Comércio tradicional continua a dar vida ao centro histórico de Tomar

No centro histórico de Tomar resistem negócios e lojas familiares que atravessam gerações. Desde o sapateiro, às lojas de artesanato e retrosarias, com décadas de histórias para contar. O MIRANTE foi à descoberta de alguns dos negócios mais antigos da cidade.
O centro histórico de Tomar é um verdadeiro testemunho vivo da história e da tradição. Entre ruas estreitas e edifícios carregados de memórias, resistem negócios e lojas familiares que atravessam gerações, preservando saberes e costumes que fazem parte da identidade da cidade. Num tempo de mudança, com novos negócios a surgirem e o crescimento das grandes superfícies, estes estabelecimentos mantêm-se firmes, preservando o que os torna únicos. Entrar nestes espaços é viajar no tempo, desde o sapateiro, às lojas de artesanato e retrosarias com décadas de histórias para contar. O MIRANTE foi à descoberta de alguns dos negócios mais antigos do centro histórico de Tomar, procurando conhecer as histórias de vida de quem mantém as portas abertas há muitos anos.
Na Rua Infantaria 15, próximo do Cine-Teatro Paraíso, encontra-se a loja de artesanato diverso “Memórias da avozinha”. Maria da Piedade Costa, 85 anos, é quem está à frente do negócio. Abriu a sua primeira loja de artesanato em Tomar em 1989. Em 2007 abriu outra loja, mas depois como o negócio não tinha clientes, decidiu ir para casa. Há 12 anos, os seus filhos avançaram com a compra do prédio onde mora e trabalha hoje em dia. Antes de se aventurar nas lojas de artesanato, Maria da Piedade Costa vendia nas feiras, em Torres Novas, Entroncamento e em Tomar. Também esteve emigrada em França, durante 13 anos, onde trabalhou como empregada de limpeza em escritórios. “A minha vida foi toda a trabalhar e criei quatro filhos”, conta orgulhosa.
A artesã nasceu em Porto de Mendo, depois foi para Delongo, onde casou, acabando por ir morar para Tomar porque já tinha lojas na cidade. Faz diversas peças de artesanato e costura, dedicando-se também a fazer os famosos tabuleiros da emblemática Festa dos Tabuleiros. A nível do negócio, refere que está mau, chegando a ter semanas onde não aparece um único cliente. “Tinha muitos clientes fiéis que já faleceram, as pessoas vão envelhecendo”, diz. Assume que quer continuar com o negócio porque está entretida e porque faz realmente o que gosta.
Um acidente mudou-lhes a vida
Não muito longe, próximo da Praça da República, na Rua Serpa Pinto, conhecida por Corredoura, está a retrosaria Carrão e Ferreira. A loja, gerida por Maria de Lurdes Carrão, 70 anos, soma já 42 anos de existência. A gerente explica que era emigrante na Alemanha com o marido e numa viagem de férias a Portugal tiveram um acidente que lhes mudou a vida, tendo assim surgido o negócio da retrosaria. Maria de Lurdes Carrão trabalhava como empregada em casa de uma família alemã, onde esteve sete anos. O acidente aconteceu em Espanha, num dia de chuva, em que óleo na estrada provocou o despiste do carro onde circulava com o marido. Embora ninguém tenha ficado ferido, o prejuízo foi enorme.
Maria de Lurdes Carrão decidiu juntar-se ao irmão, que já trabalhava numa loja em Tomar, e ao marido, e juntos abriram a retrosaria onde ainda hoje trabalha. A nível de evolução do negócio, afirma que está cada vez pior, com menos clientes. “Houve aí umas lojas novas que apareceram que nos vieram roubar clientes”, lamenta. Relativamente ao aumento de turistas na cidade, diz que muitos não compram, apontando a impossibilidade de levarem muita bagagem no avião como principal causa. Uma das particularidades da loja é que tudo o que é vendido vem de fábricas portuguesas, como pijamas e camisolas interiores.
Tornou-se sapateiro depois de aprender com o avô
Em frente à Levada de Tomar, na Rua João Carlos Everard, trabalha o sapateiro Carlos Louro, 54 anos. A sua loja Templar Solas soma já 17 anos de existência. Carlos Louro conta que já trabalhava como sapateiro há muitos anos nas horas vagas e que um dia, por brincadeira, disse que se arranjasse um espaço em Tomar, num sítio com passagem de pessoas, montava um negócio. E assim foi. Empregado comercial numa empresa de rolamentos, decidiu que estava farto de trabalhar para patrões e que estava na altura de abrir um negócio seu.
Carlos Louro explica que aprendeu a arranjar sapatos com um avô. “Em criança, ia visitar o meu avô, ele fazia os serviços em casa. Ia vendo e ele ia-me ensinando, foi assim que fui aprendendo”, refere. No que a clientes diz respeito, considera que tem mantido mais ou menos os mesmos, apontando um ligeiro aumento para a altura do Verão, devido aos emigrantes. A loja faz reparações de calçado, de artigos de vestuário, peles, entre outras coisas.
Há 17 anos com as portas abertas, Carlos Louro guarda algumas histórias engraçadas. “Houve uma senhora de idade que veio cá uma vez colocar uns sapatos a arranjar, quando os veio buscar calçou os sapatos ao contrário e saiu daqui toda feliz, já se passaram cá casos engraçados”, diz bem-disposto. O sapateiro de 54 anos, natural do Entroncamento, tem um filho e é casado com uma tomarense. Assume que pretende continuar com o negócio até à reforma.