Universidade de Évora debateu liberdade de Imprensa em jornada sobre o impacto europeu na lei
Évora recebeu juízes, advogados e académicos para debater questões relacionadas com a Justiça e as leis nacionais e europeias. Em debate mais aceso estiveram questões relacionadas com a liberdade de imprensa.
“Jornadas a Sul do Direito Civil e processual Civil” foi o título das IV jornadas que se realizaram na Universidade de Évora, nos dias 10 e 11 de Outubro cujo tema central foi "Entre Luxemburgo e Estrasburgo - O impacto Europeu na Lei e na Jurisprudência portuguesas".
O evento foi promovido pelo Tribunal da Relação de Évora, pela ordem dos Advogados, Associação Sindical dos Juízes Portugueses. A coordenação foi da responsabilidade de Sandra dos Reis Luís, autora do projecto Jornadas a Sul.
O evento constitui um espaço privilegiado de reflexão, debate e actualização reunindo profissionais e todos os interessados na área do Direito com enfoque na articulação entre a prática e o conhecimento académico.
Durante o dia o tema central, debatido várias vezes, focou a importância do direito interno, do direito do Tribunal de Justiça Europeu e do Tribunal dos Direitos Humanos.
Maria José Costeira, juíza do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que tem sede no Luxemburgo, e interpreta o Direito da União Europeia, salientou que "em muitos casos a intervenção do Tribunal parece quase inexistente porque as pessoas não são condenadas, e não há interesse jornalístico porque os assuntos não geram notícias", mas alertou para a importância do trabalho. Salientou também que "não podemos culpar os juízes que não aplicam as leis sem culpar os advogados que não a suscitam". Maria José Costeira defendeu ainda mais formação para os advogados na sede da sua própria ordem, assim como para os académicos, e disse que os juízes têm um papel fundamental para com os compromissos jurídicos. "O papel dos tribunais é ter a certeza que a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (UE) é aplicada, porque se for estão a proteger os direitos fundamentais".
"Os tribunais são a última esperança das pessoas e já não é em todos os Estados"
Ainda durante o painel da manhã do dia 10 de Outubro, interveio a juíza do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH, focando a sua intervenção no diálogo entre o TEDH e os tribunais nacionais no domínios dos direitos humanos. Ana Maria Guerra Martins defendeu que os juízes sociais e os juízes dos tribunais europeus têm que estar unidos. "Os tribunais são a última esperança das pessoas e já não é em todos os Estados", afirmou.
Um dos seus temas mais caros é a Liberdade de Expressão e a Liberdade de Imprensa. Dirigiu-se várias vezes aos juízes sensibilizando-os para o facto de os juízes, habitualmente, olharem mais para a difamação e não olharem tanto para a liberdade de expressão.
"Entre o direito à privacidade de uma pessoa individual, e a liberdade de expressão de um órgão de comunicação social, de um político ou de outros, a liberdade de expressão é um elemento fundamental em qualquer democracia, e o jornalismo, se for de referência, tem que merecer uma jurisprudência defensora", afirmou.
Depois de referir vários casos em que o TEDH esteve sempre do lado do direito a informar, reconheceu que muitas vezes não se faz justiça porque os casos não chegam ao TEDH, dando a entender que, nalguns casos, é uma falha da sociedade civil. As medidas penais contra infracções que tenham a ver com a liberdade de expressão só em situações excepcionais é que são aceites pelo Tribunal dos Direitos do Homem", salientou.
Aplicação do Direito não pode ser desassociada da humanidade dos juízes
Albertina Pedroso, presidente do Tribunal da Relação de Évora, salientou a importância da formação contínua de juízes, procuradores e advogados, de forma a poderem responder aos desafios da aplicação correcta e eficaz do direito da União Europeia que "exige a necessária preparação técnica de todos os profissionais da justiça, que devem ter a melhor formação possível, de modo a manusearem os instrumentos de direito europeu com a mesma agilidade com que alcançam o melhor enquadramento do caso concreto quando está em causa apenas a aplicação do direito nacional. Esta necessidade é especialmente premente se pensarmos nos casos de processos transfronteiriços, que pressupõem a existência de uma formação adequada dos profissionais de todos os Estados Membros, de modo a promover a confiança mútua na aplicação ao caso concreto dos valores e princípios do direito europeu.
Subjacente à entusiástica adesão do Tribunal da Relação de Évora a esta iniciativa, esteve presente a noção de que, para muitos de nós, o vasto direito da União Europeia e dos seus variados e importantes instrumentos de protecção dos direitos humanos, ainda não está tão presente no nosso dia-a-dia, como a nossa integração na União Europeia impõe.
Mas, tendo presente que ainda estes desafios não estão superados e outros, novos, emergem a uma velocidade difícil de acompanhar, não quisemos que ficassem ausentes destas Jornadas as novas interpelações que a entrada da Inteligência Artificial no nosso quotidiano vem colocar, convidando, não só à necessária reflexão sobre a regulação - que se impõe - da respectiva aplicação à actividade dos Tribunais, mas também e especialmente sobre a dimensão ética dessa aplicação".
Por fim apelou para a "utilização inteligente da IA na justiça, aproveitando as suas virtualidades na parte em que facilitam o trabalho do dia-a-dia, criando a necessária regulação à transparência da sua utilização nas peças processuais e assumindo, sem tibieza, que a aplicação do direito ao caso concreto não pode ser dissociada da nossa humanidade, pois só ela permite levar aos cidadãos que servimos uma Justiça efectiva".


