Novo presidente da direcção dos Bombeiros Torrejanos quer enterrar todos os machados de guerra
Gonçalo Pereira diz que pretende voltar a unir a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Torrejanos e dar-lhe o reconhecimento que merece. Acredita que a anterior direcção quis afastar Arnaldo Santos da presidência da assembleia-geral ao tornar pública uma suposta fraude de meio milhão de euros e diz que a suspensão do comandante não tinha qualquer fundamento. Polémicas que lamenta, mas que serviram para “acordar os sócios”.
Gonçalo Pereira, 44 anos, assumiu em Março último os destinos da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Torrejanos, pondo fim a um mandato que ficou marcado por polémicas envolvendo a anterior direcção, o comandante e o presidente da mesa da assembleia-geral. Prometeu “paz e tranquilidade” e é nessa base, afirma, que tem trabalhado para que “os bombeiros voltem a ser unidos” e se aproximem da comunidade.
O antigo bombeiro voluntário, da recruta de 1996, revela a O MIRANTE que decidiu avançar com uma lista candidata à direcção depois de, em conversa com alguns elementos activos na corporação, se ter apercebido que “o destino que estava a ser dado a esta casa não era o que ela merecia”. Defende que é “com base no diálogo que os problemas se resolvem”, explicando que a sua postura é a de “procurar soluções” ao invés de contribuir para polémicas que só servem para “manchar” o nome de uma associação com 93 anos ao serviço da população.
Empresário no ramo da construção civil desde os 20 anos, Gonçalo Pereira afirma que “o maior desafio tem sido gerir os recursos humanos, lidar com as pessoas e os seus hábitos já instituídos na associação”. Outro, acrescenta, é o parque automóvel da associação, composto por viaturas de transporte de doentes “já com alguns anos e que têm em média, cada uma, meio milhão de quilómetros”. As avarias, explica, são infelizmente uma constante, representando gastos para a associação e dificuldade na conciliação dos pedidos de transporte não urgentes.
Questionado sobre quem é que quer ser bombeiro hoje, o presidente da direcção acredita que nem no presente nem no futuro vão faltar interessados. “De todos os concursos que abrimos para admissão de pessoal nenhum ficou deserto. Temos 11 pessoas a concorrer às vagas e uma recruta para começar com cerca de 25 elementos”, revela. Por isso, vinca, “ainda há que queira ser bombeiro”, uma profissão que considera “gratificante” e para a qual ninguém vai “só para ir atrás de regalias, que devem, no entanto, ser acauteladas”.
“Talvez os bombeiros não tenham o devido reconhecimento, mas aqui dentro procuro sempre que o tenham, quer os que são trabalhadores da associação quer voluntários”, diz Gonçalo Pereira, sublinhando que a função de uma direcção é “manter os bombeiros que tem unidos e satisfeitos” e se possível angariar mais. Actualmente, a associação tem 52 funcionários e 100 bombeiros voluntários no quadro activo. E não menos importante, sublinha, é fazer novos sócios e manter os que o são, cerca de sete mil, com as contas em dia. “Estamos, através de cobradores, a fazer cobrar e tentar negociar pagamentos que têm muitos anos de dívida. Ser sócio de uma associação de bombeiros devia ser obrigação de cada um. Não basta reconhecer o papel dos bombeiros quando se precisa deles ou comprar águas e afins quando há tragédias”, salienta.
Enterrado machado de guerra com o comandante
A anterior direcção tornou pública uma alegada fraude fiscal de meio milhão de euros. Deu seguimento à investigação ou meteu-a na gaveta? Não temos qualquer tipo de informação sobre essa suposta denúncia. Se está a decorrer não temos conhecimento, não fomos abordados por parte de ninguém e não ficou qualquer registo da parte da anterior direcção, se é que fez denúncia nalgum sítio. Sabemos que nos tribunais de Leiria e Santarém não foi colocado nada.
