Sociedade | 03-11-2025 10:00

Gaguez afecta 100 mil pessoas em Portugal e continua envolta em mitos e preconceitos

Gaguez afecta 100 mil pessoas em Portugal e continua envolta em mitos e preconceitos
Terapeuta da fala Rita Fróis defende uma abordagem humana e informada para apoiar crianças e adultos que gaguejam - foto O MIRANTE

A gaguez pode surgir na infância e prolongar-se pela vida adulta, variando com o stress e o contexto emocional. Apesar de não existir cura, a terapia da fala ajuda a melhorar a fluência e a confiança. A propósito do Dia Internacional de Consciencialização para a Gaguez, que se assinalou a 22 de Outubro, O MIRANTE falou com Rita Fróis, terapeuta da fala, que desmistifica preconceitos e explica o papel da intervenção precoce.

Cerca de 1% da população mundial gagueja, o que corresponde a mais de 70 milhões de pessoas em todo o Mundo. Em Portugal, estima-se que existam cerca de 100 mil gagos, sendo mais comum em homens do que em mulheres, com uma proporção de cerca de quatro para um na idade adulta. Entre 5% e 8% das crianças em idade pré-escolar desenvolvem uma perturbação da fluência, conhecida por gaguez. “A gaguez é uma perturbação do neurodesenvolvimento. Pode ter factores genéticos, motores, neurológicos, linguísticos, emocionais e temperamentais. Existem um milhão de questões que podem afectar a nossa fala”, explica a terapeuta da fala Rita Fróis, de Santarém.
Para ser diagnosticado com gaguez, é necessário apresentar sintomas durante, pelo menos, seis meses, com um discurso caracterizado por repetições, prolongamentos, pausas inesperadas e bloqueios em que o som da fala é interrompido. Rita Fróis sublinha ainda que pode surgir tensão corporal para forçar as palavras a sair, bem como movimentos faciais ou o acto de cerrar as mãos.

Alguns gagos evitam exposição social
O diagnóstico de gaguez é geralmente feito entre os dois e os seis anos. Rita Fróis explica que, nestas idades, o incómodo é sentido sobretudo pelos pais e professores, que acabam por sugerir a consulta com um terapeuta da fala. “A terapia é necessária especialmente quando existe tendência para evitar falar, conviver socialmente, participar nas actividades da turma, fazer apresentações ou conversar com os colegas. Mas o gaguejar não tem questões cognitivas associadas”, refere.
A gaguez pode acompanhar a pessoa ao longo da vida e manifestar-se de forma variável consoante as etapas por que passa. Em períodos de maior stress ou agitação emocional, pode tornar-se mais evidente, enquanto em fases estáveis tende a atenuar-se. “Há quem evite seguir determinadas profissões, não por limitações cognitivas, mas por não se sentir confortável. A terapia da fala também pode ter bons resultados nos adultos. Uma estratégia, por vezes utilizada por oradores públicos, é adoptar uma fala com cadência mais cantada, pois há evidências de que isso ajuda efectivamente a aumentar a fluência”, acrescenta a terapeuta.

Mitos associados à gaguez
A Associação Portuguesa de Gagos lembra que não existem curas milagrosas para a gaguez. Terapias, instrumentos electrónicos ou medicação não resolvem o problema de um momento para o outro. No entanto, um terapeuta da fala com experiência pode ensinar métodos e técnicas que fazem toda a diferença na produção de um discurso mais fluente.
E será possível ficar gago em qualquer altura da vida? Rita Fróis afirma que não é comum, mas pode acontecer após um trauma ou acidente. Existem ainda muitos mitos associados à gaguez, como acreditar que alguém pode ficar gago depois de um susto, ou que os gagos são menos inteligentes, mais tímidos ou que quem gagueja está a mentir. Outro mito, refere a terapeuta, é o de que a gaguez “se pega” apenas por se conviver com uma pessoa que gagueja, quando na realidade há um forte factor genético. Os pais podem não gaguejar e o filho ter essa condição, podendo haver casos na família, como primos, tios ou avós, com perturbação da fluência.

Como agir perante uma pessoa que gagueja

Existem comportamentos que devemos evitar quando interagimos com uma pessoa que gagueja, como interrompê-la ou completar-lhe as palavras e frases. Rita Fróis refere que a melhor atitude é deixá-la concluir os seus pensamentos, sem a ridicularizar (nem directamente, nem pelas costas), e fazer apenas uma pergunta de cada vez. “Não devemos assumir que se trata de nervosismo ou timidez, nem pedir para respirarem fundo ou se acalmarem antes de acabar de falar”, alerta a terapeuta.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal