Biopark da Barquinha volta à ordem do dia mas o projecto está descredibilizado
Há três meses Fernando Freire dizia que o terreno previsto para um projecto denominado Biopark afinal era para aumentar a zona Industrial da Barquinha. O promotor, que parece morto desde que o projecto foi dado a conhecer, acenou com uma garantia bancária, que ainda não tem qualquer validade, e pela 15ª vez a assembleia municipal vai pronunciar-se sobre o assunto. A polémica está outra vez instalada, como se pode deduzir deste texto de O MIRANTE.
O Bark- Biopark Barquinha foi dado a conhecer em 2018, era um investimento na ordem dos 70 milhões de euros e tinha abertura anunciada para 2021 no documento de apresentação que ainda está disponível na Internet. Catorze assembleias municipais depois, e apesar do presidente da câmara, Fernando Freire, ter anunciado numa entrevista radiofónica no dia 16 de Outubro de 2024 que o terreno ia finalmente servir para alargar a zona industrial, que já não tem lotes disponíveis, eis que foi anunciada nova discussão sobre a viabilidade do projecto na próxima assembleia municipal, a realizar no dia 28 de Fevereiro.
Segundo informação da autarquia, discutida na última reunião da assembleia, terão chegado à câmara, no dia 19 de Dezembro de 2024, documentos bancários que, supostamente, reforçam o capital social da empresa promotora para 10 milhões de euros. Devido a esse facto, foram por água abaixo todas as certezas já proferidas por Fernando Freire, que achava que o promotor tinha problemas, que ele não pode revelar na tal entrevista ao “Entroncamento Online”, por ser pouco ético da sua parte, que a zona industrial bem precisava de ser alargada para atrair investimento, e que não se dá um terreno no valor de 10 milhões sem todas as garantias.
Afinal, quase sete anos depois, mesmo ainda numa altura em que se discute o projecto do empreendimento megalómano (ver caixa), Fernando Freire volta com a palavra atrás e leva o assunto a debate mais uma vez, embora as garantias bancárias apresentadas estejam debaixo do sigilo bancário, e, por isso, não possam ser do conhecimento público.
Entre os documentos apresentados, como o do depósito que supostamente servirá para aumentar as garantias da empresa promotora, consta ainda um documento de um fundo de investimento estrangeiro, no valor de 45 mil dólares, a pagar por tranches. Aparentemente, é este mesmo fundo estrangeiro que está envolvido desde o anúncio do projecto, cujo nome se desconhece. Recorde-se que o próprio presidente de câmara já desvalorizou, e considerou pouco séria, a forma como João Rodrigues quis dar garantias financeiras. Na referida entrevista já citada, realizada há cerca de três meses, Fernando Freire disse que “não aceitava garantias de fundos que não estivessem integrados no sistema bancário português”, criticando a forma como o dono do projecto tentou mostrar “evidências financeiras”, adiantado ainda que julgava que era um fundo árabe, mas não falando em nomes.
João Paulo Marques tem 28 anos, é filho de João Rodrigues, um antigo contabilista natural de S. Miguel do Rio Torto, que há muitos anos mudou a sua residência para Lisboa. O promotor, sobre o qual não se conhece trabalho realizado ou mérito empresarial, anuncia no livro do Biopark, também disponível na Internet, que sempre gostou de animais e que é licenciado em Biologia. Foi lá que O MIRANTE encontrou o anúncio de que “O Bark | Biopark Barquinha será um dos mais interessantes bioparques a visitar na Europa e no mundo, assim que abrir portas, em 2021”. Mais de quatro anos depois do anúncio público, o projecto ainda não saiu do papel, embora conte com a classificação de Interesse Municipal e com o apoio e a fezada de Fernando Freire, o autarca que está a acabar 12 anos de mandato na Barquinha sem deixar Obra que se veja.
Centro de conservação, reprodução e reintrodução no habitat natural de espécies em vias de extinção
O texto que se segue foi retirado do documento que esteve em discussão pública mas é possível ter uma ideia mais aproximada do projecto fazendo uma pesquisa por livro-bark e todas as palavras chave que encontra neste artigo.
