Falar sobre a morte enquanto se bebe uma chávena de chá

“Death Café” realizou-se na Sala Bernardo Santareno, numa iniciativa aberta a toda a população. Falou-se sobre morte num ambiente descontraído e partilhou-se testemunhos de quem já lidou de perto com a finitude da vida.
A Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos (ECSCP) da Unidade Local de Saúde da Lezíria dinamizou um Death Café na Sala Bernardo Santareno, em Santarém. A iniciativa decorreu na sexta-feira, 22 de Fevereiro, e teve como principal objectivo incentivar a população a conversar sobre a morte de forma informal e sobre como podemos lidar com a finitude da vida de forma saudável e humana. Enquanto partilhavam uma chávena de chá e uma fatia de bolo, os participantes falaram sobre as suas perspectivas pessoais e a proximidade que já tiveram com a morte, concordando todos que, apesar da morte ser um mistério, é também uma fase da vida e deve ser encarada como tal.
A maioria dos participantes eram profissionais de saúde, que têm contacto com a morte diariamente, porém também estiveram presentes pessoas de outras profissões, que já perderam familiares e que têm todos a sua maneira pessoal de encarar a morte e o sofrimento e aprendizagens que esta acarreta. Uma das intervenientes foi a enfermeira Raquel, que confessou ter sido muito protegida da morte de familiares quando era criança, não lhe sendo permitido ir a funerais, e que por isso o seu primeiro contacto com a morte foi no seu primeiro ano de estágio, em que se deparou com uma paciente que estava a morrer. Apercebendo-se da agonia e solidão da mulher, a jovem enfermeira deu-lhe a mão e esteve com ela “até ao fim”, descobrindo naquele momento o que era a morte.
Outros profissionais de saúde admitiram que também tentam ter a mesma atitude com doentes que estão a morrer, mas alguns confessam que ainda há muitos que não sabem ou não querem lidar com a morte e que isso também ajuda a propagar o tabu deste tema. Ao longo do evento vários participantes partilharam também memórias de infância relacionadas com o tema, concordando que o tabu da morte começa no seio familiar e no medo que muitas famílias têm em abordar e lidar com o tema, especialmente com as crianças.
Cátia, que também é enfermeira, afirma que na sua família nunca se falava de quem morria, mas que desde que teve filhos que tem tentado ter uma abordagem diferente com eles e introduzi-los à conversa sobre a morte, pois “falar da morte é falar da vida” e nunca devemos nos privar de falar e celebrar quem já não está entre nós por medo. Com conversas e histórias que podiam estender-se por horas, a iniciativa terminou com a leitura de poemas da falecida avó de uma das participantes, que encapsularam o que muitos partilharam sobre a morte e sobre a importância de preservar a memória dos que já não estão entre nós. A iniciativa “Death Café” decorre trimestralmente ao longo do ano, não havendo ainda data definida para a próxima sessão.