Sociedade | 04-06-2025 12:00

Alcoolismo combate-se um dia de cada vez nos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo

Alcoolismo combate-se um dia de cada vez nos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo
O grupo de Alcoólicos Anónimos do Cartaxo reúne semanalmente às segundasfeiras nas instalações da Cruz Vermelha no Cartaxo

O alcoolismo é uma doença crónica e o primeiro passo para a combater é admitir que se é alcoólico. O anonimato é regra de ouro nos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo, onde o importante é a mensagem e não o mensageiro.

“Cada vez que falo da minha história estou a fazer bem a mim mesmo e tenho a esperança de estar a ajudar outros que precisem de a ouvir”, começa por dizer José (nome fictício) a O MIRANTE. O anonimato dos alcoólicos é uma questão de princípio, esclarece: “o importante é a mensagem, não o mensageiro”. Dar testemunho de forma anónima é uma questão central que é seguida à risca por todos os membros dos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo. José acrescenta ainda que esse factor é também importante no processo de tratamento para que não exista a tendência para excessos de confiança que possam dar aso a recaídas. José tem 61 anos e não bebe álcool há 29 anos. O álcool entrou na sua vida quando era ainda criança porque tinha curiosidade e conta que depois de começar a trabalhar aos 15 anos a sua apetência para beber aumentou. “Bebia por qualquer motivo”, lembra José, que confessa nunca se ter preocupado em saber porque se tinha tornado alcoólico. “O importante foi ter admitido que tinha esta doença e que podia tratar-me”, afirma. Só percebeu que era alcoólico quando a sua entidade empregadora o confrontou com o problema e o incentivou a fazer desintoxicação, quando já tinha mais de 30 anos. Foi aí que deu conta que o álcool o tinha destruído e que precisava de ajuda. Os testemunhos que escutou foram essenciais para encarar o problema e essa mudança de atitude ajudou-o a controlar a vontade de beber.
Depois da desintoxicação, as reuniões dos Alcoólicos Anónimos foram um pilar para que se mantivesse sóbrio. “Quando entrei numa sala de Alcoólicos Anónimos e ouvi as partilhas de companheiros, senti uma vontade imensa de escrever a minha história de superação”, revela o homem que viveu em Lisboa e trabalhou na mesma empresa praticamente toda a vida, onde desempenhou várias funções. “Fui julgado enquanto bebia e o álcool também me fazia odiar aqueles que me julgavam”, partilha enquanto explica que ganhar a confiança e o respeito das pessoas que o rodeavam depois de deixar de beber foi um processo muito longo. Hoje, já reformado, recorda com clareza a forma como ter superado o alcoolismo o ajudou a ganhar gosto no trabalho e nas relações. José mudou-se para Santarém em 2019 e desde então que frequenta as reuniões de Alcoólicos Anónimos do Cartaxo, onde o seu objectivo primordial é manter-se sóbrio e ajudar outros alcoólicos a alcançar a sobriedade, vinca.

“Se não fosse a minha mulher, estaria ou preso ou morto”
Válter (nome fictício) tem 38 anos e começou a beber muito novo de forma social. A regularidade com que consumia álcool aumentou ao longo dos anos até que começou a sentir necessidade de beber todos os dias para se sentir bem. O seu primeiro casamento não resistiu à adição de Válter, que aproveitava qualquer oportunidade para sair de casa para se “agarrar” ao álcool. A segunda mulher tem sido o grande alicerce da sua recuperação e foi já durante o segundo casamento que foi internado, com 32 anos. “Se não fosse a minha mulher, estaria ou preso ou morto”, garante Válter, lembrando a persistência da mulher para que se conseguisse manter sóbrio. Teve uma recaída 10 anos depois da desintoxicação, quando decidiu voltar a beber socialmente por achar que conseguia controlar o consumo. “Em pouco tempo dei cabo de 10 anos de sobriedade e foi uma descida a pique para o fundo do poço”, admite Válter. Se houve tempos em que bebia porque sentia prazer, os piores tempos foram aqueles em que nem sóbrio nem alcoolizado se sentia bem. Foi a partir do momento que descobriu a existência dos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo e percebeu que havia um caminho que podia percorrer junto de pessoas com experiências como a sua. A partilha de vivências entre alcoólicos é um reavivar de memória importante, explica Válter, garantindo que a melhor ajuda que tem para não beber é manter, para sempre, contacto com alcoólicos. “É bom lembrar-me constantemente do fundo do poço onde estive e para onde não quero voltar”, afirma com convicção.

Alcoólicos Anónimos do Cartaxo têm as portas abertas a todos

Na tarde de 19 de Maio não chegavam as cadeiras para receber toda a gente que foi até à Cruz Vermelha para a reunião aberta à comunidade dos Alcoólicos Anónimos do Cartaxo, no âmbito da Semana da Saúde e Bem-Estar, promovida pelo município. Entre a azáfama de trazer mais cadeiras são muitos os beijos e abraços calorosos trocados entre aqueles para quem este espaço é um lugar de pertença e partilha. A reunião é aberta à comunidade e apesar de muitas pessoas não habituais, ninguém se sente como um estranho e todos são recebidos com um sorriso na cara. O grupo de Alcoólicos Anónimos do Cartaxo (AAC) foi criado há cerca de 13 anos, depois do grupo de Santarém ter fechado portas, e desde então já ajudou a mudar dezenas de vidas. Actualmente tem seis membros que participam nas reuniões semanais realizadas às segundas-feiras. O grupo, sempre que pode, promove sessões abertas à comunidade para tentar chegar a mais pessoas que precisem de ajuda e não sabem onde a encontrar.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1719
    04-06-2025
    Capa Médio Tejo
    Edição nº 1719
    04-06-2025
    Capa Lezíria Tejo
    Edição nº 1719
    04-06-2025
    Capa Vale Tejo