O Pai Natal de Alenquer a quem até já pediram irmãos e trabalho para os pais
Com barba verdadeira e um espírito genuíno, Armando Valle Quaresma tornou-se uma figura icónica da iniciativa “Alenquer, Presépio de Portugal”. Todos os anos recebe crianças e adultos que procuram mais do que apenas uma fotografia com o Pai Natal. Em Alenquer, onde interpreta a personagem desde 2016, ensina valores como solidariedade, paz e amor às crianças, combatendo o consumismo.
Há 24 anos que Armando Valle Quaresma, de 74 anos, veste a pele de Pai Natal, mas não é um Pai Natal comum. Reformado e com um passado como lapidador de diamantes e actor, assume uma missão pedagógica: combater o consumismo e ensinar às crianças o valor da solidariedade, da saúde e do amor. Antes de fazer de Pai Natal já usava barba e as semelhanças com a personagem levam a que no dia-a-dia as crianças digam aos pais na rua e no supermercado “está ali o Pai Natal”.
Em Alenquer, onde vive e faz de Pai Natal para o município desde 2016, tem marcado gerações com as suas mensagens. “Incuto nas crianças que devem pedir saúde, paz e amor, e só depois um presente e explico o verdadeiro significado de dar e receber com amor”, conta.
Histórias não lhe faltam, desde um menino que pediu um tablet e acabou a aprender sobre o valor dos presentes, até uma menina que pediu um irmão, a quem explicou pacientemente que nem todos os desejos se realizam de imediato e que devia conversar com os pais.
A sua ligação ao papel começou no ano 2000, no Centro Comercial Colombo, em Lisboa, onde trabalhou durante vários anos, passando depois pelo Shopping dos Olivais. Apesar de pensar em abandonar a personagem, foi em Alenquer que encontrou um novo propósito, e começou a interpretar o Pai Natal de forma gratuita a pedido de uma amiga e, depois, pela câmara na iniciativa anual Alenquer, Presépio de Portugal. “Para mim, isto é um extra, mas não vendi a minha imagem. O que cobro é o preço do aluguer do fato, que é meu, e mantenho a barba verdadeira, que deixei crescer após a guerra colonial na Guiné, onde fiquei com um estilhaço”, explica.
Há crianças que pedem ao Pai Natal trabalho para os pais
Armando Valle Quaresma, que tem raízes em Constância, recebe na casa do Pai Natal, no Parque Vaz Monteiro, em Alenquer, centenas de crianças entre os três e os 12 anos provenientes das escolas. Aos domingos recebe crianças e adultos que pedem para tirar fotografias. Mal tem tempo para comer ou ir à casa de banho num trabalho que diz ser cansativo.
Conforme os anos passam, a ideia de que o Pai Natal existe vai sendo diluída. “Há muitos miúdos que não acreditam no Pai Natal e dizem-me que não sou verdadeiro. E eu brinco com eles: digo que sou um robô e que tenho que ligar a ficha e eles ficam parados. Depois as professoras perguntam porque acham que não sou verdadeiro, mas eu sou verdadeiro”, explica. Outras crianças recordam-se da mensagem do Pai Natal ano após ano e são elas próprias que as repetem para os colegas.
Armando Valle Quaresma relata que ser Pai Natal foi “pesado” e recorda as crianças que recebia no Colombo e que em vez de prendas pediam trabalho para os pais. Em casa guarda ainda cartas que lhe foram dirigidas, uma delas da mãe de uma jovem de 22 anos que lhe agradeceu ter ajudado na reintegração da filha. Na memória guarda os episódios em que fazia de Pai Natal na pediatria do antigo Hospital Júlio de Matos, em Lisboa, e relembra o menino que não falava com ninguém há três anos e quebrou o silêncio ao interagir com o Pai Natal. “Enquanto puder, vou continuar a fazer de Pai Natal. Esta figura ainda tem um impacto enorme, especialmente nas crianças. Mais do que um papel é uma forma de trazer magia e esperança a quem precisa”, conclui.