Não perguntaram à anterior direcção? Nós perguntámos, mas não nos responderam. Aliás, a anterior direcção o que nos disse quando tomámos posse foi: as chaves estão aqui, têm x euros na conta e o funcionário da direcção sabe tudo o que possam precisar de saber. Foi esta a passagem de pastas que houve.
Poderia haver alguma segunda intenção ao tornar esta informação pública, nomeadamente afastar Arnaldo Santos da presidência da mesa da assembleia-geral? Sim, para mim faz todo o sentido que tivesse a ver com isso. As coisas poderiam ter sido regularizadas sem se ter manchado o nome da associação. Até porque, se houve erros cometidos, havia elementos da direcção anterior que fizeram parte dessa direcção de Arnaldo Santos.
Enquanto candidato apoiou a permanência do comandante José Pereira, estando este suspenso por utilização de viaturas para fins particulares. A palavra de comandante, que negou as acusações, vale mais que a de uma direcção? O meu apoio para com o comandante é o mesmo que agora: apoio-o mas acima de tudo apoio a lei. O comandante, após ter recebido a carta de não renovação do comando, recorreu à comissão arbitral que lhe deu razão; ou seja, os argumentos utilizados pela direcção não tinham fundamento. Já mais tarde, depois de termos tido acesso ao processo, vimos que não pode ter usado o carro para fins particulares no dia que a direcção argumentava porque existia um ofício assinado por essa mesma direcção a autorizar a saída da viatura. Além disso não existia uma carta de missão atribuída por parte dessa direcção ao comandante. Como queriam exigir ao comandante quando este não tinha nenhuma missão atribuída? Foi algo que já fizemos.
Comando e direcção estão agora alinhados? As ideias podem não ser as mesmas em algumas situações, mas o que está do lado da operacionalidade será ele a decidir. O que posso dizer com certezas é que estamos em contacto diário com o comando e que há uma relação de proximidade.
Estas polémicas tiveram impacto negativo junto dos sócios? Pelo contrário, estas polémicas acabaram por unir mais os sócios. Esta foi uma das eleições mais votadas, com perto de 600 sócios a participar. Os sócios acabavam por estar adormecidos e estas polémicas fizeram-nos despertar. Tivemos uma assembleia-geral há cerca de um mês e passou dos 100 participantes o que não era normal.
Não lhe ouvimos nenhuma crítica ou pedido durante o seu discurso no 93º aniversário da AHBVT. Não há nada para reivindicar? Há, claro, mas defendo que tem de se falar nas instâncias certas. Não é em dia de aniversário que temos de usar um palco para nos lamentar. Temos de ser assertivos com as nossas posições e nos locais certos pedir o que temos a pedir. Não critico quem o faça, mas não acho que seja local indicado.
A saldar pagamentos em atraso
O presidente da direcção empossada há pouco mais de meio ano diz que a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Torrejanos “está a ficar com as contas em dia”, revelando que a direcção anterior deixou “pagamentos em atraso a fornecedores e a bombeiros voluntários pela compensação que fazem das 12 horas diárias, que estavam desde Agosto de 2023 por liquidar”.
Ainda em matéria de finanças, afirma que o apoio dado pelo Estado podia ser melhor, ressalvando que esta associação está a trabalhar para depender o menos possível de subsídios. “Na última assembleia-geral negociámos a venda do direito de superfície de um dos terraços onde estão instaladas antenas, para que possamos ter alguma receita e canalizá-la para a substituição de algumas ambulâncias”, conta.
Mas se há algo de que esta associação não se pode queixar é do apoio dado pelo município de Torres Novas. “Temos excelente relação com a câmara municipal. Têm sido parceiros impecáveis nestes seis meses”, afirma, referindo-se não só a apoios logísticos como aos 20 mil euros de apoio financeiro mensal. “Sei de outras realidades de associações de bombeiros e o valor que recebem dos municípios é cerca de 10% daquilo que recebemos”, destaca.