Sociedade | 07-08-2022 07:00

Juntos no amor e no trabalho é um desafio que requer diálogo e compreensão

Susana e Jaime Correia trabalham juntos desde 2021

Partilham a vida pessoal e profissional num emaranhado de emoções onde nem sempre é possível separar as águas. Três casais contam a O MIRANTE como mantêm o amor e o trabalho numa firme e duradoura relação de simbiose. E o segredo, afirma a psicóloga Helena Gonçalves, não está em estabelecer a regra, “pouco exequível”, de manter as conversas de trabalho fora de casa.

O amor de Fátima Ribeiro e João Cera nasceu no local de trabalho. Ele programador, ela comercial na mesma empresa de informática decidiram, ao fim de meia dúzia de meses de namoro, largar o emprego e tornar-se empresários. Com vontade de arriscar e sem receios de que uma vida a dois em casa e no trabalho pudesse desgastar a relação, fundaram uma empresa de informática em Alverca do Ribatejo, há mais de duas décadas e que, tal como o casamento, prospera até aos dias de hoje.
“Aos vinte e poucos anos vai-se atrás da aventura, não se tem receio de coisa nenhuma nem se pensa nas consequências”. É desta forma que Fátima Ribeiro recorda o início daquilo que foi uma aventura empresarial a dois. Hoje, com 50 anos e 25 de casada, pensa de forma diferente. “A resposta à questão se traz mais vantagens ou desvantagens não é uma linha recta, diria que depende dos dias”, diz a O MIRANTE, confessando que já lhe passou pela cabeça que “se fosse hoje não o teria feito”. Os motivos? “Isso de chegar a casa e os problemas ficarem à porta tem muito que se lhe diga e na minha opinião não é verdade”. Além disso, prossegue, os problemas, nomeadamente os financeiros, passam a ser comuns e quando surgem tornam tudo mais complicado.
Para a psicóloga Helena Gonçalves, “a regra de deixar o que é do trabalho no trabalho e o que é do casal em casa, pode ser muito tentadora, mas talvez pouco exequível”. O que, esclarece, não tem necessariamente que ser negativo, podendo até trazer vantagens. “Pode ser muito confortável para o casal contar com alguém a quem possa pedir opinião ou dicas”, sublinha, explicando que mais importante para a gestão de conflitos é que o casal tenha maturidade e dialogue sobre aquilo que considera ser uma barreira que não pode ser quebrada – e que pode variar ao longo do tempo – para que a relação não saia prejudicada. “Não há fórmulas mágicas e cada casal é único. O importante é perceberem as suas necessidades e as mesmas poderem ser negociadas entre os dois”, defende.
No caso de João, que gosta de arriscar e de Fátima, que se diz mais cautelosa, as conversas sobre o trabalho ou o futuro da empresa acabam por culminar em decisões “ponderadas e equilibradas o que é positivo”. Do mesmo lado da moeda de quem leva uma vida de casal fundida com a profissional ficam os problemas pessoais e familiares, como ter que ficar em casa porque um dos filhos adoeceu, ou ir a uma consulta médica sem precisar de se justificar a um superior hierárquico e, ao invés disso, receber compreensão.

Quando um manda mais que outro
E quando um elemento do casal é, no trabalho, hierarquicamente superior? Nestes casos, a psicóloga de Torres Novas alerta que a relação pode tornar-se problemática em situações em que há uma “dependência hierárquica” por haver uma sobreposição de papéis. Neste caso, aconselha, “é necessário que o casal defina a forma de regular a situação, estipulando regras entre si”. Para Susana e Jaime Correia o facto de ele ser chefe e ela funcionária não fez com que a relação, que dura há 30 anos, sucumbisse a estereótipos de género ou a uma espécie de síndrome de inferioridade. “Não me faz confusão absolutamente alguma, nem consigo ver um problema nisso desde que haja respeito; e isso sempre houve”, vinca Susana que trabalha na empresa de reciclagem fundada pelo marido no Porto Alto, onde o casal reside.
A retrospectiva ainda é curta, mas feito o balanço aos 17 meses, o casal diz encontrar mais prós do que contras em trabalhar junto. Não entram em desacordo nem em discussões que não levam a lugar nenhum e são “sempre sinceros” um com o outro. Além disso, “quando o objectivo é comum trabalha-se com mais garra”, acrescenta Susana Correia, que antes trabalhou 23 anos como escriturária até decidir que era altura de mudar de vida.
Dentro do veículo de recolha de resíduos para reciclar, onde passam juntos grande parte do dia, quase se esquecem que são marido e mulher. Tratam-se por colegas na frente dos clientes, por considerarem que torna tudo “mais profissional”, mas às vezes o empresário descuida-se e chama “amor” a Susana. Somando por alto, passam perto de 90% do dia de trabalho juntos, o que para outros casais poderia ser um autêntico pesadelo. “Para nós é bom, sentimo-nos bem assim”. Prova disso, continua Susana, é que mesmo depois do trabalho não há necessidade de arranjar estratégias para estarem afastados. O que não quer dizer, ressalvam, que não possam estar um sem o outro.

“Às vezes dava faísca e ficava magoada”
Ao olhar para o passado – que se traduz em décadas de trabalho com o homem com quem está casada há 41 anos – Natália Bucachar traz uma visão diferente. Agora que João Bucachar está reformado e ela tem um novo emprego, percebe como é bom passarem mais tempo longe um do outro. “Estávamos 24 horas sobre 24 horas juntos e isso torna-se cansativo. Noto que agora tenho saudades e há mais harmonia entre nós”, conta a O MIRANTE.
O casal residente no Porto Alto começou a partilhar o dia a dia de trabalho assim que juntou os trapinhos. Percorreram feiras e mais feiras a vender discos e cassetes, roupa e flores artificiais e, durante 22 anos, geriram uma roulote de farturas. Trabalhos, por si só, duros e que punham à prova a “paciência” de ambos. “Às vezes dava faísca. O meu marido dizia que o cliente tinha sempre razão e eu entendia que não. Discutíamos e ficava magoada no momento, mas depois passava”, conta, sublinhando que com alguma ginástica foram definindo fronteiras para não deixar escapar o amor, o respeito e a cumplicidade. “Trabalhamos juntos e cá estamos há 41 anos um ao lado do outro”, remata com firmeza, como quem quer orgulhosamente provar que trabalhar junto e ter um casamento feliz e duradouro é possível.

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