Sociedade | 06-05-2025 12:00

Centro Escolar de Riachos é exemplo na inclusão de alunos surdos

Centro Escolar de Riachos é exemplo na inclusão de alunos surdos
O Centro Escolar de Riachos integra alunos com vários tipos de surdez nas suas turmas

O Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves, de Torres Novas, é o estabelecimento de ensino de referência para alunos surdos no distrito de Santarém desde 1999. O MIRANTE visitou o Centro Escolar de Riachos, onde se ensina Língua Gestual Portuguesa, e acompanhou um dia de aulas dos alunos do pré-escolar e do 1.º ciclo.

A Unidade de Apoio de Alunos Surdos (UAAS) foi criada em 1999 na Escola Básica de Riachos e foi o ponto de partida para tornar o Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves, de Torres Novas, como a referência em ensino bilíngue para crianças e jovens surdos no distrito de Santarém. Dessa equipa fundadora fez parte Adília Pedro, coordenadora de Educação Especial, que lembra a urgência de dar uma resposta adequada às necessidades educativas dos alunos surdos já existentes no concelho de Torres Novas e outros dos concelhos limítrofes.
No ano lectivo de 2024/25 frequentam o Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves 18 alunos com surdez, do pré-escolar ao 12.º ano. No Centro Escolar dos Riachos há 15 alunos surdos a aprender Língua Gestual Portuguesa e integrados em turmas do ensino pré-escolar e 1.º ciclo. Joana Neves tem 9 anos e vem todos os dias de Tomar, onde vive, para ter aulas em Riachos. Apesar de surdez moderada bilateral, está a aprender a tocar flauta transversal há mais de um ano e sente-se bastante segura a fazê-lo.
No dia em que O MIRANTE visitou a escola, Joana Neves não tem a companhia das suas colegas de turma surdas, mas nem por isso está sozinha. Na sala do 4.º ano há uma intérprete de palmo e meio, Francisca Gregório, que dá uma ajuda quando não há nenhum intérprete na sala, já que aprendeu a replicar alguns gestos de Língua Gestual Portuguesa durante as aulas. Aos 9 anos, está certa de que é a profissão que quer exercer. Na turma do 3.º ano todos têm um nome gestual, um gesto específico que se faz para identificar cada pessoa individualmente e que está relacionado com características dessa pessoa.
Rodrigo Lopes tem 6 anos e surdez profunda bilateral. O aluno do ensino pré-escolar foi sujeito à implantação de dispositivos auditivos numa idade muito precoce, o que lhe permite comunicar oralmente com colegas e educadores. Apesar disso, a aprendizagem de Língua Gestual Portuguesa é fundamental para que consiga comunicar no futuro, ressalva Maria Seixas, intérprete de Língua Gestual Portuguesa que acompanha os alunos surdos. Quando questionado sobre o que mais gosta de fazer, Rodrigo Lopes fez imediatamente o gesto de quem mexe algo dentro de uma panela: “gosto de cozinhar esparguete com carne”, acrescenta sorridente.

Escola como uma comunidade
Os alunos com surdez têm adaptações em termos de currículo e de avaliação previstos na lei. “É importante ter em conta que a primeira língua destes alunos é a Língua Gestual Portuguesa. O português é a segunda”, sublinha Maria Seixas. Por isso há também a necessidade de adaptar as estratégias de ensino, privilegiando formas mais visuais que facilitem a assimilação dos conhecimentos. Kelly Novais, docente de Educação Especial, dá o exemplo da aprendizagem da tabuada: “é muito mais fácil para os alunos se usarmos os dedos como forma de expressar os números”.
A dimensão reduzida das turmas é um factor determinante para o sucesso escolar dos alunos surdos. Em ambientes com menos ruído e maior proximidade entre alunos e professores, torna-se mais fácil promover uma relação de empatia e comunicação. O ambiente inclusivo que se vive nas salas de aula facilita a aprendizagem e impulsiona a autonomia dos alunos surdos. Maria Seixas conta que há muita entreajuda entre os alunos e os próprios ouvintes têm curiosidade em aprender os gestos para poderem comunicar com os colegas surdos.
Também os professores têm de se adaptar na exposição da matéria quando leccionam a turmas com alunos surdos. É necessário que o professor e o intérprete de Língua Gestual Portuguesa estejam bem articulados para garantir que o aluno surdo percebe o que é comunicado. “O nosso papel também é de sensibilizar o docente, principalmente aqueles que nunca leccionaram com alunos surdos”, afirma Maria Seixas.
Por se basear na expressão de conceitos em vez de palavras, a Língua Gestual Portuguesa é moldada pela criatividade e pelas necessidades comunicativas de cada indivíduo. “É uma língua viva e em constante evolução”, constata Maria Seixas. Surgem frequentemente novos gestos, muitos com origem local, resultando numa diversidade de regionalismos que enriquecem a língua mas que também exigem uma atenção contínua por parte dos intérpretes, professores e alunos. A referência a pessoas surdas como surdos-mudos é comum nos casos em que estes não tenham a capacidade de oralizar desenvolvida, mas é errada, afirma Adília Pedro. “Os surdos têm capacidade para aprender a oralizar, o que precisam é de aprender onde o som é colocado, em termos fonéticos”, explica.

Projecto “Mãos que falam, corações que ouvem” ensina Língua Gestual Portuguesa aos pais

O projecto “Mãos que falam, corações que ouvem” é uma iniciativa do Departamento da Educação Especial do Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves que surgiu da necessidade de dar resposta aos pais de crianças e jovens surdos que confidenciaram as suas frustrações e preocupações no que se refere às limitações na comunicação com os filhos. Estão à frente da iniciativa as docentes com especialização no domínio da audição e surdez, Ana Isabel Mendes e Kelly Novais, e os docentes de Língua Gestual Portuguesa (LGP), Catarina Marques e Stefan Melciu.
As sessões de sensibilização acontecem quinzenalmente às segundas-feiras, em horário pós-laboral na Escola Básica dos 2.º e 3.º com Ensino Secundário de Artur Gonçalves, em Torres Novas. “Esta sensibilização visa melhorar a comunicação entre pais e filhos, fortalecendo o vínculo afectivo e promovendo um mundo mais acessível”, sublinha a organização.

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