O Bark - Bioparque Barquinha é um parque temático, sobre a vida animal, a desenvolver numa área de cerca de 38 hectares, pretende constituir-se como um bioparque, onde será possível visitar uma colecção de 260 espécies (situação inicial), havendo potencial para ampliar a colecção até 3000 espécies. As colecções das espécies estarão dispersas por 10 grandes áreas que comportam nove habitats diferentes: Savana Africana, Ásia Tropical (estufa), Pantanal, Peneda-Gerês (Ibéria), Austrália, Himalaias, Ásia, Congo, Pólos e a exibição das aves (de vários habitats). O bioparque está projectado como centro de conservação, reprodução e reintrodução no habitat natural de espécies em vias de extinção. Este parque foi pensado como pólo de conhecimento que alia a pesquisa científica ao desenvolvimento de programas ambientais. Para além dos vários habitats que sustentarão as exposições animais, o projecto contará com um conjunto de infraestruturas que permitirão assegurar todas as questões relacionadas com a saúde e bem-estar animal e todas as infraestruturas necessárias ao usufruto pleno do parque pelos visitantes, como sejam o edifício de entrada, o centro pedagógico, os restaurantes, os vários quiosques de merchandising e o hotel.
Projecto de Disneylândia ribatejana não passa de um mega zoológico
Não se faz conservação de elefantes na “recta da Atalaia”, lamento. Sejamos honestos: isto é um mega zoológico, uma colecção de espécies feita com propósitos mais ou menos recreativos por um tipo excêntrico e endinheirado.
Do projecto, que esteve em consulta pública, está escrito que os promotores prevêem 400 mil visitantes no primeiro ano e cerca de um milhão no segundo. Na discussão pública participaram 11 cidadãos e uma associação. Das três opiniões mais elaboradas, e que contam como opinião, uma delas é demolidora e vai aqui na íntegra por a considerarmos a mais importante e esclarecedora. Num próximo artigo sobre este tema daremos conta das duas outras intervenções.
“Quando há uns dois ou três anos fui contactado informalmente por dois dos participantes neste projecto no sentido de dar algum aconselhamento técnico em matéria de pastagens, maneio dos solos e regadio, fiquei completamente incrédulo com a descrição deste empreendimento. Confesso que ainda hoje, e após leitura da documentação fornecida, tenho dificuldade em formular um comentário sério a tudo isto.
Num esforço de síntese, e com algum desalento, eis a minha melhor resposta possível neste momento: Consigo entender, ou aceitar, a componente pedagógica do projecto e até, com alguma boa vontade, aquela conversa da investigação científica. Não consegui até à data entender a parte da conservação. Os projectos sérios de conservação (de espécies animais e vegetais, único enquadramento remotamente possível aqui) são necessariamente mais específicos, dedicados a uma espécie ou a um habitat em particular e normalmente apresentam uma relação geográfica com o que pretendem conservar. Não se faz conservação de elefantes na “recta da Atalaia”, lamento.
Sejamos honestos: Isto é um mega zoológico, uma colecção de espécies feita com propósitos mais ou menos recreativos por um tipo excêntrico e endinheirado. Posto isto, preocupa-me a origem das espécies vegetais que vão constituir esta espécie de Disneylândia ribatejana - a propósito, é bastante provável que uma boa parte vá sucumbir às condições edafoclimáticas particularmente difíceis do local. A parte do aprovisionamento de animais parece estar esclarecida, menos mal. Preocupou-me muito também a questão do impacto paisagístico mas fiquei mais aliviado ao conhecer a zona de implantação. O local em causa já está todo estropiado, portanto não é muito grave por aí. Enfim, não percebo como é que um biólogo supostamente apaixonado pela natureza vai gastar 70 milhões de euros num sistema altamente artificializado, com elevada demanda de recursos e consequente gigantesca pegada ecológica associada. Tenho a maior estima pela pessoa que está envolvida nisto e tomou a iniciativa de me contactar. É uma excelente profissional, assim como o serão muitos dos restantes envolvidos. E percebo até que os autarcas não tenham outra saída alguém que aprove, ou então o promotor vai fazer esta cagada para outro lado qualquer e a economia local nem beneficia um bocadinho com a coisa... Pedro Coelho (Eng.º Agrónomo).