiste a ideia que o homem é forte e não pode mostrar vulnerabilidade. Só chegamos aos homens através da via familiar”, explica Natércia Mateus.
A maioria dos doentes que chega à associação tem cancro de mama mas as voluntárias dão apoio a alguns casos de leucemia e cancro no fígado. Mesmo sabendo que algumas pessoas não vão sobreviver à doença, as voluntárias dão dignidade ao doente na hora da despedida. “Uma pessoa que esteve no primeiro chá das guerreiras já não está cá e para outra doente conseguimos acompanhamento para ter cuidados paliativos em casa. O momento da morte também é importante e quando vemos a morte com outros olhos somos mais felizes”, afirma.
A APV está a dinamizar workshops descentralizados nas juntas de freguesia do concelho de Alenquer para poder chegar aos doentes que não conseguem sair de casa. Vai também realizar o primeiro congresso “É sobre mim – Saúde e Bem-estar oncológico”, dia 26 de Outubro, no Fórum Romeira, Alenquer. No evento, que vai decorrer todo o dia, vão ser abordados temas menos falados no que respeita à forma como os doentes encaram a doença. Dietas específicas para fortalecer o sistema imunológico, estratégias de gestão para ansiedade e depressão, práticas de mindfulness e meditação, sexualidade, auto-estima e bem-estar do doente oncológico vão ser alguns dos temas em debate. O congresso tem as inscrições abertas a todos, são gratuitas, e a associação garante que será uma oportunidade única de compreender e gerir a doença oncológica com a ajuda de profissionais de saúde especializados.
Cancro por excesso de trabalho
Até chegar a Acolher Prá Vida, a vida de Paula Torres deu muitas voltas. Quando soube que tinha um cancro na mama encarou a situação como se fosse uma gripe. A directora de vendas era uma viciada no trabalho e quando começou a fazer quimioterapia dirigiu-se à Segurança Social e levantou a baixa médica. “Neguei a doença, dizia que estava boa. Enquanto fazia os tratamentos levava o computador debaixo do braço e ficava a trabalhar. Acredito que o cancro surgiu por excesso de trabalho. Eu trabalhava até às três da manhã sem que ninguém me obrigasse”, conta a O MIRANTE.
Um mês depois dos tratamentos foi-se abaixo e precisou de psiquiatra e terapia ocupacional, que ainda mantém. Mas canalizou o vício do trabalho em prol da associação. É voluntária e ajuda a organizar os eventos. No próximo ano planeia retomar a actividade profissional mas diz que será menos exigente consigo própria.
A educadora de infância Susana Lopes ainda está de baixa médica após ultrapassar um cancro de mama. Assim que soube do primeiro caroço sentiu que tinha a doença, mesmo depois da médica lhe ter dito que não era nada e que possivelmente tinha batido em algum lado. A médica passou para a ressonância magnética e pelos contornos do nódulo percebeu que era grave a fez-lhe uma biopsia. Sete dias depois recebeu a confirmação do cancro, um choque maior para o marido. Foram quatro meses de quimioterapia, depois uma cirurgia com mastectomia total, fisioterapia e radioterapia. Hoje dá o seu testemunho às outras doentes e acompanha muitas mulheres na sua luta contra a doença.
Acolher Prá Vida tem banco de perucas e almofadas de apoio
Quando Natércia Mateus soube que ia perder o cabelo, consequência dos tratamentos para o cancro de mama, teve noção de que não era uma questão de beleza mas sim do que iam pensar quando olhassem para ela na rua. Não queria ser rotulada de coitada e percebeu que a peruca era importante. À associação chegaram doentes que não tinham como pagar uma peruca e as voluntárias que já não precisavam das suas começaram a emprestar. Hoje já têm um banco de perucas e uma cabeleireira que faz o corte gratuito. As alunas da Universidade Sénior contribuem com a confecção das almofadas de apoio para as doentes colocarem debaixo da axila. Os tecidos são ofertados por uma empresa e a APV compra os enchimentos.