Na Neonatologia vibra-se a cada conquista e por cada bebé que nasce prematuro






No Hospital Distrital de Santarém, o serviço de Neonatologia é primeira casa para os bebés que nascem prematuros e para os que inspiram cuidados. A equipa que o integra faz uma vigilância apertada ao mesmo tempo que dá conforto e tenta tranquilizar os pais. O MIRANTE acompanhou uma parte do dia de trabalho da equipa de enfermagem, a propósito do Dia Internacional do Enfermeiro.
Maria Francisca e Maria Teresa decidiram nascer antes do tempo, às 33 semanas, depois de uma gestação atribulada que muitas preocupações deu à sua mãe. As gémeas prematuras são duas das hóspedes do serviço de Neonatologia do Hospital Distrital de Santarém, onde uma equipa de profissionais se dedica a cuidar os recém-nascidos que, por motivo de doença ou prematuridade, não têm alta. “O internamento de um recém-nascido nunca é idealizado pelos pais e é um factor de grande stress e insegurança. Muitos pais acabam por sair daqui mais autónomos, aprendem com os enfermeiros no tempo que passam aqui”, refere a O MIRANTE Susana Botas, enfermeira no serviço de Neonatologia há 16 anos e no Hospital de Santarém há 25 anos.
A mãe das gémeas, Marta Cardoso, de 30 anos, sabe que levar para casa duas bebés prematuras vai ser um grande desafio. Para já, grande partes dos dias são passados na Neonatologia a acompanhar as suas filhas e onde, salienta, todos os profissionais a fazem sentir-se “em casa” e a ajudam a gerir o processo com mais tranquilidade.
No serviço as tarefas diárias da equipa de profissionais passam pela manutenção e motorização dos parâmetros vitais dos bebés internados, pela alimentação, cuidados de higiene e conforto. Como seres frágeis que são, têm pouca tolerância ao ruído, à luz e ao toque e qualquer excesso cometido pode ter consequências no seu desenvolvimento. “Cada caso é um caso e cada bebé tem necessidades diferentes”, salienta a enfermeira Susana Botas, que desde cedo sentiu interesse pela neonatologia, mas decidiu começar o percurso profissional pela enfermagem de medicina para ganhar experiência.
A dedicação dos profissionais não deixa indiferentes as famílias dos bebés, que mesmo quando estes se tornam crianças e jovens continuam a enviar fotografias à equipa. “Não há dinheiro que pague isso. É o auge do nosso trabalho”, partilha Susana Botas com a voz embargada, confessando que trabalhar neste serviço torna-se duro quando algum bebé não resiste e acaba por morrer. “Lidar com a morte no final de uma vida é natural. Lidar com a morte de um recém-nascido é muito difícil”, afirma, salientado que, felizmente, são raras as mortes de recém-nascidos no Hospital de Santarém e que é “extraordinária a capacidade” que demonstram de se agarrar à vida.
Nasceram 84 bebés prematuros em Santarém em 2024
O laboratório de estudos sociais sobre o nascimento do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE), nascer.pt, aponta um aumento de quase 2% (de 5,89% para 7,51%) da taxa de nados-vivos prematuros nascidos em Portugal entre 2000 e 2021. Estes números evidenciam o aumento da prevalência da prematuridade em Portugal, tendo em conta a tendência de descida da taxa de natalidade durante o mesmo período. No caso concreto do Hospital Distrital de Santarém, nasceram 84 crianças prematuras em 2024, entre as 29 e as 36 semanas, o que se encontra dentro da média nacional. Na unidade de Neonatologia estiveram internados, em 2024, cerca de 190 recém-nascidos, onde além de outros diagnósticos se incluem os prematuros.
Joana Marques tem 41 anos e está na profissão há 19. Regressou ao serviço de Neonatologia depois de passar alguns anos na Urgência Pediátrica. Sempre trabalhou com crianças e recém-nascidos e afirma que é uma alegria que o seu dia-a-dia seja fazer parte do início de novas vidas e novas famílias. A ligação que os enfermeiros criam com as famílias que passam pelo serviço é natural, explica a enfermeira, acrescentando que cuidar de um bebé prematuro e vê-lo ganhar saúde a cada dia é algo a que não se consegue ficar indiferente. “Aqui há muita esperança, lidamos com a vida e com o futuro. Cada dia é uma nova conquista”, atira sorridente.
A enfermeira define a relação entre enfermeiros e pais como uma parceria e garante que a forma como a equipa comunica com os pais, muitos dos quais não têm qualquer experiência com recém-nascidos, é essencial para atenuar o stress e angústia de ter internado um filho que acaba de nascer. “Tudo o que se passa com os bebés os pais sabem e tentamos, tanto quanto possível, respeitar as suas expectativas e necessidades”, conclui.
Fazer muito com muito pouco
A falta de protecção que estes profissionais de saúde enfrentam é desvalorizada há demasiado tempo na opinião de Susana Botas. “Somos profissionais sem apoio que têm de dar apoio a pais com receio de perder um filho”, explica a enfermeira referindo que não existe qualquer mecanismo para os profissionais de saúde recorrerem a ajuda psicológica. A falta de recursos humanos e materiais é o que mais tira o sono a Joana Marques, que ao olhar em redor na sala de Neonatologia começa a enumerar material que devia ser renovado: “melhores monitores, melhores incubadoras, melhores ventiladores”.
Joana Marques não tem dúvidas de que a Neonatologia devia ser uma prioridade de investimento no sector da saúde, já que é onde “começa a vida e o futuro”. Para além do dia-a-dia no serviço, os profissionais têm de acompanhar a evolução da medicina e vivem num processo de constante aprendizagem para que possam dar aos bebés os cuidados mais adequados e que lhes garantam um futuro melhor. A equipa de enfermagem da Neonatologia e berçário conta com 24 enfermeiros, 11 especialistas na área de saúde infantil e pediátrica e da saúde materna e obstétrica.
