Direcção da Casa do Povo da Chamusca diz que não tem de fazer caridade

A direcção da Casa do Povo da Chamusca não quer continuar a fazer o que considera ser caridade com os moradores, uma vez que a maioria paga rendas com valores irrisórios.
Pela voz do advogado João Cardador, a direcção liderada por Maria José Calcinha diz ainda que os moradores das casas da instituição têm de pagar um valor justo de rendas e que vão ser notificados para o fazer, mesmo reconhecendo que pode haver contestação. Com cerca de 80 sócios, a direcção da Casa do Povo da Chamusca recusa aceitar como novos sócios pessoas que dizem mal da instituição.
A Casa do Povo da Chamusca, depois de ter conseguido evitar a extinção no Supremo Tribunal, após duas decisões desfavoráveis do Tribunal do Entroncamento e da Relação de Évora, vai agora dedicar-se à sua reorganização. Uma das medidas que vai tomar passa por exigir que os moradores das casas do Bairro 1º de Maio paguem o que está estipulado e que os sócios consideram justo, acabando com situações de rendeiros que pagam cêntimos mensalmente. O advogado da instituição, João Cardador, que falou com O MIRANTE em nome da direcção por estar “mais à vontade para descrever os assuntos” e por uma questão de oralidade mais eficiente, disse, com a anuência da presidente da direcção, Maria José Calcinha, presente na conversa, que a Casa do Povo não tem de fazer caridade.
Questionada directamente sobre se a direcção está preparada para a contestação que vai gerar a intenção de exigir valores de rendas mais elevados, entre os 50 e os 100 euros, consoante as tipologias e as características dos imóveis, Maria José Calcinha diz que sim. João Cardador realça que a Casa do Povo tem feito caridade e ainda por cima é atacada. O advogado explica que em 2012 a Casa do Povo decidiu actualizar as rendas com base numa legislação para situações de rendas antigas com preços muito baixos. Mas os moradores decidiram não pagar esses valores e começaram a depositar os montantes que sempre pagaram, com valores abaixo de um euro, na Caixa Geral de Depósitos, evitando assim qualquer acção de despejo. O que está previsto é que os moradores que pagam rendas com valores fixados há dezenas de anos sejam notificados para pagar os valores estipulados; se não o fizerem a Casa do Povo pode avançar para tribunal.
O advogado da Casa do Povo da Chamusca garante que podia ter feito as normais actualizações anuais das rendas e nunca o fez, sublinhando que a instituição agora vai ter de se reinventar e que não pode continuar a funcionar da mesma forma, tem de renascer das cinzas. João Cardador explicita que a instituição não pode ter prejuízo, não pode receber algumas rendas que no final do ano não chegam para pagar o IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis. E acrescenta que a Casa do Povo é dos sócios, não é do povo, realçando que os moradores que não são sócios não têm de participar das decisões. A entidade tem cerca de 80 sócios com uma quotização de um euro mensal que só alguns pagam. Os valores não dão para pagar a luz da sede. Na conversa com O MIRANTE afirmaram ainda que têm meia centena de casas arrendadas.
Falando sempre em nome da direcção, o advogado diz que a renda mais alta é de 250 euros e que é a única deste valor para as habitações, sendo que o pavilhão, onde funciona uma loja, está arrendado por 750 euros. Depois há seis rendeiros que pagam entre 20 euros e os 150 euros. Para o porta-voz da Casa do Povo, que diz que não participa nas decisões da direcção ou da assembleia-geral, e que nunca teve qualquer cargo, a instituição que representa é capaz de ser a única na Chamusca que faz a gestão de habitação social, atendendo ao valor que os moradores pagam. E explica ainda que a direcção pode vir a recuperar as casas que fiquem livres para as colocar no mercado de arrendamento, “mas nunca a preços sociais”, porque a Casa do Povo não tem nenhum dever nesse sentido a não ser para com os seus sócios.
A direcção esclarece também que qualquer pessoa pode pedir para ser associado da Casa do Povo da Chamusca e que a sua aceitação depende da decisão dos órgãos sociais conforme estabelece os estatutos. Revelou ainda que há uns três moradores que são sócios, esclarecendo depois que não são aceites pessoas que dizem mal da instituição. Questionou-se ainda porque é que alguém que diz mal, que é detractor, que faz uma guerra que causou bastantes prejuízos, quer ser associado da associação.
A direcção da Casa do Povo, sempre pela voz do seu advogado, sublinha que a contestação e as críticas de que têm sido alvo resultam de um equívoco em que os rendeiros acham que são donos das casas porque alguém lhes disse isso. Refere que há um elemento que liderou um movimento contra a instituição, que “insultou e denegriu a imagem das pessoas”, que em determinada altura quis fazer-se sócio, tendo sido o único dos contestatários a fazê-lo. Mas para a direcção “a contestação é legítima, a maledicência é que não é legítima”, refere o advogado, acrescentando que a instituição não tem nada contra as pessoas que contestam, “desde que o façam com respeito e seriedade”.
João Cardador diz que é mal pago
O advogado da Casa do Povo, João Cardador, diz que não compreende porque é odiado e confessa que se considera mal pago pelo seu trabalho.
O advogado da Chamusca, João Cardador, que representa a Casa do Povo da Chamusca, reagiu à notícia de O MIRANTE que diz que é temido e odiado no Bairro 1º de Maio e que agora quer ser presidente da Assembleia Municipal da Chamusca. Durante a conversa, o advogado manifestou a sua indignação e insatisfação em relação à notícia. Afirmou que quase faz a gestão da instituição na sua totalidade e que é no seu escritório que são atendidas as pessoas que tentaram negociar casas, saber os seus valores de venda ou o valor das rendas. João Cardador diz que isso acontece por ser mais fácil, em termos operacionais, resolver as questões no escritório onde tem mais condições do que na sede da Casa do Povo.
João Cardador disse ainda que trabalha para a Casa do Povo com uma avença que considera insuficiente para o seu trabalho e que faz o que a entidade entende e admite, por isso, será odiado por pessoas a quem teve de pedir a devolução das casas da instituição porque estavam a ocupá-las ilegalmente, ou de quem foi despejado por não pagar a renda. Considera por isso que o exercício da sua profissão não pode prejudicar a sua candidatura à assembleia municipal, conforme já anunciado.
À margem/opinião
As Casas do Povo que já não são do povo
O imbróglio sobre as casas do povo da Chamusca é notícia no nosso jornal desde há mais de duas dezenas de anos. Até hoje a direcção nunca tinha prestado declarações. A notícia de que o advogado da associação vai ser candidato nas próximas eleições autárquicas abriu caminho para uma conversa que está aqui resumida e que vai ter continuidade na próxima edição. João Cardador defendeu-se como pôde das acusações de perseguição de alguns moradores, mas ficou bem patente que a actual presidente da direcção, Maria José Calcinha, no lugar há mais de uma década, não domina a maioria dos assuntos para responder sem a ajuda do advogado. João Cardador tem toda a legitimidade para se considerar inocente nesta briga entre associação e moradores, mas não se livra de ser o “testa de ferro” de uma direcção que não pode com a carga de uma gestão e de uma contestação que nos parece justa e, mais do que justa, uma infelicidade que atingiu e vai continuar a atingir dezenas de moradores. É caso para dizer que o 25 de Abril de 1974, data da libertação do país, foi uma data “desgraçada” para quem vivia nas casas, que foram construídas pelo antigo regime para os chamusquenses mais desfavorecidos. O que se passou, entretanto, já foi escrito mas certamente ainda vai ser reescrito até que um dia esta novela tenha um fim. JAE