Crónicas do Brasil | 26-10-2022 06:59

Tiros e granadas na República ameaçada

Vinicius Todeschini

A extrema-direita brasileira não mudou, mudaram os personagens e as técnicas. A própria posse do PTB, que foi entregue pelo General Golbery -a eminência parda da ditadura- à deputada federal Ivete Vargas, doente de um câncer terminal, foi uma jogada de mestre para evitar que o partido voltasse ao herdeiro do trabalhismo, Leonel de Moura Brizola.

               O ex-deputado e ex-candidato à presidência pelo PTB, Roberto Jefferson, aprontou mais uma, mas desta vez superou aquele velho e verborrágico discurso golpista, recebendo a bala os policiais federais. Foram cerca de 50 tiros de fuzil e lançamentos de granadas, cujos estilhaços feriram dois policiais. Aliado de primeira hora de Jair Bolsonaro, este velho demagogo começou na televisão defendendo os pobres, como advogado, em um daqueles programas popularescos chamado “O Povo na TV”, no canal do Silvio Santos, outro aliado do presidente. Assim se popularizou seguindo um caminho sempre marcado por ações e declarações polêmicas. Demagogo e falastrão, RJ, sempre gostou de chamar a atenção com declarações e ameaças e quando denunciou o escândalo do Mensalão, entrando em rota de colisão com o ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu, sua declaração sobre o ex-ministro de Lula lhe despertar os seus piores instintos, causou impacto e fez escola. Preso, ele cumpriu pena junto com o ex-namorado da sua filha, conhecido como Dr. Jairinho, condenado por ter assassinado o enteado de 4 anos.  Declarações do tipo: “Temos que entrar lá e colocar para fora na bala, no pescoção, no chute na bunda, aqueles 11 malandros que se fantasiaram de ministros do Supremo Tribunal Federal (…) Se o Supremo der a ideologia de gênero, nós temos que entrar lá e julgar aqueles caras todos no meio da praça, na bala”. Por aí se vê o que se espera quando o atual presidente for derrotado nas urnas.

                Preso e indultado, em 2016, pelo ministro Barroso, ele finalmente ficou livre e continuou a sua saga contra a democracia e, principalmente, contra o STF e a Esquerda. No caso atual, ele chamou a ministra do STF, Cármem Lúcia, de “prostituta arrombada”, mas foi além e declarou: “Bruxa de Blair, é podre por dentro e horrorosa por fora, uma bruxa. Se puser um chapéu bicudo e uma vassoura na mão, ela voa. Deus me livre dessa mulher que está aí nessa latrina que é o Tribunal Superior Eleitoral”. A sua filha, Cristiane Brasil, divulgou o vídeo em suas redes sociais, a mesma que foi indicada por Michel Temer para o Ministério do Trabalho, em 2018, mas teve a sua posse suspensa pela Justiça Federal. Ela também foi presa quando era pré-candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, por crimes de organização criminosa e corrupção ativa. Bolsonaro, é claro, refluiu do apoio explícito e declarou que não existiriam fotos dele com RB, mas existem inúmeros registros fotográficos dos dois golpistas e aliados de primeira hora. Mais uma mentira que vai para o livro do atual presidente e são tantas que serão necessários muitos volumes para o devido registro com seus contextos. Há, inclusive, uma declaração de Roberto Jefferson para o presidente amado por ele: “Meu presidente encarna todos os meus credos. Prometo defendê-lo enquanto pólvora tiver”. Singela declaração de amor de uma golpista ao chefe-mor dos golpistas.

                A verdade é que Roberto Jefferson, RJ, tinha livre trânsito no Planalto e pouco antes de ser preso, em agosto de 2021, foi recebido por Bolsonaro, fato confirmado pela própria agenda do Palácio. A extrema-direita brasileira não mudou, mudaram os personagens e as técnicas. A própria posse do PTB, que foi entregue pelo General Golbery -a eminência parda da ditadura-  à deputada federal Ivete Vargas, doente de um câncer terminal, foi uma jogada de mestre para evitar que o partido voltasse ao herdeiro do trabalhismo, Leonel de Moura Brizola. Assim, Brizola, teve que fundar o PDT e perdeu a legenda que Getúlio Vargas -o presidente divisor de águas da história contemporânea brasileira- fundou, em 1945, para abrigar tendências de esquerda. Com isso o partido erodiu e foi seguindo o seu triste destino de nunca mais voltar as suas raízes e virou anteparo da extrema-direita do país.

                O Brasil precisa acordar deste pesadelo e entrar em outra fase, renunciando de vez ao retrocesso apoiado pelas forças mais tenebrosas da nação. Bolsonaro é um oportunista e agora nega a sua relação com Roberto Jefferson, mas isso é impossível, porque são da mesma cepa e das mesmas práticas. A família e os apoiadores de RJ, estão revoltosos contra as declarações demagógicas de Bolsonaro, negando a relação entre eles e chamando de bandido quem atira em policiais. Por isso a base bolsonarista está dividida, porque sente medo que a família de RJ parta para retaliações a uma semana das eleições. Isso seria ainda mais terrível que a própria situação criada pelo velho golpista, mas pode ser o final perfeito para um projeto golpista e com potencialidade para arrastar o país ao desastre completo.         

Vinicius Todeschini 24-10-2022

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