Crónicas do Brasil | 27-12-2022 15:52

Os ministérios e seus mistérios

Vinicius Todeschini

O Brasil, apesar das tantas dificuldades, amadureceu politicamente e uma pesquisa desta semana, do Datafolha, revelou que 75% da população é contra atos antidemocráticos e 78% acham que o regime militar foi ditadura.

Acomodar tanta gente depois de uma campanha difícil, mas vitoriosa, não é tarefa fácil, pelo contrário, trata-se de uma obra de engenharia complexa e muito calculada no xadrez da política, onde tantos interesses díspares se digladiam. Lula está tendo muito trabalho, principalmente no caso da ex-senadora Simone Tebet, que não aceitará qualquer ministério. Ela foi candidata à presidência em 2022 e deseja se manter na berlinda para não ser esquecida. Lula deixou claro que não será mais candidato e a sua sucessão já começa a ser disputada; quem será o seu sucessor e contará com o seu apoio irrestrito? Haddad? Ele é o novo ministro da Fazenda, o ministério mais destacado na ordem das coisas, mas perdeu uma eleição em seu próprio estado para Tarcísio de Freitas, ex-ministro da Infraestrutura de Bolsonaro e um político relativamente desconhecido. Geraldo Alckmin, Simone Tebet e Flávio Dino estão nesta lista.
São Paulo é um estado paradoxal, berço do PT, o maior partido de esquerda da América do Sul, mas onde raramente a Esquerda ganha eleições importantes. Apesar da derrota, Haddad conquistou o melhor resultado do seu partido no estado, com 10,4 milhões de votos, na capital venceu o candidato dos Republicanos com 54/41% contra 45/49%. A riqueza deste estado confirma os paradoxos da desigualdade brasileira, uma das maiores do mundo. O centro financeiro do país é neoliberal e não renuncia às regras capitalistas mais radicais para continuar enriquecendo sem qualquer custo social. Tarifar os mais ricos, justamente, é tarefa herética nesses rincões.
Lula aumentou consideravelmente o número de ministérios para colocar os aliados da primeira e da última hora, mas é claro que não conseguirá agradar a todos, igualmente. Os avanços são consideráveis: Margareth Menezes, cantora baiana, no Ministério da Cultura e a presidenta da Fiocruz, Nísia Trindade, no Ministério da Saúde, por exemplo, extrapolando assim o padrão do macho adulto branco sempre no comando, mas também o confirmando, porque a maioria serão homens adultos e brancos. Aos poucos o rascunho começa a dar lugar a um desenho definitivo da nova configuração política brasileira.
Bolsonaro imaginava, assim como Jânio Quadros imaginou, quando renunciou ao seu mandato em 25 de agosto de 1961, (ele governou por apenas sete meses e deu início às instabilidades que resultaram em uma ditadura de 21 anos, ceifando o país de avanços consideráveis e de novos quadros políticos) que os militares com o apoio de parte da população o manteriam no poder, indefinidamente, porém subestimou as instituições democráticas e, também, não acreditou no renascimento de Lula. Ledo engano, agora terá que enfrentar as consequências da sua sanha irrefreável de vingança e perseguição.
O Brasil, apesar das tantas dificuldades, amadureceu politicamente e uma pesquisa desta semana, do Datafolha, revelou que 75% da população é contra atos antidemocráticos e 78% acham que o regime militar foi ditadura. Muitos militares que hoje são políticos, como o general Mourão, ainda vice-presidente da República e senador eleito pelo estado do Rio Grande do Sul, tentam subverter os fatos e gostam de chamar o golpe militar e os anos de chumbo de movimento de 64.
Agradar a todos os aliados é tarefa fundamental para evitar desgastes antes mesmo de governar. Lula deseja evitar consumições, além disso, Simone Tebet foi fundamental para a sua vitória sobre Bolsonaro, por isso ele não pode deixá-la de fora de um ministério importante, mas, com Marina Silva no Meio Ambiente, ele precisará achar outro ministério com peso suficiente para agradar à sua aliada do MDB. Esta semana é definitiva para a formação do novo governo e não há mais tempo para indefinições.
A vitória do presidente Lula confirmou o amadurecimento do eleitorado, porque Bolsonaro não teve nenhum prurido em usar a máquina pública, extrapolando qualquer limite aceitável. Contou com um grande apoio financeiro da maior parte dos empresários, além das milícias digitais para produzir fake news em massa. O que ele não contava era que os seus próprios aliados, a deputada Carla Zambelli e o ex-deputado Roberto Jefferson, com armas em punho, colocassem água fria na fervura do seu projeto de poder.
O empresário bolsonarista, George Washington de Souza, foi preso em Brasília, no dia 24 do corrente mês, por tentar detonar uma bomba em um caminhão de combustíveis no aeroporto da capital federal. O objetivo era explodir o aeroporto para Bolsonaro decretar estado de sítio e evitar a posse de Lula, mas a bomba falhou. A polícia encontrou mais cinco artefatos iguais em seu apartamento, além de duas espingardas, um fuzil, três pistolas, dois revólveres, centenas de munições e uniformes camuflados. Claro que ele não está sozinho, os acampamentos, ao lado dos quartéis são bases de apoio para a organização de atos terroristas e já estão na mira do novo ministro da Justiça, Flávio Dino. Não há mais como enganar a opinião pública se intitulando “patriotas”, os seus objetivos são óbvios e só a Lei poderá contê-los.


Vinicius Todeschini 25-12-2022

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