“Os jovens têm que deixar de ser vistos como crianças ou inconscientes”
Ana Duarte, Raquel Vital, Gonçalo Silva, Íris Gomes e Diogo Batista são os cinco candidatos à Câmara de Jovens de Abrantes e falaram com O MIRANTE sobre os desafios de ser jovem nos dias de hoje. Dizem que há mais espírito crítico na juventude actual e lamentam ser pouco ouvidos pelos mais velhos. Jovens participaram num debate público e acreditam que a sua geração tem cada vez mais interesse em temas como a cidadania e a vida pública.
Apesar das divergências eleitorais, os cinco candidatos à Câmara de Jovens de Abrantes concordam que os jovens têm cada vez maior espírito de crítico e vontade de participar na vida pública, apesar de ainda serem pouco ouvidos e não serem levados a sério pelas gerações mais velhas. Raquel Vital, 18 anos, é a mais velha dos cinco candidatos. Frequenta uma licenciatura de Matemática aplicada à tecnologia e à empresa, em Lisboa, e decidiu candidatar-se ao programa por sentir que é uma forma de estar ligada à cidade e à comunidade, oferecendo o seu contributo para melhorar Abrantes.
Ana Duarte e Diogo Batista, de 17 e 16 anos, são alunos da Escola Dr. Manuel Fernandes, em Abrantes, nos cursos de Ciências e Tecnologias e Economia, respectivamente. Ana Duarte afirma que se dedicou ao projecto pela experiência e aprendizagem, tendo o objectivo de construir um maior espírito de união entre os jovens. “Há falta de coragem nos jovens para expor as suas ideias. Nós queremos levar a voz e as ideias desses jovens, que não têm a coragem ou a iniciativa para o fazer, aos locais onde as decisões são tomadas” afirma a jovem. Para Diogo Batista, a maior motivação para participar no programa foi mostrar que os jovens conseguem participar na vida pública e propor melhorias à cidade, justificando uma maior crença nas suas ideias.
Gonçalo Silva, de 16 anos, é estudante de Artes na Escola Solano Abreu, em Abrantes, e encara a participação na Câmara de Jovens como uma experiência e um desafio. Já Íris Gomes, de 17 anos e estudante da área de desporto na Escola Dom Miguel Almeida, também em Abrantes, acredita que pode servir de exemplo e de incentivo à próxima geração de jovens para participar também.
Ana Duarte defende que os jovens têm, hoje, mais espírito crítico e de inovação do que em gerações anteriores. Apesar de concordar, Íris Gomes lamenta que ainda não sejam ouvidos pelos mais velhos, destacando o papel de iniciativas como a Câmara dos Jovens para poderem expressar as suas ideias e opiniões. Gonçalo Silva sente que os jovens são pouco levados a sério, por serem vistos como imaturos e pouco preparados para assuntos como a vida pública.
“Os jovens têm de deixar de ser vistos como crianças ou inconscientes. Muitas vezes, sentimos que acham que não sabemos nada, que a nossa opinião não é válida em assuntos mais sérios e que não faz sentido o que dizemos e, talvez por isso, os jovens hoje tenham mais espírito crítico, mas menos coragem de expor, publicamente, as suas ideias”, defende Ana Duarte. Apesar do sentimento relativamente às gerações mais velhas, acreditam que a geração está unida, com ambições e objectivos comuns, como ser feliz e estar bem consigo próprio. No entanto, Gonçalo Silva acredita que há ainda algum afastamento e divisões por microgrupos que é preciso combater em prol de uma união global dos jovens.
Os cinco acreditam que a cidadania é um tema cada vez mais presente na sua geração, sendo papel da escola, mas principalmente das famílias, incutir esses valores aos mais novos. “A escola aborda que os jovens, enquanto cidadãos, têm de participar e estar activos na comunidade, mas o principal vem de casa e da família, são esses valores que são passados que vão ter maior peso”, afirma Diogo Batista.
Estudos e escolhas profissionais são factores de grande pressão
Estar juntos, ao ar livre, a conviver e trocar ideias são a ocupação de maior interesse apontada pelos cinco jovens. No entanto, reconhecem que o estudo acaba por ocupar grande parte do tempo. “Hoje em dia, os jovens colocam muita pressão em si, pela exigência de resultados e dos pais. Esta pressão acaba por prejudicar a ideia e gosto dos jovens pela escola, porque acreditam que é só estudar e lidar com a pressão dos pais e a exigência dos professores”, lamenta Raquel Vital.
Os restantes quatro jovens ambicionam também seguir para a faculdade, por acreditar que o mercado profissional está muito fechado para quem não seguir o ensino superior. “Quem não tem uma licenciatura acaba por conseguir ter trabalho na mesma. Mas, no mercado, parece que quem não tem uma licenciatura é sempre julgado e parece um requisito mínimo nos dias de hoje”, afirma Ana Duarte.
Para Diogo Batista, ser jovem tem partes boas e más mas não gostava de trocar por outra idade. “Dá oportunidade de inovar, ter novas aprendizagens e conhecimentos. Entrar em projectos que, não tendo responsabilidades maiores nem riscos, é mais fácil do que em idades mais avançadas”, diz. Raquel Vital tem outra perspectiva, achando que é na juventude que se tomam decisões mais importantes relativamente ao futuro, como a escolha da licenciatura, e com menos conhecimento. “Não temos, se calhar, a consciência nem conhecimento necessários para decidir coisas tão importantes para o nosso futuro, como por exemplo, a escolha dos cursos. É uma decisão muito importante e pesada e que muitos jovens a tomam, pouco preparados”, lamenta.
Dez mil euros para concretizar projectos
Os cinco jovens são os representantes das cinco listas candidatas à Câmara dos Jovens de Abrantes e participaram no debate público, do dia 11 de Janeiro, no auditório da Escola Dr. Manuel Fernandes que contou com a presença do presidente Manuel Valamatos e da vereadora Celeste Simão. Cada lista é responsável pela gestão de um orçamento de 10 mil euros, atribuído pelo município de Abrantes, para concretizar projectos estruturantes para o concelho.
As votações decorrem de 17 a 23 de Janeiro, na plataforma Abrantes 360, devendo os eleitores ter entre os 14 e 21 anos e estarem recenseados. Os resultados serão divulgados dia 24 de Janeiro e a tomada de posse do executivo eleito acontecerá na reunião de câmara seguinte. O mandato dos eleitos terá a duração de um ano, a contar da data de tomada de posse. O presidente do município, Manuel Valamatos (PS), espera que do programa saiam homens e mulheres do futuro, afirmando estar sempre disponível para ouvir e falar com os jovens sobre ideias e projectos para o concelho.
Receio sobre as gerações futuras
As perspectivas para as gerações futuras, por parte do grupo de cinco jovens, não são as melhores. Raquel Vital acredita que a sociedade está a perder valores de comunidade, correndo o risco de ir perdendo a sua identidade a longo prazo. Para Íris Gomes e Diogo Batista, as gerações mais jovens têm cada vez menos respeito e interesse em ouvir os mais velhos. Ana Duarte receia que, no futuro, as gerações mais jovens percam a união entre si e que se perca o caminho que tem sido feito, numa tomada de posição e maior iniciativa. Para Gonçalo Silva, o maior problema incide no excesso de variedade e oferta em várias áreas da vida. “Os jovens acabam por ter, ao seu dispor, uma quantidade infindável de ofertas em todas as vertentes e de muito fácil acesso, seja em termos de tecnologia, com muitas aplicações e jogos, muita oferta de desportos e até de drogas”, afirma.