“Fofas de Mação” resistem ao esquecimento e à perda das tradições

Tradição das emblemáticas “Fofas de Mação” corre o risco de desaparecer. Vera Fernandes é a única que ainda mantém viva a confecção tradicional do doce na vila. A jovem maçaense aprendeu com Lucinda Dias, uma das que melhor dominou a arte de confecionar o doce e que, aos 88 anos, diz já não ter forças para continuar a tradição.
Em Mação a tradição das emblemáticas cavacas, mais conhecidas na vila como as “Fofas de Mação”, sobrevive por um fio. Em tempos, o aroma das “Fofas de Mação” sentia-se nas ruas da vila. Com 88 anos, Lucinda Dias diz já não ter forças para continuar a confecção, e resta apenas Vera Fernandes, que aprendeu com a “mestra”, para manter viva a tradição. Vera Fernandes decidiu aprender a confeccionar as Fofas e actualmente tem a sua própria loja, os “Segredos de Mação”, onde vende vários doces e bolos caraterísticos do concelho. “Já quase ninguém as fazia, só a Dona Lucinda, por isso quis aprender. Pressenti que se ninguém o fizesse as Fofas de Mação deixariam de existir”, conta a O MIRANTE Vera Fernandes, enquanto responde a uma das suas clientes se ainda tem fofas para vender. Com um sorriso no rosto, Vera responde que o doce já esgotou, estando de momento a preparar uma nova fornada.
O doce é confeccionado a partir de uma massa com farinha de trigo, azeite, ovos, aguardente e açúcar. Após a massa estar pronta, é colocada às rodelas num tabuleiro para ir ao forno, devendo ser a sua cozedura lenta em forno brando. Depois são cobertas com um creme de claras batidas em castelo com açúcar, estando o segredo da confecção nos mínimos detalhes. “Até mesmo o tamanho dos ovos faz diferença. Se não for tudo perfeito, ficam duras e têm que ser descartadas. É preciso ter muito cuidado e persistência e confesso que demorei muito até acertar na receita. Foi tentativa e erro”, explica Vera Fernandes.
Além das fofas, Vera Fernandes dedica-se a outros doces e bolos tradicionais, como os torrados, broinhas de mel e noz e biscoitos de manteiga e limão, feitos através de receitas antigas que recolheu de mães, avós e pessoas mais velhas da vila. A pasteleira de 41 anos começou como doceira nos tempos livres, ao participar na Feira Mostra de Mação e nos Quintais da Praça, onde deu a conhecer os seus doces e onde foi obtendo a aprovação dos clientes. “Fui ajustando algumas receitas, nomeadamente na quantidade de açúcar, pois muitas das receitas tinham imenso açúcar e confesso que ingressar neste negócio valeu muito a pena e até superou as minhas expectativas”, refere com entusiasmo. Ao longo dos anos o negócio tem crescido, havendo várias lojas que querem conhecer e provar “os segredos de Mação”.
A mestra que adoçava a boca à população
Lucinda Dias recorda com saudade os dias em que as cavacas eram feitas num forno a lenha e onde a cozinha se enchia de calor e movimento. Apesar de actualmente já não ter a energia e saúde para se dedicar à confecção do doce, Lucinda Dias ainda guarda bem viva a receita das cavacas típicas do concelho e diz sentir nostalgia dos tempos em se levantava cedo para amassar a massa. “Fiz cavacas durante mais de 60 anos e apesar de ser um doce que dá trabalho e que requere muita paciência e dedicação, adorava o que fazia e toda a gente gostava das minhas cavacas. Foram bons tempos”, recorda, com um sorriso. A maçaense, que falou a O MIRANTE acompanhada do marido, António João, conta que antigamente, tal como ela, havia muitas pessoas que faziam cavacas e outros doces, uma prática que, mais do que um ofício, era um ritual familiar. “Das pessoas que faziam como eu, já nenhuma está viva e agora é tudo feito nas máquinas. Dessa forma as cavacas não ficam tão bem. Antigamente ia-se à lenha e batia-se tudo à mão até pôr a massa tão fina e tão ‘fofa’ que nem pesava nada antes de vir do forno”, conta Lucinda, afirmando que talvez seja esta a origem do nome.
Se por um lado o tempo afastou Lucinda Dias das cavacas, é a modernização da sociedade e a falta de interesse dos mais jovens que verdadeiramente ameaça a sobrevivência do doce típico de Mação. A antiga pasteleira lamenta que as novas gerações não queiram aprender os costumes e saberes de outrora. No entanto, apesar dos novos hábitos, as Fofas de Mação resistem ao esquecimento e à perda das tradições, seja através da memória de Lucinda Dias ou da persistência de Vera Fernandes.
