Crónicas do Brasil | 14-10-2022 14:59

Dinheiro Vivo

Vinicius Todeschini

O dia 30 de outubro se aproxima, quando o Brasil decidirá o que vai ser pelos próximos quatro anos: eleger o pior ou o melhor? Não deveria, dentro de alguma lógica, ser uma escolha difícil, mas no Brasil o melhor quase nunca é desejado quando ele pode ofuscar e alterar os planos das elites financeiras do país.

                Se tentarem proibir as transações com dinheiro vivo no Brasil, os poderosos lutarão com todas as suas forças corporativistas para evitar isso, porque miríades de transações são feitas assim, simplesmente porque os “patriotas”, que agora querem reeleger o pior presidente da história, têm muito mais lucros e com papel moeda não pagam os devidos impostos, escapando do controle fiscal. Bolsonaro, aliás, nunca deixou de ser a cara da elite brasileira, mesmos sendo insultuoso e inculto, porque na verdade isso lhe permite dizer coisas que essa mesma elite gostaria de dizer aos índios, aos negros, aos pobres, aos artistas, enfim, aos sofredores e dissidentes dessa ordem perversa, elitista e exclusiva, esse clube, onde para entrar só sendo convidado pelos seus pares e bancado pelo seu poder e dinheiro.

                Grandes pacotes e muitas malas de dinheiro circulam pelo país tornando impossível o rastreamento destes valores, que ficam livres de qualquer fiscalização tornando os endinheirados ainda mais ricos e o Estado à mercê dos poderosos, sem condições de fiscalizar e cumprir o seu papel de justificar o pacto social da nação. Por isso odeiam a Esquerda, representada em seu imaginário por Lula e o PT, porque querem fiscalizar e cobrar os devidos impostos e rastrear os caminhos tortuosos desse dinheiro. É uma questão de dinheiro, uma questão de posição social, uma questão de “honra corporativista” para os inescrupulosos da nação, manter o Brasil fora de qualquer perspectiva de mudança real, assim os filhos desses poderosos não sofrerão grande concorrência e poderão manter o mesmo status dos seus pais.

                O dia 30 de outubro se aproxima, quando o Brasil decidirá o que vai ser pelos próximos quatro anos: eleger o pior ou o melhor? Não deveria, dentro de alguma lógica, ser uma escolha difícil, mas no Brasil o melhor quase nunca é desejado quando ele pode ofuscar e alterar os planos das elites financeiras do país. Lula, mesmo sendo um sujeito que sempre pretendeu agradar a maioria, sofre enorme resistência daquela franja mais radical e ideologizada contra a Esquerda e essa resistência se dá, basicamente, pela sua tentativa de diminuir, não de acabar, mas de abrandar a absurda diferença entre as classes sociais.

                Os neofascistas brasileiros -agora devidamente nomeados de bolsonaristas- desfilam seus carros caros com bandeirinhas do Brasil pelas avenidas e ruas cheias de sem-teto esfomeados em um dos maiores produtores de alimentos do planeta, mas eles não querem saber de políticas sociais, nem de discutir nada que não passe por meritocracia e empreendedorismo, para eles a miséria não é estrutural, o racismo não existe e cada um tem o que merece. Conviver com a ignorância premeditada desses que se dizem “patriotas” é complicado, pois não existem argumentos contra a má intenção e nenhuma possibilidade de cura para quem está sintonizado com a sua própria doença. O Brasil só é agradável aos ricos e, é claro, aos estrangeiros, onde seus euros e dólares valem muito mais e tudo é muito mais barato que em seus próprios países, além de tanta gente pobre disposta a servi-los de várias maneiras e a preços módicos. Não existe dignidade quando se passa fome e se mora na rua ou em condições miseráveis, ninguém consegue melhorar assim, é só uma busca incessante pela sobrevivência.

                O dinheiro vivo é um dos alicerces do enriquecimento rápido e está fora de qualquer controle fiscal, com isso os especialistas em assessorar os ricos a se esquivarem do Fisco também se tornaram abastados, usando, naturalmente, as mesmas estratégias que indicam aos seus clientes. O imposto sobre as grandes fortunas ou qualquer tipo de medida que tente acabar com os impostos regressivos cobrados no país e adote uma cobrança progressiva e real sobre os ganhos, cobrando proporcionalmente mais de quem tem mais, encontrará uma resistência política selvagem. Por aqui vivemos em uma plutocracia e mexer com os ricos e poderosos é enfrentar uma fúria multiplicada por bilhões de recursos infindáveis. É uma luta cujo resultado é imprevisível, mas o Brasil ainda tem uma parte adormecida, fruto de um processo de colonização que estruturou uma sociedade injusta e descompromissada com as desgraças que produziu e perpetuou. A luta nunca cessa companheiro, mas como não existe pecado do lado debaixo do equador, segundo Chico Buarque de Holanda, o maior de todos os sambistas, o futuro também não existe, porque o passado é uma ficção e o agora impermanente enquanto é.

Vinicius Todeschini 14-10-2022

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