Sobreviver a um AVC e encontrar uma segunda oportunidade para viver

O Grupo de Ajuda Mútua de Abrantes é o único no distrito e reúne sobreviventes de AVC, que partilham experiências e conselhos, num espaço onde se sentem compreendidos. O MIRANTE conversou com alguns dos rostos do grupo que confessam ter encontrado uma segunda oportunidade para viver.
Os Grupos de Ajuda Mútua (GAM) são essenciais para a recuperação emocional e social de sobreviventes de Acidente Vascular Cerebral (AVC). Neles, os participantes partilham experiências, desafios e conquistas, contando também com o apoio e partilhas de profissionais de saúde. Em Portugal, existem 22 GAMs, sendo o de Abrantes único no distrito de Santarém, onde os sobreviventes encontram um espaço de apoio e compreensão. A criação do GAM de Abrantes deve-se à determinação de Anabela Santos, de 51 anos, sobrevivente de AVC. Afirma que foram precisos dois anos de esforço para criar o grupo na cidade. Sentindo-se incompreendida e com vontade de ultrapassar o obstáculo que a vida lhe colocou à frente, Anabela Santos encontrou um GAM em Portalegre, que a marcou imenso, ao ponto de decidir trazer a iniciativa para a sua cidade. “Quando temos um AVC e somos hospitalizados, somos apenas números. Descobri o GAM de Portalegre e vi aquela sala cheia de sobreviventes como eu. Saí de lá outra pessoa, vi uma luz ao fundo do túnel e um novo propósito”, explica a O MIRANTE.
Com o apoio das psicólogas Susana Silva e Mónica Mata, o grupo foi criado este ano e já vai para a quarta sessão, realizadas sempre no segundo sábado de cada mês. É notório o impacto positivo que a iniciativa tem tido nas vidas das pessoas. Um desses casos é o de Mário Alves, de 56 anos, que teve um AVC em 2020 e encontrou no GAM um novo fôlego para a sua recuperação. Natural do Barreiro, Mário Alves vive actualmente em Abrantes e conheceu a iniciativa através de Anabela. Revela ao nosso jornal que desde que entrou no grupo tem se sentido mais motivado e já trouxe outros sobreviventes para as sessões. O antigo empresário e actual social media manager, destaca a importância do grupo para combater a ansiedade que sente desde que sofreu um AVC, salientando que o caminho para a recuperação só é possível com muita força de vontade e esperança. “O AVC é uma segunda oportunidade de vida, uma espécie de versão 2.0 daquilo que somos, e é fundamental para quem está a recuperar ter esta mentalidade. Há vida para além do AVC”, afirma, com entusiasmo.
Para a psicóloga Mónica Mata, de 29 anos, outro aspecto fundamental do GAM é a presença de cuidadores e familiares, uma parte essencial do processo de recuperação dos sobreviventes. A trabalhar na Unidade de Cuidados Continuados da Chamusca, Mónica Mata ressalta que, por actuar apenas durante o período de internamento, não acompanha a reabilitação completa dos pacientes e nesse sentido considera que o GAM é uma ferramenta valiosa cujas novas ideias e estratégias pode aplicar no seu trabalho. “Um dos momentos que senti que estava na pele do doente, foi na sessão da terapia da fala, onde fizemos diversos exercícios e uma das dinâmicas envolvia ter que tentar comunicar só com o olhar. Nesse momento entendi melhor o que os meus pacientes sentem e isso é uma mais-valia para mim a nível profissional”, explica. Para além das aprendizagens profissionais, a troca de experiências no grupo marca também a nível pessoal os profissionais de saúde que participam nas sessões. A psicóloga Susana Silva, de 40 anos, partilha que tem aprendido muito sobre o tema e destaca que a nível pessoal é impossível não se emocionar com a resiliência dos sobreviventes e o apoio e empatia mútua que têm. “É inspirador ver a capacidade de superação de todos os sobreviventes. Como psicóloga, sinto-me privilegiada por testemunhar histórias de resiliência de pessoas que, num momento, não conseguem abotoar um botão e, um ano depois, estão a correr uma maratona”, partilha.
Um dos objectivos do grupo é chegar ao máximo de pessoas e criar uma rede de apoio emocional e social para os sobreviventes, tendo o GAM de Abrantes já o apoio de várias entidades. Apesar de o grupo ainda estar em crescimento, o impacto do GAM de Abrantes na vida dos participantes é inegável. “Este grupo é um salva-vidas. Se já me ajudou a mim, imaginem quem não tem apoio em casa. O AVC não é o fim. Com esforço, apoio e amizade, há sempre uma nova oportunidade”, remata Mário Alves.