Há mais professores a adiar a reforma, mas medida não é vista como tábua de salvação
Quase mil professores adiaram este ano a reforma e continuam a dar aulas, recebendo mais 750 euros por isso. Na região há quem o tenha feito, mas o motivo não foi o prémio salarial. Directores de agrupamentos nos concelhos de VFX, Santarém, Tomar e Mação consideram que a medida até pode ajudar, mas não é estruturante para fazer face aos problemas de uma profissão que deixou de ser atractiva.
No Agrupamento de Escolas (AE) Templários, em Tomar, dois docentes que podiam estar aposentados continuam a leccionar as suas disciplinas, Economia e Matemática. Em Castanheira do Ribatejo, concelho de Vila Franca de Xira, no AE Dom António de Ataíde, regista-se o caso de um professor de Educação Tecnológica e, em Santarém, no AE Alexandre Herculano, uma professora que lecciona Português a duas turmas de 3º ciclo optou por adiar a reforma até ao final do corrente ano lectivo. Os exemplos mostram que há na região professores a atrasar a ida para a reforma, mas, segundo os directores escolares, continuam a ser uma ínfima parte os que o fazem, mesmo depois de o Governo ter anunciado um suplemento salarial de 750 euros brutos para estimular os docentes a continuarem nas escolas.
“Os professores estão cansados, os alunos difíceis e a idade já não ajuda. A bonificação não é o ónus da questão, não é uma medida central”, diz a O MIRANTE a directora do AE Alexandre Herculano, Margarida da Franca, considerando que embora a medida possa fazer a diferença nalguns casos “não é massiva” nem se vai reflectir em todas as escolas de um país onde a falta de professores continua a ser um problema crónico.
No agrupamento que dirige, Margarida da Franca explica que a única professora que decidiu adiar a reforma o vai fazer apenas até ao final deste ano lectivo, para não prejudicar os alunos. E esta é, na sua opinião, a razão mais válida. “Continuar pelo dinheiro não é nem pode ser a motivação certa. Além disso, esses professores estão no último escalão, ganham bem”, refere Margarida da Franca, considerando que nem todos os professores em idade de reforma estarão em condições de continuar a leccionar. E os que decidem fazê-lo, defende, “deviam ser alvo de concordância, ou não, das escolas” para evitar casos em que se adia a reforma e depois se mete baixa médica.
Quem continua não o faz pelo dinheiro
A directora do AE de Castanheira do Ribatejo, Paula Gonçalves, entende que o que leva os professores a adiar a reforma “não é a parte remuneratória” mas a “vontade de continuar, porque ainda se sentem capazes e acham que ainda têm alguma coisa a dar aos seus alunos”. Até porque se fosse pelo dinheiro, acrescenta, “teríamos muitos a querer voltar”, uma vez que lhes foi dada essa possibilidade como medida para combater a falta de professores.
No mesmo sentido, o director do AE dos Templários, Paulo Macedo, acredita que os que voltam, o fazem perante a necessidade que existe em algumas disciplinas mais carenciadas e por considerarem ainda ter condições para leccionar.
Em Mação, no AE Verde Horizonte, nenhum professor que tenha atingido a idade da reforma optou por continuar a leccionar. E isso é o mais “normal”, na opinião da directora Rufina Costa. “Todos fizeram o melhor que podiam ao longo da sua carreira e agora também querem usufruir do que não tiveram tempo de fazer”. Sobre a bonificação extra, a directora considera que “não é de todo uma medida estruturante, nem é uma medida a longo prazo”. Entende que “é mais um paliativo do que propriamente um resolver de uma forma plena a situação”, ressalvando que há, apesar disso, professores muito válidos para continuar a dar aulas e que são uma mais-valia para o ensino e os alunos se tiverem vontade e se quiserem manter na escola.
Valorização da profissão é fundamental para atrair novos docentes
Para os quatro directores escolares, os incentivos existentes para que os professores continuem a leccionar não são suficientes para fazer face à falta de professores nas escolas. “No meu caso tenho perto de 320 docentes e só tenho dois casos de professores que adiaram a reforma. Acho que é muito pouco para as necessidades”, afirma Paulo Macedo, sublinhando, por outro lado, que devem começar a ser criadas condições mais atractivas na profissão para que haja jovens a escolher a via da docência.
“O caminho de facto tem que passar pela valorização da profissão”, defende Paula Gonçalves, fazendo notar que a actual crise na habitação, devido aos preços “exorbitantes” das rendas, está a reflectir-se nos concursos para a colocação de professores. “Se antes concorriam para o país todo, agora não concorrem porque com as casas ao preço que estão iriam pagar para trabalhar”, afirma, acrescentando que também não é de todo benéfico os professores terem de andar de mochila às costas, ficando ausentes das suas famílias a semana toda. “Há toda uma conjuntura que se foi criando e desgastando”, diz. Margarida da Franca acrescenta: “a sociedade civil precisa de dar valor aos professores” para que a profissão volte a ser atractiva para os jovens”.
Quase mil professores adiaram este ano a reforma
Quase mil professores adiaram este ano a reforma e continuam a dar aulas, recebendo por isso 750 euros mensais, revelou no final de Outubro o ministro da Educação, no debate parlamentar sobre o Orçamento do Estado para 2026 que prevê 24,3 milhões para docentes que fiquem nas escolas. No passado ano lectivo, esta medida permitiu manter cerca de 150 professores nas escolas.
Admitindo que a falta de professores no ensino obrigatório continua a ser o principal problema do seu ministério, Fernando Alexandre lembrou algumas medidas levadas a cabo, como o apoio aos docentes deslocados ou o concurso extraordinário para colocar docentes nas escolas onde há mais alunos sem aulas. A 15 de Outubro deste ano ainda havia cerca de mil horários por preencher nas escolas, segundo o ministro.


