Sociedade | 19-09-2022 10:00

Edição Semanal. Família com quatro filhos vai ser despejada de habitação municipal em Povos

Ricardo Cortes e a mulher, Natália Falcato, não têm onde viver com os quatro filhos depois do despejo

Município de Vila Franca de Xira está inflexível na decisão e explica que o inquilino não cumpriu com o pagamento das rendas e ocupou ilegalmente a fracção. Morador, de etnia cigana, acusa o município de racismo.

A poucos meses de mais um Inverno, Ricardo Cortes, de 37 anos, vai ser despejado da casa municipal que ocupa no bairro de Povos, em Vila Franca de Xira, juntamente com a mulher, Natália Falcato, e os quatro filhos de 4, 12, 14 e 16 anos. A Câmara de Vila Franca de Xira diz que a acção se deve ao não pagamento de rendas e por este ter ocupado ilegalmente a habitação. O morador diz que a casa lhe foi atribuída há mais de uma década, garante não ter onde viver, pede ajuda e confessa ter de vir a montar uma tenda no largo da câmara para viver com a família. O prazo para abandonar a habitação terminou a 9 de Setembro.
O conflito entre o morador e o município dura há dois anos e teve início quando uma das filhas de Ricardo Cortes sofreu de meningite meningocócica, um tipo raro de meningite bacteriana. Por esse motivo, explica a O MIRANTE, foi obrigado a gastar as poucas poupanças que tinha a fazer obras de melhoria na casa municipal para que a filha pudesse habitar num espaço limpo e saudável. Ricardo Cortes diz trabalhar no campo e o problema das rendas em atraso aconteceu quando emigrou para França para trabalhar. “A mulher e as filhas ficaram cá mas não pagaram oito meses de renda. Quando cheguei vi o aviso de despejo e fui logo à câmara pagar”, explica o morador, que pagava cerca de 5 euros de renda mensal.
O imbróglio começou nessa altura porque com o aviso de despejo cessou o contrato de arrendamento que estava em vigor. Uma vez que pagou tudo o que estava em atraso Ricardo Cortes ficou convencido que a câmara iria renovar o contrato, o que não aconteceu. Foi a uma reunião de câmara no final do último mandato, explicou a situação e o anterior presidente, Alberto Mesquita, prometeu-lhe que não iria ficar sem tecto, mas a promessa não foi cumprida. Entretanto a família arrombou a porta da casa e manteve-se a ocupar o imóvel sem pagar qualquer renda até hoje.

“Peço aos autarcas que tenham coração”
O morador pede compaixão e ajuda à câmara. Queixa-se de, apesar dos pedidos, não ter sido recebido pelo novo presidente da câmara, Fernando Paulo Ferreira, e diz-se disponível para saldar todas as rendas referentes ao período de ocupação ilegal. “Peço à câmara e aos autarcas que tenham coração. Até me disponibilizei para que possam rever o valor da renda, se for preciso pagar mais, mas nem assim nos deixam ficar”, lamenta.
O facto das crianças frequentarem o jardim-de-infância de Povos também é um factor que pesa no apelo de Ricardo Cortes. O morador queixa-se de estar a ser tratado dessa forma “por ser cigano” e lamenta que a família esteja a ser tratada, diz, como animais. “O que se está a passar é racismo”, critica. A família vive do rendimento mínimo e do que Ricardo Cortes vai ganhando na agricultura.
Entretanto, em desespero, a família arranjou um advogado de Santarém, Adriano Nazareth Barbosa, para avançar com uma providência cautelar no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa para tentar travar o despejo mas pode já ser tarde demais. O advogado acredita que com um pouco de boa vontade era possível resolver o problema da família. “Eles precisam de ajuda, têm carência económica, socialmente têm de ser apoiados, cumpriram à posteriori com as suas obrigações e estão na disposição de cumprir. A câmara está a agarrar-se a uma situação meramente formal para não os deixar continuar na casa”, lamenta o advogado.

Câmara diz cumprir a lei
Questionado por O MIRANTE o município não se pronuncia sobre as acusações de racismo. Confirma o incumprimento no pagamento das rendas e diz que “apesar das muitas oportunidades” para que o morador regularizasse a situação ele acabou despejado da fracção. “Depois do despejo e cessação do contrato de arrendamento o munícipe arrombou a porta e ocupou a casa ilegalmente. Por isso foi iniciado novo processo para desocupação”, refere.
A câmara confirma decisão judicial do novo despejo e diz que o morador está condenado também pelo tribunal a pagar uma indemnização a título compensatório pelos meses que ocupou a casa desde o primeiro despejo. Questionada a câmara sobre o facto dos moradores não terem para onde ir, esta limita-se a dizer que Ricardo Cortes já foi atendido “por inúmeras vezes presencialmente e informado por escrito de que não lhe assiste razão, bem como das possíveis alternativas de apoio no âmbito da Acção Social”.

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