Devoção a Sousa Martins está a perder fiéis em Alhandra
Pela primeira vez a comunidade pode ver algumas das ofertas feitas ao médico com fama de milagreiro – excepto as jóias, por motivos de segurança – numa exposição na Galeria Augusto Bértolo, em Alhandra. Oferendas e devotos estão a diminuir.
Há cada vez menos fiéis devotos ao médico com fama de milagreiro Sousa Martins e um espelho disso é a redução das ofertas que ficam à guarda da junta de freguesia. As peregrinações têm cada vez menos gente e os tempos estão a mudar. A reflexão veio a lume durante a inauguração de uma exposição destinada a mostrar algumas das oferendas que foram sendo entregues ao longo dos anos pelos fiéis.
Com o passar dos anos as gerações que eram devotas a Sousa Martins começam a desaparecer e as gerações seguintes começam a não estar tão envolvidas com a história e até mesmo com a religião. No entanto, continua a haver senhoras de idade que se deslocam diariamente ao museu somente para rezar ao doutor, contam a O MIRANTE as técnicas Elsa Ribeiro e Rute Simões, do Museu Municipal de Vila Franca de Xira.
A exposição “Devoção”, promovida pela União de Freguesias de Alhandra, São João dos Montes e Calhandriz, está patente na Galeria Augusto Bértolo, na Casa Dr. Sousa Martins, em Alhandra, até 28 de Agosto e traz a público, pela primeira vez, algumas das mais de 500 oferendas em homenagem a José Tomás de Sousa Martins, figura incontornável da medicina nacional e da história de Alhandra, onde nasceu e faleceu.
De um universo de mais de 500 artigos, as técnicas municipais construíram uma exposição com um pouco de tudo: vestidos de noiva, colchas, trajes de primeiras comunhões, roupas de bebé, uma capa académica e vários elementos artísticos, como quadros ou esculturas. Fora da exposição ficaram as jóias por questões de segurança, apesar de todas elas estarem a passar em diapositivos num ecrã na sala.
O presidente da junta de freguesia, Mário Cantiga, que no passado gerou polémica quando defendeu que a junta vendesse o espólio de ouro doado em pagamento de promessas para gerar receita que pudesse ser reinvestida em prol da comunidade, garante agora que nenhuma peça acabou por ser vendida e todas ficaram guardadas e inventariadas em cofre. “Permanecerão para sempre nesse cofre”, garante. Ainda assim, a quantidade de peças de ouro é residual.
O autarca defendeu, durante a inauguração da exposição, que o Museu Municipal Casa Dr. Sousa Martins se tornasse fiscalmente uma entidade individual. “Sinto que seria melhor para todos se fosse criada uma associação dedicada a este museu, para que todo o dinheiro e oferendas ficasse registado em título próprio do museu, para que tudo seja ainda mais transparente”, defende. Actualmente, o dinheiro oferecido encontra-se numa conta bancárias de onde só sai verba para obras de restauro do próprio museu.
Alhandra não quer turismo religioso
O autarca, apesar de reconhecer que a vila de Alhandra tem dois picos de turismo religioso dedicado ao médico, a 7 de Março e 18 de Agosto, datas do seu nascimento e morte, não tem qualquer vontade de tirar proveito desses momentos. “O Dr. Sousa Martins tem família. Tudo o que é feito por nós tem o conhecimento deles e trabalhamos em parceria para que tudo seja sempre de acordo com a sua vontade. Abomino a ideia de ter pessoas a vender roupa ou objectos com a cara do doutor sem dar o devido conhecimento à família. A vila de Alhandra orgulha-se do médico e da sua história, mas longe de nós criarmos aqui um ponto de turismo religioso com o intuito de tirarmos proveito financeiro disso”, explica.
José Tomás de Sousa Martins é uma figura incontornável da história da medicina, mas sobretudo “um filho amado pela sua terra”, conta Mário Cantiga. Para o autarca, a figura do médico é uma imagem de dedicação e esforço, preferindo olhá-lo enquanto mestre na sua arte científica e não tanto como possível santo laico. “Não sou eu que vou decidir quem é ou não santo, não creio nisso. Para mim o Dr. Sousa Martins foi um dos melhores médicos que este país já viu e eu sinto-me tremendamente orgulhoso por ser alhandrense” conclui.