Ex-autarca arrisca condenação por publicidade institucional em período eleitoral
Tribunal de Vila Franca de Xira condenou ex-presidente da Junta de Freguesia de Arranhó ao pagamento de uma multa de 15 mil euros, mas agora o Supremo Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso e ordenou a remessa dos autos novamente ao tribunal de origem, por considerar que podem ter existido nulidades processuais.
O ex-presidente da Junta de Freguesia de Arranhó, Nuno Rodrigues (PSD), que não se recandidatou ao cargo nas autárquicas de 2021, foi condenado em primeira instância, na justiça, ao pagamento de uma coima de 15 mil euros pela prática de publicidade institucional durante o período eleitoral.
No primeiro recurso, o Ministério Público pronunciou-se pela total improcedência da pretensão do antigo autarca, defendendo a manutenção integral da decisão recorrida. No entanto, o Procurador-Geral Adjunto suscitou duas nulidades processuais que vieram agora a ser reconhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, que voltou a remeter os factos à primeira instância. Em causa estão a alegada falta de promoção do Ministério Público após a participação da Comissão Nacional de Eleições (CNE) e o incumprimento do direito de audição previsto no artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações.
A sentença, proferida a 25 de Outubro de 2025 pelo Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira, deu como provado que, já depois da marcação oficial das eleições autárquicas de 2021, foram publicadas na página oficial da junta de freguesia no Facebook duas mensagens divulgando obras, intervenções e inaugurações, acompanhadas de fotografias do então autarca, que ainda estão online à data da publicação desta notícia de O MIRANTE.
De acordo com o tribunal, as publicações constituíam “publicidade institucional” proibida pela lei, que veda a divulgação de actos, programas, obras ou serviços por entidades públicas após a convocação eleitoral, salvo necessidade pública grave e urgente, circunstância que, segundo o acórdão, não se verificou.
Inconformado, o ex-autarca recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça defendendo que as publicações não tinham intenção promocional nem produziram qualquer benefício político directo, sublinhando que não era candidato à reeleição (viria a ganhar o PS nessas autárquicas). Argumentou também que as publicações visavam agradecer uma doação feita à freguesia e divulgar pequenos trabalhos concluídos após atrasos causados pela pandemia.
Autarca alega desconhecimento
Numa das publicações, de Agosto de 2021, lia-se que “por motivos imprevistos, só agora foi possível à junta de freguesia retomar a obra de beneficiação do seu novo armazém, situado junto ao cemitério de Arranhó. Aqui fica desde já o nosso enorme agradecimento e apreço, em nome de todos (…) que tiveram a gentileza de doar este imóvel à freguesia”. A publicação referia-se ainda a outras pequenas obras “em fase de conclusão”. Uma outra publicação, em Setembro de 2021, foi também considerada pelo tribunal. Aludia ao pavilhão polivalente de Arranhó e à doação de um imóvel feito por uma família da terra, a quem o autarca agradeceu publicamente.
Entendeu o Ministério Público que o ex-autarca, apesar de ter apenas a quarta classe, enquanto presidente da junta à data dos factos, tinha a obrigação de conhecer e cumprir com as obrigações legais quanto à proibição da publicidade institucional de actos, programas, obras e serviços da junta a partir da publicação a 7 de Julho de 2021 do decreto que marcou a data da eleição.
A sentença de primeira instância considerou que as publicações tinham inequívoco carácter promocional, destacando as expressões utilizadas e a exibição do presidente da junta em actos relacionados com obras e inaugurações. O tribunal entendeu que, enquanto autarca experiente, o arguido tinha a obrigação de conhecer a proibição legal, concluindo que agiu com consciência da ilicitude.
O ex-autarca defendeu-se em tribunal dizendo ter actuado em erro sobre a proibição, acreditando que apenas os candidatos estavam impedidos de efectuar publicações e disse não ter consciência da ilicitude da conduta, dada “a sua simplicidade” e o facto de possuir apenas o 4º ano de escolaridade.


