Sociedade | 31-08-2025 07:00

As histórias de vida que dão corpo e alma à Alpiagra

As histórias de vida que dão corpo e alma à Alpiagra
Idília Basílio, Humberto Cabral, Lizete Rocha e Wenceslau Soares - fotos O MIRANTE

A 43ª edição de Alpiagra é um ponto de encontro entre tradição e inovação, onde produtores e artesãos partilharam com O MIRANTE histórias de vida e paixões através do vinho, do artesanato e da sustentabilidade.

Alpiagra volta a encher Alpiarça de música, produtos regionais, artesanato e sabores que dão identidade ao Ribatejo. Mais do que uma feira, o certame é também palco de histórias pessoais e colectivas, onde artes e ofícios ancestrais e a resiliência se cruzam com a criatividade e a inovação. Logo à entrada do Pavilhão da Terra Cultura e Sabores, sobressai a banca de Humberto Cabral, produtor dos vinhos “Canto do Marquês”. Participante na feira há oito anos, o produtor afirma que o certame é essencial para promover o seu negócio e também para a promoção da agricultura local. A sua ligação à vinha é de infância, mas é nos tempos livres que cuida actualmente de 20 hectares de terreno, enquanto mantém a profissão de mecânico. O produtor acredita que a autenticidade é o que distingue os seus vinhos e destaca os solos férteis como a principal vantagem dos produtos de Alpiarça. No entanto, reconhece que a área enfrenta desafios, afirmando que o sector do vinho vive de ciclos e actualmente atravessa um momento menos favorável. Ainda assim, acredita que dentro de cinco a sete anos o mercado voltará a estar em alta.
No outro extremo do recinto, vê-se a banca “Thomar Criativo” de Idília Basílio, de 58 anos, que regressou à Alpiagra após quase 20 anos de ausência. “Colegas artesãos disseram que a feira estava muito boa actualmente e de facto noto uma evolução grande na organização e no aproveitamento do espaço”, salienta a artesã de Tomar. Após anos em que teve o artesanato apenas como passatempo, hoje dedica-se a tempo inteiro à actividade, combinando peças turísticas com criações mais íntimas, como bonecas de trapo, que são a sua imagem de marca.
“As pessoas gostam tanto das bonecas que às vezes não as querem comprar aos filhos, por medo que se estraguem”, destaca entre risos. Inspirada desde cedo por familiares e vizinhas, começou a criar bonecas porque em criança teve poucas e tinha habilidade para trabalhos manuais. A sua persistência faz com que esteja no mundo do artesanato e das feiras desde os 19 anos.
Já para Lizete Rocha, de 72 anos, o artesanato foi mais do que uma escolha criativa, foi um caminho de superação. Diagnosticada com fibromialgia e após enfrentar a dor da perda de um filho, encontrou no artesanato um refúgio. “Entrei neste mundo como uma forma de não me perder no sofrimento e para me abstrair”, confessa a artesã de Santarém. Há mais de uma década que transforma materiais descartados – plásticos, cartões ou rolos de papel – em objectos decorativos e utilitários, sempre higienizados e reaproveitados, como caixas, molduras, vasos e malas. Na sua primeira participação na Alpiagra, traz o seu espírito ecológico até ao público, que afirma ser muito receptivo da originalidade e sustentabilidade dos seus produtos.

O artesanato como escape mental
A entrada de Wenceslau Soares, de 61 anos, no artesanato também foi inesperada, quase forçada pelas circunstâncias da vida. Ex-empreiteiro da construção, deixou a actividade para se dedicar ao cuidado do filho autista. A exigência emocional dessa responsabilidade fê-lo procurar uma forma de escapar ao peso do quotidiano. “Foi uma maneira de não dar em maluco. Comecei a fazer peças e elas começaram a amontoar-se, até que a minha mãe disse-me para ir vender às feiras”, conta o artesão de Marinhais.
Quatro anos depois, o seu trabalho alia tecnologia e tradição ao criar peças em madeira trabalhada a laser e também em 3D, explicando o artesão que o laser e a impressora são apenas ferramentas, estando o verdadeiro valor dos produtos nas suas mãos, que lixam, colam, montam e envernizam até dar forma ao objecto final. Também através de recomendações de amigos, Wenceslau Soares participa pela primeira vez na feira e afirma que Alpiagra foi uma boa surpresa, devido às taxas razoáveis pedidas, ao contrário de outros municípios e comissões de festas que “cobram taxas elevadas aos artesãos, sem valorizarem o seu papel”. “Nós somos a montra das festas. Sem artesãos, o que resta? Música, bebida e pouco mais”, explica, deixando o alerta de que muitos eventos afastam artesãos por não reconhecerem o valor que trazem às comunidades.

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